Bem-vindo ao mundo real
O menino de rua não é um problema, mas sim, um componente das construções sociais contemporâneas. Se a sociedade não fosse tão desigual, talvez não teria a necessidade dessas crianças se arriscarem mundo a fora, se independendo precocemente de seus pais e mães. O que acontece, é que, em casa, muitas vezes, esses "marginais" marginalizados pela sociedade, são agredidos verbo e fisicamente e dadas as circunstâncias miseráveis da família, num ato de rebeldia e coragem, partem eme busca da liberdade. Mas a vida real é cruel para eles. A sociedade os vê como "ratos de esgoto" e são tratados como lixo pelas autoridades.
Jorge Amado, em seu romance "Capitães da Areia", no cenário da cidade de Salvador do início do séc. XX e protagonizado por um grupo de meninos de rua, elabora uma profunda e irônica crítica às estruturas da sociedade moderna capitalista brasileira. Uma sociedade que não se preocupava (e ainda não se preocupa) com o futuro dessas crianças.
Da época em que o romance se passa até os anos 1980, um verdadeiro "exército de pequenos míseráveis" assolava as ruas de nossas cidades. Foi a partir dos anos 90, que começaram a surgir órgãos que se preocupavam em melhorar a condição dessas crianças. Em Belo Horizonte, por exemplo, o NACC (Núcleo de Atividades Culturais e Capacitação) trabalhava pela inclusão destes "capitães do mundo real" na sociedade por meio de oficinas artísticas e programas culturais como teatro, dança e cinema; atitudes diferentes da FEBEM (Fundação para o Bem-Estar do Menor) que de bem-estar não tinha nada. Hoje a FEBEM foi substituída por Fundação CASA, que continua tendo denúncias de maus-tratos com os menores. Por sinal, não muito diferente do "Reformatório" descrito no livro de Jorge Amado. Infelizmente, o NACC foi fechado por problemas estruturais em 1996.
Hoje em dia (2008), estima-se que haja menos de 600 crianças vivendo pelas ruas de BH. Além destes, há um número muito maior, que cabe àquelas que trabalham e mendigam nas ruas, explorados pela família, ou para garantir o próprio sustento.
Em Belo Horizonte, no ano de 2005, foi realizado uma pesquisa que encontrou 1,2 mil meninos e meninas de rua com até 18 anos; sendo que, 99% tinha família e 70% recebia benefícios do governo. A questão é que o bolsa-família é insuficiente, o que leva as famílias explorarem a força de trabalho dos seus filhos.
Apesar das estatísticas do governo atestar que a miséria e a fome foi erradicada, não tocamos no problema estrutural, que é o capitalismo. Enquanto houver esse sistema econômico, a miséria e a fome, por mais que o governo diga, não será erradicada. Isso porque a perpetuação do sistema de salários e exploração do trabalho, geram desigualdade. Apenas a mudança global do sistema de geração de riqueza pode resolver o problema dos meninos de rua. Na URSS, esse também era um problema, ou seja, não adianta mudar o modo de produção de um país do mundo. Como o sistema é global é preciso de ações em conjunto de todas nações do globo, respeitando, é claro, a soberania de cada país. O socialismo internacional é impossível só se o capitalismo global também o for. E não é. No momento que o "sistema internacional", baseado no mercado, perceber que é mais importante matar a fome de um africano do que comprar um iate para um multimilionário, podemos conversar. Não precisamos acabar com o Mercado, ele é o sistema mais eficiente criado pela humanidade, mas devemos mudar as prioridades. E isso, partirá de cada um, não será "imposto" por qualquer organização.
A sociedade que você vive é você quem faz; e a verdade é que estamos deixando na "mão" do dinheiro, coisas que podemos manejar com nossas próprias mãos.