A IMPARCIALIDADE JORNALÍSTICA: MATÉRIAS VEICULADAS NA TV
Venho, há muito tempo, refletindo sobre a premissa de que a imparcialidade jornalística, tão propagada na divulgação da notícia, só existe do ponto de vista do repórter e não da própria notícia. Dificilmente a Teoria do Espelho (pressupõe que as notícias são como são porque a realidade assim as determina e está baseada na objetividade do trabalho jornalístico que conta a verdade, doa a quem doer) reflete a verdade dos fatos. A função do jornalista é fazer textos claros, precisos, diretos, objetivos e concisos, lembrando sempre que ele é a ponte entre o fato e o leitor e que, por causa disso, os seus textos devem ser imparciais e objetivos, sem emitir opiniões, deixando isso para o leitor, para que ele tire as suas próprias conclusões.
Partindo dessa premissa, eu até acredito que o fato assim possa ser contado de forma imparcial pelo repórter – dependendo do que seja – porém, eu não acredito que ele seja capaz de descrever fielmente o que de fato aconteceu. E nessa premissa existem vários fatores para que isso não ocorra em favor da imparcialidade jornalística. Digamos que houve um acidente automobilístico envolvendo dois carros. O repórter é avisado desse acontecimento e se dirige para o local. Ora, entre o sinistro e a chegada do repórter já transcorreram vários preciosos minutos. Quando o repórter chega, procura colher as primeiras informações com quem chegou ao local primeiro – para prestar socorro – ou vai receber essas informações dos próprios envolvidos no acidente. É claro que ele irá encontrar divergências de opiniões e de relatos. Como ele tem a obrigação de olhar todos os lados do fato, as autoridades competentes também são ouvidas, para se determinar, por exemplo, quem causou o acidente, quem está errado, etc. Até aí ele pode relatar apenas o que “ele ouviu”, mas ele se esquece de dizer algo para os leitores: na verdade, o que “ele realmente viu” foram os detalhes modificados do local do fato. Desta forma, a sua escrita, mesmo que não queira, traz a parcialidade de sua emoção e, consequentemente, da opinião.
Além do mais, vivemos num mundo que gira em torno do interesse financeiro que determina as necessidades que cada um de nós precisa ter. A literatura jornalística está cheia de casos em que os interesses privados (e públicos) são os condutores do processo de verdades contidas nas imagens que são desenhadas no cotidiano do cidadão comum. Daí classifica-se empresas como sendo mais ou menos transparentes, com mais ou menos credibilidade, em função de sua estrutura e potencial financeiro. Mas, invariavelmente, os interesses estão por trás da notícia. A notícia que afeta, retira ou traz benefícios para a massa, só é veiculada de acordo com os interesses da classe política dominante de um país. A mídia tem o poder de controlar, manipular, conduzir as informações a seu bel-prazer. Um caso clássico de manipulação de informações, por parte da mídia televisiva, foi o das eleições de Collor contra Lula, quando uma emissora de televisão editou trechos de um debate e colocou, para o público, como se fosse a íntegra das respostas de um dos candidatos. E o que é pior: como se fosse ao vivo! Portanto, a imparcialidade acaba a partir do momento em que o interesse financeiro passe a ser a peça principal da notícia.
Nos anos cinquenta, um jornalista percebeu o fluxo de informações que chegavam às redações e como poucas eram publicadas. Diante de um grande número de acontecimentos, só viram notícia aqueles que passarem por uma cancela ou portão e quem decide isso é um selecionador, que é o próprio jornalista. Ele é o responsável pela progressão da notícia ou por sua morte, caso não a deixe ser publicada. Então, ele resolveu estudar quais pontos funcionam como cancela. Ele concluiu que a forma de escolher as notícias é subjetiva e arbitrária. Muitas foram rejeitadas por falta de espaço, outras consideradas repetidas e algumas pelo tempo, pois chegaram tarde. Essa é a Teoria do Gatekeeper (gate = portão; keeper = guardião) – esta pressupõe que as notícias são como são porque os jornalistas assim as determinam. Isso explica como a notícia pode ou não ser veiculada em um meio de comunicação, já que o filtro funciona, justamente, para que ela (a notícia) não vá de encontro aos interesses que esse veículo tem com relação aos seus patrocinadores, políticos de primeiro escalão e potenciais investidores em suas campanhas publicitárias. Por isso que é uma quase rotina o cidadão ligar a sua televisão, presenciar um fato e trocar de canal e, em outra emissora, o mesmo fato ser noticiado de maneira diferente. Com conotação diferente.
