Brasil: 500 anos de turismo sexual

Relendo na Internet uma notícia referente a um protesto no Aeroporto Galeão (Rio de Janeiro), realizado em fevereiro por ativistas do grupo feminista Femen Brasil, contra a prática do turismo sexual feito por estrangeiros no Brasil, veio um pensamento à minha mente: a “Terra do Pau-Brasil” continua muito parecida consigo mesma ontem.

Recentemente naveguei pelas páginas dos livros “A Viagem do Descobrimento” e “Náufragos, Traficantes e Degredados”, do escritor gaúcho Eduardo Bueno, que tratou dos navegantes de antanho e de seus feitos na “Ilha de Vera Cruz”.

Pela ordem, espanhóis, portugueses e franceses aportaram por aqui nos idos de 1500. Os segundos tomaram conta oficialmente, até porque possuíam um papel passado que lhes garantia tal direito: o Tratado de Tordesilhas. Os outros foram os “piratas” da “Terra dos Papagaios”, nome oficioso que a marujada dava ao nosso país, devido à enorme quantidade dessas aves, sistematicamente levadas para a Europa.

Óbvio que ibéricos e francos não singravam o então “Mar Tenebroso” por causa dos papagaios. Queriam as especiarias das Índias. Como as rotas terrestres para lá estavam fechadas pelos árabes, que as liberavam apenas para os venezianos, restava aos outros se aventurar pela costa da África descendo ao sul ou atravessar o oceano à oeste, procurando um caminho marítimo para as Índias.

Os espanhóis, com Colombo, tentaram a via oeste em 1492. Os portugueses, estimulados pelo inigualável Infante Dom Henrique, mentor da Escola de Sagres (que, fisicamente, não existiu), tentaram a sul. E como vieram dar no Brasil, então? Os responsáveis foram Bartolomeu Dias e Vasco da Gama.

Dias é tido como o descobridor da “volta ao mar”, ou seja, uma grande curva que os portugueses realizavam no Atlântico, a partir da costa de Cabo Verde, a fim de escapar dos ventos e correntes desfavoráveis à navegação à vela nos contornos da África. Era uma formidável descoberta e segredo lusitano. Pois Vasco da Gama, ao fazer a volta à oeste antes de descer pelo sudeste, passou perto da costa brasileira, onde hoje é o Rio Grande do Norte. Pelo movimento das aves, mandou registrar no seu diário que deveria existir terras ali perto, à oeste. Colombo achava que eram as Índias, mas eram as américas.

Assim, quando Cabral apareceu por aqui em abril de 1500, foi mais para tomar posse e ver o que havia nessas terras, antes de também seguir para as Índias. Descobriram grande quantidade de uma árvore valorizada pela tinta que dela se extraía para a indústria têxtil, o pau-brasil, e, para delírio dos marinheiros, as nativas, belas, amistosas e cheias de amor para dar.

Para encurtar a história: os que, como castigo, eram desterrados ou degredados, daqui não queriam fugir. E a grande preocupação dos capitães portugueses passou a ser impedir os marujos de descerem a terra, pois a deserção era tal que comprometia as condições técnicas de retorno das naus carregadas de madeira. Os reis queriam o pau-brasil, os marinheiros as índias de carne e osso, de beleza decantada por vários relatos oficiais, sendo a carta de Pero Vaz de Caminha apenas a primeira delas.

Portugueses, espanhóis e franceses (os dois últimos ilegalmente) adoravam ficar aqui, em poligamia com as brasileiras, constituindo famílias mestiças e vivendo da escravização das tribos rivais e do comércio do pau-brasil, as duas primeiras atividades econômicas praticadas em larga escala na nova terra.

Os livros de Bueno trazem várias citações oficiais (algumas hilárias) sobre a refestelança sexual que ocorria e que escandalizaria os missionários jesuítas. As moças do Femen, protestando com os seios desnudos, apenas denunciam uma face do Brasil que, ao que parece, diminuiu bem menos do que a quantidade de pau-brasil e de papagaios...


Texto publicado na seção de Opinião do Jornal Portal de Notícias: http://www.portaldenoticias.com.br