EM DEFESA DOS ANIMAIS
Para me arvorar a escrever este texto a respeito do tema Em defesa dos animais (eu me refiro aos animais que a ciência chama de irracionais), preciso me revestir de coragem, de discernimento e raciocínio, tanto para a apresentação do tema, quanto para a elaboração das estratégias argumentativas sem manipulações e trapaças; e, ainda, para a ilustração do meu pensamento com as provas necessárias ao convencimento do “auditório”. Além do que, devo ser enfática e objetiva na retomada das linhas gerais desenvolvidas para compor o desfecho (epílogo).
Li esta manhã que importante cientista estrangeiro sugeriu ao Brasil a abertura do debate sobre a causa dos animais. O que esse estudioso do MIT (Massachusetts Institute of Technology) propõe, na verdade já se encontra no debate popular e amplamente divulgado pela mídia, a exemplo do recente episódio ocorrido no Instituto Royal.
O eminente pesquisador deve estar ciente de que temos legislação aprovada no sentido da proteção aos animais. Por outro lado, simpatizantes e militantes da, sem dúvida nobre causa, veiculam postagens na Internet e também fazem suas declarações e manifestações públicas em defesa dos bichos (estou usando o termo sem intenções irônicas ou de menosprezo, mas até porque preciso evitar a repetição das palavras para além do suportável).
Estou convicta de que pessoas há, de bom coração, e que realmente se importam com o sofrimento dos animais. Também já estou informada a respeito de outras que, tanto maltratam seres irracionais quanto o próprio irmão, semelhante.
Lógico é que, se agressões e brutalidades estão sendo praticadas por aqueles que se dizem racionais, é preciso uma tomada de posição e uma ação incisiva sobre os acontecimentos. É inadmissível permanecer indiferente ao sofrimento (peço desculpas pelo meu descaramento por falar deste tema e, paradoxalmente, ser uma apreciadora das touradas). Até peço que os conhecedores da psicologia e da espiritualidade enunciem motivos que expliquem o meu estranho gosto de ver os toureiros vencerem os touros. Entretanto, me sentiria muito mal em rinhas de galos e, também, fico aflita com algumas espécies de esportes violentos como o MMA.
A minha história de vida é a de ser filha de um casal radicado na capital de Sergipe, mas cujas origens são interioranas. Durante a minha infância e adolescência vivi em uma casa com quintal e onde sempre tive contato com a Natureza. Dias de sol, dias de chuva, dias de trovoadas.
No quintal vi galinhas, ninhadas de pintos e, não podia faltar, o galo cocoricando, “tecendo as manhãs” e regendo a orquestra composta pelos galos dos quintais vizinhos.
Havia pombos em caixotes abertos e colocados ao longo do muro do quintal. Havia passarinhos, periquitos, perus, patos e, até um tanque para que estes se refrescassem em dias de sol insuportável. O meu pai gostava de passarinhos em gaiolas, eu também, mas veio o tempo em que ele desistiu de ser o diretor da prisão dos bichinhos que nasceram com asas para viver a liberdade do céu azul de Aracaju. Eu herdei o gosto do meu pai, entretanto, perdi o interesse em manter pássaros engaiolados. E nem havia tal necessidade em um quintal onde não faltavam as rolinhas, as viuvinhas, os cardeais, e tantos outros que voejavam entre as plantas.
Não vou deixar de lado as borboletas “Brancas/Azuis/Amarelas/E pretas”, pois no meu quintal brincavam “Na luz/As belas /Borboletas”. Eu até juraria que o Vinícius foi ali que buscou a inspiração para estes versos.
Além das borboletas, havia grilos, lesmas, joaninhas, soldadinhos, lagartixas, esperanças, Marias-fedorentas, libélulas (que o nordestino chama de lava-cu), formigas, abelhas, marimbondos e cavalos do cão.
Naquelas boas épocas os gatos passeavam pelos muros, pelos telhados e se aproximavam da cozinha em horas de cortar carnes, tratar peixes. Ficavam sonsos e com os olhos compridos nos restinhos que esperavam.
Sabem o que mais havia no quintal? Minhocas, lagartas, cobras e aranhas. Isto e mais algumas coisas vi. O que nunca vi foi gato vestido de gente, esses felizes animais daquele tempo antigo e bom miavam a madrugada inteira, namorando e fazendo outros gatinhos em suas gatinhas. Eu me recordo que ficava bem quietinha, na minha cama, esperando a fêmea fazer aquele escândalo. E eu morria de pena da pobre gata, pois eu nem sabia o real motivo pelo qual fazia tanto barulho.
Quanto aos cães, eu os via passar pelas calçadas. Desciam a rua, pela manhã, e, à noite voltavam. Então, eu ficava pensando sobre o que se passava naquelas cabeças caninas. E queria entender como sabiam ir e voltar para as casas dos seus donos.
Os gatos, sim, alguns vi esborrachados em almofadas sedosas e bordadas, velhos e gordos, em casas de senhoras. Os bichanos passavam o tempo inteiro na mesma posição e mexendo apenas com os olhos, os bigodes e a língua. Alguns gatões usavam um laço de fita no pescoço, apenas isto. A tigela no chão com o leite e ele morria de preguiça de descer da cadeira. Fechava e abria os olhinhos cochilando. Na sala o rádio tocando músicas românticas. A tarde se espreguiçava ajudando o gato metido a rei.
Isto vi, mas, nunca presenciei pessoas da minha infância e adolescência que fizessem de animal algum uma espécie de filho das próprias entranhas. Jamais vi uma só dessas pessoas beijando nos arredores da boca de um gato ou de um cão. Jamais escutei alguém dizer ao animal uma frase como esta: “Venha com mamãe”. E jamais vi alguém deitar-se com qualquer dessas ou outras criaturas da natureza.
Particularmente, vejo nisto de hoje, nessas situações inexplicáveis onde são vistas tantas crianças sem amparo, dormindo nas calçadas e com fome, e de tantos animais tirados de sua naturalidade, de seus telhados e ruas para os quartos climatizados e outros ambientes, um exagero. Confesso que chego a pensar que a lei deva também proteger os animais de pessoas que os retiram do habitat natural e os pervertem colocando-os nos hábitos e costumes humanos.
Em defesa dos animais ingresso no debate, pois brasileira sou e os respeito. Sugiro, entretanto, que participem de uma discussão civilizada os estudiosos da medicina veterinária e outros, do comportamento humano e do comportamento dos animais que agem por instinto. E, se agem mesmo por instinto, horas há em que parecem racionais, tendo em vista que esses seres não se sentem e nem agem como se fossem nossos parentes.