A Indonésia não é “a casa da mãe Joana”

Prólogo

Com este texto não quero e tampouco tenho a pretensão de discutir o princípio da razoabilidade, por vezes chamado de princípio da proporcionalidade ou princípio da adequação dos meios aos fins. Não é de bom grado elencar sobre termos em que a doutrina brasileira não é pacífica em relação a nomenclatura destes princípios.

Independentemente dessa NÃO PACIFICIDADE, dos supracitados princípios, no Brasil, meu siso, o qual considero comum e de acordo com a maioria dos que me leem, diz que a aplicação de uma pena deve ser proporcional ao delito cometido. Entendo que houve uma extrema desproporcionalidade (Pena de execução) pelo delito cometido pelo traficante brasileiro Marco Archer Cardoso Moreira, preso na Indonésia em 2004 por tráfico de drogas.

NEM TODOS COMPREENDEM E SEGUEM CESARE BECCARIA

Não foi em vão, para a minha formação jurídico-social, que Beccaria escreveu:

“O interesse de todos não é somente que se cometam poucos crimes, mais ainda que os delitos mais funestos à sociedade sejam os mais raros. Os meios que a legislação emprega para impedir os crimes devem, pois, ser mais fortes à medida que o delito é mais contrário ao bem público e pode tornar-se mais comum. Deve, pois, haver uma proporção entre os delitos e as penas.” – (BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Editora Martin Claret, 2000.).

OBSERVAÇÃO PERTINENTE E OPORTUNA

Beccaria repensou a lei e as punições com base na análise filosófica, moral e econômica da natureza do ser humano e da ordem social. Suas obras, mais especificamente a intitulada "Dos Delitos e Das Penas", são consideradas as bases do Direito Penal moderno. As proposições ali contidas projetaram arquiteturalmente a política e o direito modernos: igualdade perante a lei, abolição da pena de morte, erradicação da tortura como meio de obtenção de provas, instauração de julgamentos públicos e céleres, penas consistentes e proporcionais, dentre outras críticas e propostas que visaram a humanizar o direito.

Não há dúvida quanto a importância do pensamento de Beccaria para o Ordenamento Jurídico Brasileiro, haja vista a fixação da pena presente em nosso Código Penal ter sofrido influência de suas ideias, já que o art. 68, CP, estabelece que a pena-base será fixada e individualizada, aplicando-se a mesma de forma necessária e adequada à necessidade da retribuição à sociedade e da prevenção de delitos futuros, atendendo-se ao critério do art. 59, de nosso Código Penal, individualizando e aplicando a lei adequadamente a cada caso concreto, tornando mais justa a atividade punitiva do Estado.

A INDONÉSIA NÃO SEGUE OS PENSAMENTOS DE CESARE BECCARIA

Ocorre, todavia, que em cada nação existem princípios norteadores de seus usos e costumes sociais. E, para a Indonésia, as condenações sumárias – embora consideradas exageradas e desproporcionais para a maioria dos países do planeta – soa como uma mensagem clara para os membros dos cartéis do narcotráfico do mundo inteiro: Não há clemência para os traficantes!

QUANDO A CABEÇA NÃO PENSA O CORPO PADECE

O melhor aconselhamento deste ditado popular é “pensar, antes de agir”. Muitas vezes já nos arrependemos de algo que fizemos sem usarmos nossa capacidade de raciocinar. As consequências se refletem em sensações emocionais desagradáveis no próprio corpo: mágoas, raiva, estresse. Não é raro que os tormentos sejam mesmo físicos: doenças, dores, morte.

Brasileiros e outros estrangeiros deveriam (deverão) pensar duas ou mais vezes antes de tentarem cometer algum crime relacionado às drogas na Indonésia. Neste longínquo país, os presos condenados à morte são executados por um pelotão de fuzilamento. O atual presidente da Indonésia, Joko Widodo, assumiu o cargo em 2014 e adotou a política de “mão pesada” na luta contra as drogas e afirmou, no mês passado, que iria rejeitar os pedidos de clemência das 64 pessoas no corredor da morte por crimes relacionados a drogas.

Dilma Rousseff quis e tentou se envolver numa questão já decidida, ou na lide, isto é, no conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida, e até solicitou ajuda ao Papa Francisco para interceder contra a condenação à morte do brasileiro Marco Archer Cardoso Moreira, preso na Indonésia em 2004 por tráfico de drogas. Debalde foram os esforços da presidente Dilma que perdeu uma excelente oportunidade de não meter o bedelho onde poucas ou nenhuma chance teria de ser atendida em sua pretensão político-social.

MACACO VELHO NÃO PÕE A MÃO EM CUMBUCA

O inconsciente coletivo produz frases que se transformam em provérbios, máximas, ou axiomas e que contêm forte conteúdo filosófico. A inteligência do povo simples manifesta-se nos ditados e traduz ensinamentos que nasceram da experiência e da observação da realidade existencial.

É o caso de “macaco velho não mete a mão em cumbuca”. Dizem que a origem desse adágio vem da Índia quando caçadores de macacos escondiam banana num coco furado, de forma que eles (os macacos) pudessem perceber o que estava dentro do coco e se sentissem tentados a apanhar a fruta. O macaco ao enfiar a mão e agarrar a banana com a mão fechada não conseguia retira-la do coco, ou cumbuca, e no desespero sem saber o que fazer tornavam-se presa fácil para os caçadores.

