Um tiro na alma

                  Publicado no Jornal de Opinião, 15.04.2007


    Minha filha chama-se Raíssa. No dia 13.01.2007. às 20 horas, quando as luzes do dia cediam espaço ao crepúsculo e começavam a se apagar, uma mão, aproveitando-se da primeira sombra da noite, acionou o gatilho de um revolver na sua direção, retirando-a do epaço externo para um tempo de dor.. Todo um batalhão de células de seu corpo, jovem, temendo a morte, colocou-se em alerta defendendo os seus 25 anos de vida. A bala, cruel, que procurou roubar-lhe a vida,  e que permanece ainda em seu corpo, está alojada também em minha alma de pai. 
    Na década de 60, eu habitava o Rio de Janeiro. Ainda não era universitário, mas os livros e as livrarias me encantaam, talvez mais que toda a beleza esfuziante da Bahia da Guanabara. Vindo do Sul de Minas, o meu primeiro sonho de consumo foi adquirir uma estante para guardar os livros que eu comprava à prestação e dificuldade. Encantava-me ao vê-los na estante, depois de abrir página por página – as páginas eram coladas. Os livros passaram, então, a "determinar meus sentimentos, meus pensamentos, meu entendimento do mundo. Passaram a ser o mapa da minha alma".
    Embriaguei-me de Jacques Maritain e Raíssa, sua esposa, Leon Bloy: "Sofrer passa, ter sofrido não passa nunca", só para citar alguns – consciente que  o amor leva ao eterno. Uma prima, erudita, ao conhecer minha pequena biblioteca, disse: "Sua estante cheira a vela" Mais tarde, na Universidade, fui em busca da colheita de verdades ou de promessas, busca que deixou atônito meu coração e minha alma de caipira impregnadas de uma fé, ingênua e pura. 
    Minha alma, pura, que só conhecia e alegrava-se com a natureza, os pássaros, rios – livres como eles, começou a perceber que os conhecimentos científicos e fiosóficos estavam minados na base pelo relativimos dos sábios, pelo ceticismo dos filósofos.
    Entretanto, na literatura e na poesia encontrei a minha salvação. Aprendi com Albert Camus que artistas de verdade não dsesprezam nada, eles são obrigados a entender ai ubvpes de julgar e, no mundo, "o amor é uma das poucas coisas que ainda merece as honras do respeito". Dostoievwski abriu a minha mente para a realidade existencial; Pascal para as sutilezas da alma humana.
    Viver é muito perigoso, diz-nos o Riobaldo da novela de Guimarães Rosa. "As coisas nascem, crescem e morrem, e,às vezes, depois renascem dentro da gente, sem que a gente saiba bem como".
   Honrar, em Hebraico, significa atribuir ao pai e à mãe seu peso de presença, seu peso de raiz. Mas, um dia, libertarmo-nos de nossos pais, que foram os meios por intermédio dos quais a vida nos foi dada. "Devo honrar esse fato e ser reconhecido a ele por isso. Ao mesmo tempo, não posso tomar meu pai e minha mãe como absolutos. Somene assim tornarme-ei livre" (Jean Ives Leloup") Somos também filhs do vento, filhos do sol e filhos da terra, "Vossos filhos não são vossos filhos. Sãos os filhos, e as filhas da ânsia da vida por si mesma. Vem através de vós,mas não de vós. E embora vivam convosco, não vos pertencem. Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos, porrque eles têm seus próprios pensamentos.Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas; pois suas almas moram na mansão do amanhã...", afirma o poeta Gibran Kalil Gibran.
   Ninguém se esquece da porta da morte, principalmente quando um filho nela se apoia. 
  Com a alma ferida, lembrei-me do padre Orlando Vilela: "O que gosto, convém não olcultar, é ler poetas e romancistas, Os poetas nunca fizeram mal ao mundo. Eles, os romancistas, são as criaturas que mais nos ajudam a conhecer os homens. E a poea e escritora DéaJanuzzi, herdeira na contemplação da verdade eterna, com um toque terapêuico de amor, em Diário de Bordo, Estado de Minas, 28.01.2007, na sua coluna Coração de Mãe, acalmou  meu coração e varreu o lixo emocional e dolorido, ao escrever: Não sei trancar, aprisionar, bater, diz ela, mas sei chorar quando tudo parece perdido.Não sei cuidadar de mim, mas sei acolher, Sei quando alguém ao meu lado está sofrendo. Tenho compaixão pelas pessoas que vivemm pedindo piedade. Senhor piedade!
  Não consigo ter paz num mundo em guerra, mas sei rezar, abrir meu coração, ficar em silêncio, perdoar e conversar com Deus, se preciso for. 
   Não sei criar filhos nem pássaros, nem cães, nem cuidadar de plantas,mas sei fazer vinculos humanos.Não sei amar como os outros amam, mas sei ouvir, abrigar, acolher. Sei errrar e reconhecer outra vez, até para não aprender o que todo mundo já sabe.Adoro viver o presente, porque o amanhã ainda não chegou e o passado foi ontem!

                                              Roberto Gonçlves
Escritor
RG
Enviado por RG em 30/08/2013
Reeditado em 28/07/2017
Código do texto: T4458779
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