Uma introdução a Sociologia do currículo
A concepção sobre o currículo vai muito além das qualificações e aptidões de um candidato a alguma vaga de emprego que descreve suas experiências profissionais, sua formação escolar e acadêmica, e seus dados pessoais.
Em seu texto Sociologia e Teoria crítica do currículo: uma introdução, Moreira e Silva (1995) apontam que as diversas áreas educacionais que buscam estudar o currículo, a muito tempo, deixaram de ser voltadas exclusivamente para questões técnicas e metodológicas. Ao acompanhar os processos históricos esses autores, demonstram as emergências teóricas, a institucionalização, as limitações e os debates que envolvem as teorias do currículo em diversas países e realidades.
A partir do final do século XIX nos Estados Unidos, o currículo foi alvo de atenção de todos aqueles que buscavam compreender os processos socioeducativos no âmbito escolar. Esses teóricos da educação tinham como preocupação com os processos de sistematização, racionalização e controle dos alunos e seus hábitos para evitar que eles fugissem das metas e padrões estabelecidos. A partir de então, pode-se falar de uma teoria sociológica direcionada para o currículo. Com o tempo, o mesmo, passa a ser considerado uma tradição crítica dentro de um todo social e cultural.
Todavia, Moreira e Silva (1995) afirmam que não se deve procurar entender a sociologia do currículo como algo unidirecional e monolítico, pois durante o seu desenvolvimento passou a ser um campo em disputa de diversos teóricos dentro de um contexto de transformações sociais, políticas e econômicas. No Brasil, por exemplo, surgiu duas principais tendências: o escolanovismo e o tecnicismo. A primeira através de Dewey e Kilpatrick preocupava-se com a elaboração do currículo através dos interesses do aluno. Já a segunda com a valorização excessiva com os recursos tecnológicos e com a atuação dos técnicos.
Com o tempo, a estabilidade social da década de 50 deu lugar a crise cultural que se inicia no final dos anos 60 e se prolonga até o inicio da década de 70. A insatisfação e perpetuação da desigualdades levaram diversos países como o Estados Unidos, Inglaterra e França ao questionamento do modelo reformistas e de seus programas de reformas sociais, inclusive no âmbito educacional. O resultado foi que esse campo expandiu-se através de um manancial de referenciais teóricos como: o neomarxismo, a Escola de Frankfurt, as teorias da reprodução, a fenomenologia, Escola de Chicago, a etnometodologia, entre outras.
A partir dos anos 70 e 80 diversos especialistas, buscavam novas interpretações para esse campo. Muitos deles, rejeitavam a tendência hegemônica de que o currículo é algo apolitico e intrumental. “Uma nova Sociologia da Educação floresceu e estabeleceu como seu principal objeto de estudo o currículo escolar, aproximando-se, assim da Sociologia do Conhecimento” (MOREIRA; SILVA p.19, 1995). Com a defesa dos direitos das mulheres, negros, imigrantes, indígenas e homossexuais, discute-se cada vez mais que o currículo possa ser um artefato que combate, perpetue ou intensifique as contradições e desigualdades sociais.
Segundo Moreira e Silva (1995) não se pode afirmar que o currículo seja algo despretensioso e desinteressado. Ele não possui um caráter neutro, podendo ser passando a estar dentro de diversas formas de manifestações e relações de poder através de grupos que possuem visões sociais particularistas, interessadas e direcionadas.
Percebe-se que o currículo está presente nos aspectos conflitantes da vida social, possuindo também um caráter político que reforça aspectos culturais ou pode vir a ser contestado em uma determinada instituição ou em uma conjuntura global. Assim, o currículo deve ser utilizado como uma proposta que almeje ser compatível com os objetivos da cidadania, democracia, justiça e diminuição das desigualdades sociais.
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Trecho retirado de um trabalho acadêmico da disciplina de Desigualdade educacional.
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Referência
Curriculo, cultura e sociedade. Antonio Flavio Barbosa Moreira. Tomaz Tadeu da Silva (orgs): tradução de Maria Aparecida Batista. 2 ed. revista São Paulo Cortez, 1995