Os outros macacos ao observarem a imprevidência do colega que foi apanhado, mesmo sem compreenderem porque seu semelhante fora capturado, captam o exemplo de que se fizer o mesmo serão pegos. Portanto, “macaco velho não põe a mão em cumbuca”.

A CASA DA MÃE JOANA

Ora, se Eu fosse um traficante de drogas escolheria um local menos perigoso, menos rígido com a aplicação das leis do que a Indonésia para traficar entorpecentes. Para atuar com tranquilidade e aumentar o meu patrimônio Eu escolheria um paradisíaco local onde o Poder Judiciário, representado por uma justiça cega e morosa, arrasta-se em detrimento da sociedade desnorteada, sem rumo. Escolheria um país onde o Poder Legislativo, sem interesse político, desidioso, eivado de incompetentes, corruptos e caricatos eleitos pelo voto de protesto, não muda as leis e quando o faz é de forma esconsa e benevolente para os criminosos.

Escolheria, por exemplo, um país onde as leis fossem fracas, onde a corrupção campeia, um país onde o criminoso livra-se do flagrante, apresenta-se à Polícia Judiciária com um advogado e depois de formalizar os trâmites legais aguardará o julgamento, o chamado da justiça para tentar justificar o crime cometido EM LIBERDADE. Mas se Eu fosse preso em flagrante não seria condenado à morte e teria a proteção do Estado com todas as benesses da CF/88 e Lei de Execução Penal – LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984.

CONCLUSÃO

Marco Archer Cardoso Moreira é instrutor de voo livre. Inexperiente, escolheu o país errado para uma aventura inconsequente e foi preso ao tentar entrar na Indonésia, em 2004, com 13 quilos de cocaína escondidos nos tubos de uma asa delta. A droga foi descoberta pelo raio-x, no Aeroporto Internacional de Jacarta. O brasileiro conseguiu fugir do aeroporto, mas foi preso duas semanas depois.

A Indonésia pune com pena de morte o tráfico de drogas. As leis da Indonésia contra crimes relacionados a drogas estão entre as mais rígidas do mundo, e contam com o fundamental apoio da população. É por toda essa dureza existente na Indonésia que: se Eu fosse um criminoso escolheria cometer meus delitos no Brasil.

Neste Brasil edênico, considerado e muito bem conhecido pela “casa da mãe Joana”, minha família, caso Eu fosse condenado, não ficaria na miséria. Para isso existe o auxílio-reclusão (Vide lei n° 8.213, de 24 de junho de 1991.)! Todos sabemos que “na casa da mãe Joana” (Brasil) os direitos dos presos (e das presas) estão indicados na Constituição Federal e na Lei de Execuções Penais, lei que trata do direito dos presos e de sua integração à sociedade.

RESUMO DA CONCLUSÃO

Muitas vezes agimos como os macacos que caíram na armadilha dos caçadores, e só com experiência verificada em ações de insucesso nosso ou de outras pessoas é que aprendemos a lição de que aquele não deve ser o procedimento adequado (“Pôr a mão em cumbuca”) para conseguir determinados objetivos. Termos a certeza de que não devemos nos expor a riscos conhecidos quando se sabe do prejuízo certo que obteremos. Em outras palavras, quem é escolado, tem experiência, não comete certas imprudências.

Muitos outros condenados, em países sérios e com leis radicais, vão morrer antes de aprenderem a dura lição nas aventuras impensadas. Podemos crer e concluir que outros criminosos brasileiros, mais espertos, depois da execução de Marco Archer, na Indonésia, vão preferir as mordomias (TV, aparelho de DVD, som, celulares, aparelho de ar-condicionado, bebidas, visitas intimas, comida diferenciada etc.) dos nossos presídios, a proteção dos agentes penitenciários corrompidos e das nossas leis, antes de se aventurarem nos países mais inflexíveis com criminosos tão nocivos às crianças e a sociedade como um todo.

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, disse, em entrevista coletiva, que: "a execução do brasileiro Marco Archer na Indonésia causa uma sombra na relação entre os dois países.".

Ora, pergunto sem receio de estar abusando do livre direito à expressão: a quem interessa uma suposta amizade com quem pactua ou queira pactuar com traficantes? A Indonésia não é "a casa da mãe Joana"! Ademais, sabemos que geralmente não se pode pactuar com pessoas ou instituições ilegais.

Quero fazer outra pergunta simples e ingênua: Será que o governo brasileiro vai tentar, depois do fracasso com Marco Archer, reverter a pena de morte do outro brasileiro (Paranaense Rodrigo Muxfeldt Gularte) também condenado por tráfico de drogas, a pena capital na Indonésia? É esperar para ver e comentar!

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NOTAS REFERENCIADAS E BIBLIOGRÁFICAS

1. Constituição Federal do Brasil, 05 de outubro de 1988;

2. Código Penal Brasileiro – Decreto Lei 2848/40;

3. Imprensa falada, escrita e televisiva;

4. Fragmento do texto de Rui Leitão – “Macaco velho não mete a mão em cumbuca”;

5. BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Editora Martin Claret, 2000;

6. Papéis avulsos, anotações e Notas de Aulas do Autor - Pós-Graduação.

7. Assertivas do autor que devem ser consideradas circunstanciais e imparciais.