RELIGIÃO E DEMOCRACIA
Quando religiosos assumem posições político-partidárias sempre há reações. Muitos consideram impossível conciliar política e religião. De fato, num país republicano como o Brasil, com separação entre Igreja e Estado, parece muito estranho que no Congresso Nacional haja Bancadas Religiosas. Mas, numa sociedade em que grande parte dos cidadãos assume alguma confissão religiosa, é natural que isto repercuta na política.
A impossibilidade para uma aproximação entre religião e democracia seria o fato de as religiões se orientarem por dogmas, doutrinas imutáveis e sistemas fechados. Enquanto nas democracias tudo seria mutável e relativo. Os filósofos políticos, no entanto, ensinam que, embora as possibilidades de mudança nas democracias seja muito grande, contudo estas mudanças não são ilimitadas, pois o povo tem direitos. E o respeito a estes direitos é um fundamento imutável da democracia.
Desta forma, cidadãos que, voluntariamente, aceitaram se sujeitar a princípios religiosos, por que seriam incapazes de viver democraticamente? Eles não optaram livremente “limitar sua vontade”, e não transgredir determinadas normas religiosas? Agir desta ou daquela forma, ou deixar de fazer isto ou aquilo, por si só, ainda não fere a democracia.
Nas sociedades democráticas, é democrático permitir aos cidadãos escolher sua religião. Isto significa permitir aos religiosos participar na indicação e remoção de seus legisladores; permitir-lhes um papel na remoção de leis mutáveis. Também os religiosos, em uma democracia, devem exigir uma imprensa livre; exercer o direito de criticar leis que incentivam o vício e dificultam a virtude; exigir o direito à saúde, à educação e à moradia.
Por estas considerações, constata-se que existe um ponto de convergência entre os princípios democráticos e as exigências religiosas. Este ponto de convergência são os direitos humanos. Mas aqui, eventualmente, ocorrem divergências, pois há religiões que descumprem obrigações com o Estado, privilegiando o respeito aos direitos humanos. Pregam: “primeiro servir a Deus, depois aos homens”; “primeiro seguir a consciência, depois as leis”.
Conclui-se, assim, que, numa sociedade democrática, a política e as religiões, não alienadoras, devem conviver, complementarmente, no cumprimento dos direitos humanos.
Inácio Strieder é professor de filosofia