Apologia ao crime ou um pedido de socorro?

Prólogo

Em defesa da fé, que pode ser comprovada por argumentos racionais, a belíssima e arguciosa jornalista Rachel Sheherazade, que apresenta o “SBT Brasil”, causou polêmica e dividiu opiniões nas redes sociais com um comentário a favor do grupo de pessoas que deteve um suspeito de assalto. Agrediram-no e o prenderam a um poste com uma trava de bicicleta.

Em seu comentário no telejornal de terça-feira (04/02/2014) Rachel disse que a atitude do grupo era “compreensível”. Ora, ora, ora, todas as torcidas dos clubes futebolísticos brasileiros, principalmente a maior torcida do Brasil (torcida do Flamengo), compreendeu as palavras da jornalista Rachel e não entendeu ser uma apologia ao crime, mas sim um pedido de socorro. Nem sempre sigo a maioria, mas, neste caso, não sou exceção!

PALAVRAS DE RACHEL SHEHERAZADE

"Num país que sofre de violência endêmica, a atitude dos vingadores é até compreensível" – disse a jornalista. "O Estado é omisso, a polícia desmoralizada, a Justiça é falha. O que resta ao cidadão de bem, que ainda por cima foi desarmado? Se defender (SIC), é claro" – acrescentou, para completar. "O contra-ataque aos bandidos é o que chamo de legítima defesa coletiva de uma sociedade sem Estado contra um estado de violência sem limite".

Finalizando, ela ainda disse que quem defende o suspeito deveria "adotar um bandido". "Aos defensores dos direitos humanos, que se apiedaram do marginalzinho preso no poste, lanço uma campanha: faça um favor ao Brasil, adote um bandido". – Quando a jornalista Rachel disse que "o cidadão foi desarmado" estava se referindo à controvertida Lei 10.826/2003, isto é, a malfadada Lei do Desarmamento decretada e/ou dejetada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo então Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.

EM DEFESA DA BELA JORNALISTA EMOCIONADA

Todo esse quiproquó não teria acontecido se realmente não tivéssemos um Estado omisso, um aparato policial desmoralizado, um Poder Legislativo eivado de caricatos acomodados e dizendo amém depois de saciarem seus interesses pessoais, um Poder Judiciário manietado pelas leis que defendem a anarquia banalizada e/ou o dogma “quanto pior melhor.”.

A polícia desmoraliza-se sempre que desrespeita a sociedade com as prisões “para averiguações”, com o uso indevido de algemas. A Súmula Vinculante nº 11, do Supremo Tribunal Federal, que regula o emprego de algemas, é apenas um exemplo dessa sanha e barbárie crescente.

Quando as polícias: Civil, Militar e Federal algemam (Mulheres e idosos) de forma canhestra tentam justificar a violência desnecessária dizendo: “Esse é o procedimento padrão!”. Ora, então a Súmula Vinculante nº 11, do STF, não tem a força de produzir o efeito que se pretendia? É inócua? Podemos afirmar que o nosso Poder Legislativo e o egrégio STF, por osmose, estão acometidos de diarreia legiferante?

Todos os dias vemos nas telenovelas atores e atrizes dramatizando a violência, o crime, a vingança, o despeito, o ódio, a cupidez. Seria isso, também, apológico? Ah! Também vemos nas telenovelas atores sendo algemados, em total descompasso com as leis, como se fizessem um deboche da desditosa Súmula Vinculante nº 11, do STF.

Eis o que preestabelece a ineficaz e desmoralizada Súmula Vinculante nº 11, do STF:

SÚMULA VINCULANTE Nº 11 – (STF) – Sessão Plenária de 13/08/2008 - DJe nº 157/2008, p. 1, em 22/8/2008 - DO de 22/8/2008, p. 1. Uso de Algemas - Restrições ...

SÓ É LÍCITO O USO DE ALGEMAS EM CASOS DE RESISTÊNCIA E DE FUNDADO RECEIO DE FUGA OU DE PERIGO À INTEGRIDADE FÍSICA PRÓPRIA OU ALHEIA, POR PARTE DO PRESO OU DE TERCEIROS, JUSTIFICADA A EXCEPCIONALIDADE POR ESCRITO, SOB PENA DE RESPONSABILIDADE DISCIPLINAR, CIVIL E PENAL DO AGENTE OU DA AUTORIDADE E DE NULIDADE DA PRISÃO OU DO ATO PROCESSUAL A QUE SE REFERE, SEM PREJUÍZO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO.

PALAVRAS DE LUIZ FLÁVIO GOMES CONTRA RACHEL SHEHERAZADE

“E quanto à bela jornalista da bandidagem apologética? Eu proponho dar início à sua proposta e gostaria de adotá-la por uns seis meses para ensinar-lhe ética iluminista, de Montesquieu a Voltaire, de Diderot a Beccaria, de John Locke a Rousseau e por aí vai. O que está faltando para toda essa bandidagem nacional difusa é a emancipação intelectual e moral de que falava Kant, que hoje exige uma revolução (da qual todos deveríamos participar) ética e educacional. Temos que romper radicalmente com nossa tradição colonialista, teocrática, selvagem e parasitária, ou nunca teremos progresso (veja Acemoglu/Robinson). Essa é a solução. O resto que está aí é pura bandidagem.”.

