Propriedade

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Um dos assuntos mais problemáticos dentro do confronto político-ideológico desde o século XIX é a propriedade. Até que ponto ela deve ser pública, até que ponto deve ser privada, qual deve ser sua função social e o que justifica (ou não) sua existência são importantes questões da contemporaneidade. Isso porque a reflexão sobre o direito de um indivíduo usufruir de animais, plantas, objetos e locais está na base da criação de qualquer civilização ou constituição.

Dentro desse assunto, é facilmente observável que a relação de possessão se estabelece espontaneamente entre o ser humano e algo, seja isso um local, um objeto ou até mesmo uma pessoa ou algo abstrato. No entanto, não é porque essa relação acontece que ela é correta, até mesmo porque duas pessoas podem desenvolver o sentimento de poder sobre as mesmas coisas. Isso prova que essa ligação é, sim, uma sensação natural, instintiva, como pode ser percebido até mesmo em outros animais, como cachorros que demarcam determinado território ou sentem-se do

nos de fêmeas.

Uma vez entendido que o sentimento de possessão é natural – no sentido de que advém de um instinto humano e independe de sistema para ser estabelecido -, cria-se outra questão: o que legitima ou deslegitima essa relação? Para responder essa pergunta deve-se pensar na indissociabilidade do indivíduo de sua posse, na impossibilidade de uma pessoa ser sem o poder de transformar recursos, que são limitados, naquilo que é necessário para sua existência. Isso porque o existir, o ser, é uma constante modificação de algo anterior para a obtenção do essencial à manutenção da vida, como a transformação de comida em energia, por exemplo.

Logo, por mais que um sistema político tente subverter as mais diversas possessões, isso jamais poderá ser completo, visto que: negar isso seria negar a o instinto, o que geraria uma eterna repressão da nossa natureza; haverá sempre posses estritamente necessárias para a própria sustentabilidade humana, como sociedade e até mesmo como espécie - por exemplo, alimentação e roupagem. Além disso, sem a auto-propriedade nada impediria* que alguém matasse uma pessoa, retirasse aquilo de que necessita, como seus órgãos, ou a obrigasse a trabalhar. Isso causaria um estado de caos social, no caso de qualquer um poder ter tais atitudes, ou de repressão total, no caso disso ser instituído por um estado, além de aumentar a insegurança e ser uma ameaça à existência, à autorrealização e à prosperidade.

Com base no que foi apresentado, torna-se claro que a inexistência da propriedade, além de ir contra a natureza humana, geraria instabilidade dentro de qualquer estrutura social*. Entretanto, deve-se fazer uma ressalva, a possessão existe porque um indivíduo com algo estabeleceu um processo de transformação, o que é necessário para sua sobrevivência. No entanto, com a sofisticação da sociedade, a elevação da produtividade e da consequente busca por segurança e conforto, é lógico que haverá uma abstração desse conceito. Isso gera situações como aluguéis, vendas, ações. Em todas essas, porém, pode-se observar que houve, em algum momento, o emprego de trabalho, do poder de transformar, e isso legitimou a propriedade. Depois disso aconteceram trocas voluntárias, que permitiram uma melhor alocação de recursos, ou seja, se em um momento alguém pensou que um carro valia mais que um pequeno apartamento, e outra pessoa o contrário, o acordo ajudou a satisfazer as necessidades – ou desejos – de ambos.

Contudo, há outro tipo de propriedade. Essa, não pode ser legitimada por trabalho, transformação, ou qualquer conceito do gênero, mas meramente pela visão de um Estado, que acredita que aquilo pertence a certa pessoa. Ao longo da história, reis, nobres, líderes e pessoas beneficiadas pelo gestor central da sociedade puderam gozar de um “direito” garantido apenas pela força das armas e das leis, geralmente monopolizadas, dessa entidade. O problema é que esse tipo de relação, ao contrário da que foi anteriormente descrita, não traz vantagem alguma, pelo contrário: o problema da escassez é agravado, isso porque porções gigantes de terras são destinadas a alguém que nada fez com aquele local; recursos de toda a sociedade, geralmente obtidos de forma coerciva, repressiva, são destinados à manutenção daquilo que, na realidade, a nenhum humano pertence, e, portanto, poderia ser destinado àqueles que ali pretendem trabalhar.

Entretanto, nada é tão problemático quanto a conceituação do que deve ser a função social – se ela for existir. Primeiramente, deve-se considerar que uma pessoa não pertence a uma sociedade se ela não compartilha valores, características e desejo de pertencimento a

o grupo. Logo, dizer que uma pessoa não pode isolar-se por ferir a determinada função social é contraditório. Como alguém pode ser obrigado a buscar o bem comum de um coletivo se ele não pertence a essa comunidade?

Além disso, é importante considerar que por mais homogênea que uma sociedade possa ser, indivíduos diferentes possuem diferentes objetivos. Por conseguinte, o bem comum torna-se algo difuso, cada qual tentando fazer parecer com que aquilo que desejam é o que a comunidade, como um todo, precisa.

Sistema alternativo, e já aplicado, é o da busca da satisfação pessoal, geralmente na forma do lucro. Esse modelo, à primeira vista inconsequente e egoísta, esconde todo um lado de sustentabilidade e otimização de recursos. Isso porque é baseado no sistema de preços. A monetização da economia, com a formação desse sistema de preços pode parecer algo trivial à primeira vista, contudo, ele, implicitamente e por informações coletadas nos diversos mercados, mostra preferências temporais e o valor (que é subjetivo) que os consumidores dão aos produtos, além de ser influenciado pela oferta e pela demanda.

Logo, sempre que alguém ganha dinheiro de forma voluntarista – ou seja, sem forçar alguém a fazer isso –, ele está, mesmo que sem querer, fazendo algo positivo para a sociedade, como: fornecer produtos que as pessoas querem pelo preço que estão dispostas a pagar; produzindo mais – o que eleva o padrão de consumo e provoca queda nos preços; diminuindo os custos – e consequentemente, o impacto ambiental, além de deixar mais recursos disponíveis para outros itens que podem ser feitos.

Dito isso, nota-se que a propriedade é indissociável da natureza humana, representando um incentivo a produzir, além da segurança que traz ajudar na geração de respeito mútuo entre os indivíduos – uma vez que cada um reconhece o espaço do outro. Nesse sentido, esse direito é um núcleo da sociedade contemporânea, mantendo uma ordem próxima da espontaneidade e ajudando na busca da felicidade e prosperidade.

*A única exceção plausível seria um sistema controlado de “cima para baixo” no qual a vontade humana é subvertida a um bem coletivo – quase sempre arbitrariamente definido por líderes, burocratas e demagogos – em que se despreza qualquer valor na vida humana, a não ser para chegar a determinado fim. Mas eu, além de criticar o bem comum, suponho que ninguém defenda tal sistema.

OtavioZ
Enviado por OtavioZ em 20/11/2013
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