EVOLUÇÃO
Dizem que a Terra é linda. Onde pousam meus olhos há um rastro de lutas, sangue, guerras. Não há histórias de amor sobrepondo as de lutas. A humanidade se faz nas bombas, nos tiros, nos pretextos. Morrem homens, morrem meninos, falta pão, sobra o frio. Passei pela existência procurando jardins e vi oásis. Em nome de qualquer coisa insana, dizimam. Religiões, territórios, raças, poder, são esses os motivos. A Terra não é de amor, mas de espanto associado ao conformismo da naturalidade das lutas. Quem venceu? A morte vence a vida, o ódio vence o amor, a fome vence a infância, o abandono vence a velhice. Quando olho as outras espécies, como as formigas, invejo-as. Nasceram, colheram e viveram da melhor maneira. Nunca assisti um confronto de formigueiros, apenas de seres humanos.
O que é ser humano então? Todo nosso tempo de vida é tão curto. Passamos a maior parte dele acumulando coisas e muito pouco temos liberdade para respirar a vida, não há para nós o voo da liberdade. Porque temos a consciência? É ela que nos diferencia das formigas e nos faz cometer atrocidades? A consciência é um bem ou um mal? Em um dia chuvoso, vi um homem descendo a avenida, de braços abertos recebendo a chuva, ele cantava meio aos carros que passavam. Aos outros transeuntes ele parecia louco, a mim ele parecia livre.
Toda as pessoas que lotavam as calçadas vestiam roupas escuras e tinham os semblantes carregados, ele não. Ele simplesmente cantava enquanto descia a avenida. Invejei-o! Invejei aquele homem sem consciência. Um homem que passa pela vida e viverá da melhor maneira. O que sabe ele das guerras? O que sabe ele do cativo trabalho ao qual todos nós estamos acorrentados? O que sabe ele sobre ironia ou metáforas ou hipérboles? Em todos os seus dias, esse homem buscará pouco e encontrará muito. O homem livre!
Estou aqui escrevendo e pensando nos homens que fazem as guerras, nos que geram a fome, nos que tiram vidas, nos que estão exatamente agora decidindo essas coisas. Penso no homem da avenida. Nesse momento, vejo a bomba de Hiroshima, vejo urubus cercando crianças ainda vivas em terras africanas, em terras e terras da Terra nossa. Nossa? E então vejo o natal, as vitrines, a pausa, o conveniente. Panelas cheias e panelas vazias, sonhos compartilhados e sonhos assassinados, presentes e a falta deles, futuro e fim. E nas tempestades cada um que tenha seu teto, pois à humanidade falta humanidade. Somos homens lamentavelmente dotados de consciência.