O mercado de trabalho, o sistema e a necessidade de novas reflexões

Certa vez, ao filosofar sobre este mundo injusto em que vivemos, pesquisei no google a seguinte frase : "mercado de trabalho cruel".

Qual não foi a surpresa ao constatar que apenas um artigo* foi encontrado se referindo a esse tema, com todas as verdades que ele carrega.

Parei para pensar o porquê poucas pessoas se atrevem a discutir sobre, e muito menos se contrapor a essa que é uma das bases da Matrix capitalista de todo santo dia na qual estamos presos.

Por falar em Matrix, já há inclusive um pensamento que tem a ver com tudo isso:

"Você deve entender que a maior parte dessas pessoas não está pronta para acordar, e muitos são tão inertes, tão dependentes do sistema que vão lutar para protegê-lo".

Para o deus mercado, o ser humano é desprovido de qualquer traço de humanidade. Não passa de uma peça, um robô. Precisa ser o tempo inteiro enérgico, acelerado, produtivo, pró-ativo, competitivo, esbanjar jovialidade. Não tem o direito de ficar doente, de ter problemas pessoais, de chorar quando se sente sufocado. Tudo é visto como fraqueza. Qualquer erro cometido, ou qualquer coisa vista como um erro é motivo para ser jogado na rua. A palavra "produtividade" está acima de todo o conteúdo do ser humano, não se leva em conta muitas vezes as suas possibilidades de crescimento e aprendizado como um ser muito além de uma máquina produtiva.

É obrigado a sacrificar seu tempo por um salário, muitas vezes escasso, enquanto o dono do negócio fica com os lucros do suor alheio. Precisa ser na maior parte das vezes jovem e experiente para conseguir um lugar ao sol, mesmo quando isso é completamente contraditório, pois na juventude muitos buscam exatamente experiência. Para se conseguir um trabalho é necessário experiência, para se conseguir experiência é necessário um trabalho.

Mas quando chega aos 40 anos, o ser humano é completamente descartável, pois já está "velho" demais para produzir, ainda que tenha acumulado um vasto conhecimento em sua carreira. Uma vez demitido nessa idade, tem muitas dificuldades para encontrar um novo emprego.

Aliás, caso alguém seja qualificado demais, corre o risco de não conseguir o que deseja, mesmo sendo outra contradição, pois o salário para esse indivíduo teria de ser alto, correspondente ao seu tempo de dedicação e poucos querem se arriscar a pagá-lo.

A competitividade é estimulada em lugar da cooperatividade, daí os mais variados comportamentos e personalidades surgem no contexto do trabalho. O "puxa-saco", o arrogante, o que sente a necessidade de "mostrar serviço", o que procura subir puxando o tapete do outro.

Nessa ótica, a culpa é sempre do indivíduo. Não são as peças da engrenagem que estão enferrujadas, é o sujeito que não tem empregabilidade. Segundo o sistema, um indivíduo ainda que seja miserável e sem recursos para sair da situação em que se encontra, como próprio produto do mesmo sistema, é classificado dentro dos parâmetros luciferanos de uma meritocracia que não tem o mínimo cabimento. Toda e qualquer injustiça, para os simpatizantes desse modelo genocida são em sua ótica, plenamente justificáveis. Será que é porque não estão no lugar dessas pessoas?

É importante frisar que essa visão nem sempre se aplica a todos.

Há aqueles que se sentem perfeitamente ajustados ao sistema, quer por afinidade natural ( e aqui não há problema algum), por comodismo, por que de certa forma se beneficia dele, ou por pura ignorância. Como na brilhante frase já explicitada anteriormente, a dependência do sistema faz com que não pensem em outras alternativas mais sustentáveis no ponto de vista social. Muitos, assim estão interessados em defendê-lo cegamente.

Da mesma forma, existem os que não concordam e não se ajustam ao que lhes é imposto, e são logo taxados de vagabundos, esquerdistas, revolucionários, subversivos, fracos, etc.

Os adoradores do sistema usam retórica do Estado paternalista (em alguns casos, pode até ser verdade, quando há interesses políticos, porém em outros não pensam que a função do Estado também é cuidar do bem-estar social), ou do "isso é assim mesmo" (ausência de reflexão), ou partem para o ataque, dizendo que tudo é coisa da horrorosa "militância de esquerda". Ou pior, falam do bom e velho "é o único sistema que funciona". Funciona mesmo? Ou o que funciona é a ilusão de que ele funciona e o resto jogamos pra debaixo do tapete?

Será que não seria a hora de no século XXI se pensarem em novas alternativas para um mundo mais justo? Os entusiastas da escravidão do sistema adoram dizer que não são as crises, como a ocorrida recentemente na Grécia, que irão derrubar o status quo de certos privilegiados. Gostam de ver o castelo ruindo, usando a desculpa do crescimento na crise, mesmo que essa afete psicologica e materialmente milhares de pessoas deixando-as ao Deus dará, e estupidamente torcem pra que ele seja reconstruído não se atentando, ou fingindo que não se atentam ao fato de que ele na verdade não se sustenta. Será que não seria hora de acordar? Afinal, é porque poucos tem tanto que tantos tem pouco...

*ZANETTI, Thiago. O mercado de trabalho é desumano. http://www.thiagozanetti.com.br/?conteudo=artigos_exibe&id=63 Acesso em: 13/01/2014