Em minha opinião, o caso mais parcial, mais absurdo, acontecido dentro do noticiário brasileiro, foi o da Escola Base de São Paulo em que sete pessoas foram acusadas, em 1994, injustamente, de pedofilia. O caso: em março de 1994, a imprensa publicou reportagens sobre sete pessoas que estariam envolvidas no abuso sexual de crianças, alunas da Escola Base, localizada no bairro da Aclimação, em São Paulo. Jornais, revistas, emissoras de rádio e de tevê basearam-se em fontes oficiais - polícia e laudos médicos - e em depoimentos de pais de alunos. Na verdade, tratava-se de um erro. Quando foi descoberta a veracidade dos fatos – inocentando as pessoas envolvidas no episódio – a escola já havia sido depredada, os donos estavam falidos e eram ameaçados de morte em telefonemas anônimos. Todas as emissoras de televisão foram condenadas a pagar indenizações milionárias para as pessoas prejudicadas. Atualmente, o caso permanece arquivado por falta de provas, o casal de proprietários da escola se divorciou e não mais conseguiu trabalho em sua área de atuação.
Acredito que a melhor forma de jornalismo é o jornalismo investigativo. Entretanto, esse tipo de jornalismo é considerado de alto risco para quem o pratica. Um exemplo disso é o do repórter Roberto Cabrini – hoje no SBT. Até a própria polícia armou para cima dele. Plantou provas contra ele, taxou-o (“comprovadamente”) de viciado em drogas e até o sequestrou (como se fosse um sequestro praticado por traficantes). Porém, é esse – se tiver o aval da empresa em que trabalha, não o vinculando aos seus interesses particulares – que deve ser exercido pelo profissional da comunicação e por aqueles que têm o compromisso de mostrar os fatos como eles, verdadeiramente, acontecem. O jornalismo investigativo acontece de forma planejada, com tempo para ouvir todas as partes, sem a pressa que o jornalismo diário, de redação, precisa. O jornalista que precisa de tempo está sempre correndo contra ele para poder escrever as suas três matérias diárias, diferentemente do jornalista que se dedica à pesquisa, a esmiuçar arquivos, documentos, ouvir pessoas, buscar pistas. Acredito que se buscarmos, dentro da lei, a garantia de um trabalho ético, pautado na moralidade que a sociedade realmente almeja, o órgão em si não é tão importante – embora seja o norte e sirva como o respaldo institucional de uma profissão.
REFERÊNCIAS:
SOBRE A IMPARCIALIDADE DO JORNALISTA (8 ANOS DE BLOG). Disponível em: oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2012/03/20/sobre-imparcialidade-do-jornalista-8-anos-de-blog-436592.asp Acessado em: novembro/2012
MÍDIA E QUESTÃO SOCIAL: EDITORIA JORNALISMO NA CORRENTEZA. Disponível em: midiaequestaosocial.blogspot.com/2012/01/editoria-jornalismo-na-correnteza.html. Acesso: novembro de 2012
JRNEWS RECORDA O CASO DA ESCOLA BASE APÓS 18 ANOS | JORNAL DA - R7. Disponível em: noticias.r7.com/jornal-da-record-news/2012/03/26/jrnews-recorda-o-caso-da-escola-base-apos-18-anos/ Acessado em: novembro de 2012
INVESTIGAÇÃO CONCLUI QUE PRISÃO DE ROBERTO CABRINI FOI ARMAÇÃO. Disponível em: portalimprensa.uol.com.br/noticias/brasil/39940/investigacao+conclui+que+prisao+de+roberto+cabrini+foi+armacao+policial/ Acesso em: novembro de 2012.
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