ATENÇÃO:

Luiz Flávio Gomes é jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

CONCLUSÃO

Minha conclusão e dedução mais racional: Pelo que pude deduzir depois de ler as palavras do eminente jurista Luiz Flávio Gomes o bandido está certo e não só a jornalista Rachel Sheherazade, mas toda a sociedade está errada! Claro que a pragmática jornalista foi infeliz ao se emocionar e, provavelmente, por não ler o script da matéria conforme os ditames do SBT. O assunto é controverso. Todavia, a sociedade já está cansada dos desmandos dos podres poderes constituídos.

A mídia verborrágica NÃO DEVERIA insuflar a vindita privada, a autotutela, o linchamento como solução final para purificar a miséria humana sob forma de violência urbana extremada. O destempero da jornalista Rachel foi momentaneamente infeliz, mas não será com filosofia barata de juristas e filósofos renomados, do pretérito ou do presente, que se poderão acalmar os ânimos do povo amedrontado, de uma sociedade que há muito tempo perdeu o direito de ir e vir por se encontrar refém da desorganização estatal e diarreia legiferante.

O notável colega advogado Alessandro Chiarottino ao comentar as palavras do eminente jurista Luiz Flavio Gomes escreveu:

“É inacreditável como esses defensores do Direito Penal Mínimo continuam a querer nos impor sua ideologia falida...Não entendem o erro absoluto de sua teoria que, na realidade, nada mais é do que uma versão atualizada da teoria rousseauniana do "Bom Selvagem".

Para esses, o criminoso é - como homem - "naturalmente bom", corrompido pela "sociedade capitalista", necessitado de "ressocialização".......Certamente não entendem dois fatos essenciais da vida:

a) o Homem da realidade nunca teve nada a ver com o "Bom Selvagem" de Rousseau, aliás, as utopias construídas sobre esta hipótese fracassaram miseravelmente (como, pe. ex. o socialismo);

b) o Homem é naturalmente um ser egoísta, agressivo, invejoso, cobiçador, preguiçoso, covarde, leviano, impulsivo ("O Leviatã", Thomas Hobbes);

c) a fim de garantir a ordem e manter "a todos em respeito (Hobbes)", faz-se necessário um sistema penal eficiente, que imponha penas rigorosas a quem infringir a lei;

d) a gravidade da lei, sua violência e crueldade, são imprescindíveis, porque só assim se intimida os criminosos, mesmo os mais violentos (a ideia de que a gravidade da pena não intimida é uma falácia que foi desmontada pelo Prêmio Nobel Gary de Becker em sua obra "Crime and Punishment: An Economic Approach".

A conclusão inescapável é que o único caminho para vencer o crime e a violência é aquele adotado pelos EUA: penas severas, mesmo para delitos "menores", sistema processual eficiente e rápido, polícia honesta e equipada. O resto é empulhação ideológica.”.

DEFESA DE RACHEL SHEHERAZADE

Quinta-feira, 06 de fevereiro de 2014, às 21h08min, a jornalista Rachel se defendeu, ao vivo, no telejornal do SBT, com as palavras abaixo transcritas textualmente:

"O que eu fiz não foi defender a atitude dos justiceiros, nem precisaria estar explicando isso, minhas palavras foram muito claras no meu comentário, o que eu defendi foi o direto da população de se defender quando o estado é omisso, quando a polícia não chega. Isso está na lei: todo cidadão tem o direito de prender um meliante flagrado em delito. O que não se pode fazer é confundir o direito de se defender com a barbárie, a violência pela violência. Isso jamais qualquer pessoa de bom senso poderia defender, e essa pessoa não fui eu, não defendo a violência, eu defendo a paz, o bem e a segurança. Acho que todo cidadão tem que ter direito à segurança, é isso que falta nesse País".

RESUMO DA CONCLUSÃO

Concordo com a defesa da jornalista em toda a extensão de suas palavras. O poder público não pode defender a sociedade e esta não pode se defender pela nítida comprovação da perda desse direito, em que pese o que preestabelece o artigo 23 e seus incisos, do Código Penal Brasileiro, sendo o mais cristalino o inciso II:

Art. 23, CP - Não há crime quando o agente pratica o fato: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

I - em estado de necessidade; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

II - em legítima defesa;(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

O que de fato ocorreu foi um destempero emocional da jornalista, mas, perfeitamente compreensível por ter sido em defesa de uma sociedade aturdida pela desídia estatal. O que disso passou foi mais um grito midiático de quem não tem siso argumentativo, de quem vive sem eira nem beira nesse lamaçal fétido da atual anarquia estatal.

Quando a jornalista Rachel disse textualmente:

"Aos defensores dos direitos humanos, que se apiedaram do marginalzinho preso no poste, lanço uma campanha: faça um favor ao Brasil, adote um bandido".

Em verdade, com essas palavras, a jornalista Rachel quis dizer: “Crie uma cobra, um leão, um jacaré ou um outro predador feroz indomável, outra fera qualquer, para depois deixar alguém (um parente) chorando, lamentando e sofrendo por ter sua vida suprimida por essa violência que você mesmo alimentou.”.

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