Prevenir, Para Não Remediar
A vida no mostra que é razoável termos o direito de errar. Até para não reincidirmos no erro. No entanto, parece que não aprendemos. A tragédia na boate Kiss, na cidade de Santa Maria, RS, é mais um exemplo disso.
Sabe-se que no desastre da tsunami, na Ásia, autoridades americanas chegaram a detectar o que poderia acontecer, através de sismógrafos ou equipamentos correlatos. Não puderam, contudo, por algum motivo, prevenir os responsáveis pela segurança na praia de Patong, em Phuket, local de uma das ocorrências. Entretanto, é propalado o conhecimento que têm os japoneses, os americanos e autoridades de países onde ocorrem terremotos, tornados, tsunamis, etc. de procedimentos capazes de reduzir os efeitos catastróficos de efemérides desse tipo.
A bomba que explodiu antes da hora no Riocentro e vitimou elementos ligados à ditadura militar, felizmente impediu que milhares de pessoas fossem vítimas de uma estratégia criminosa e infeliz. Nesse caso seria praticamente impossível atitudes que pudessem prever o desastre. Tratava-se de um ato terrorista. Como seria também a explosão do gasômetro, próximo à Rodoviária Novo Rio, no Rio de Janeiro, evitada heroicamente pelo Capitão Sérgio Macaco, da Aeronáutica, que foi por isso punido por seus superiores. Como foi também a derrubada das Torres Gêmeas (Twin Towers), em Nova Iorque, em 11/09/2001. Um ato terrorista com chances praticamente nulas de ter sido prevenido. Apesar de toda a parafernália tecnológica e de espionagem com que contam os americanos.
Contudo, a tragédia do Bateau Mouche, com 55 mortes contabilizadas, que “naufragou na noite de 31 de dezembro de 1988, na Baía da Guanabara, Rio de Janeiro”, possivelmente poderia ter sido evitada. Se as autoridades responsáveis pelo tráfego naval na costa brasileira tivessem obrigado os organizadores do evento a respeitar os limites de passageiros no barco.
Na tragédia do Morro do Bumba, que pôs fim a 267 vidas, em abril de 2010, em Niterói, Rio de Janeiro, se ao longo do tempo as autoridades responsáveis pela ocupação do solo tivessem impedido assentamentos ou construção de moradias em área de aterro sanitário, o resultado poderia ser outro.
No incêndio do Gran Circus Norte-Americano, uma semana antes do Natal de 1961, também em Niterói, onde cerca de 500 pessoas perderam a vida e mais de 120 ficaram mutiladas, e de onde emergiu a figura do profeta/poeta “Gentileza”, que teria perdido parentes na tragédia, possivelmente o resultado não teria sido tão catastrófico se as autoridades tivessem realizado cuidadosas inspeções das instalações do circo e estabelecido possíveis rotas de fuga, em caso de incêndio. Que se soube depois tratar-se de um ato criminoso – um dos empregados teria provocado o desastre por ter sido demitido.
Somos tentados a creditar, então, que a prevenção pode evitar muitos males. Um avião quando sobe, tem que ser cuidadosamente revisado. Pode parecer, apesar de termos os airbuses, mas não é exatamente igual a um ônibus. Que estaciona, o funcionário verifica a calibragem dos pneus, se há óleo no motor, se os freios estão sem problemas, etc., e pronto – o veículo volta a rodar. O avião tem que merecer uma revisão mais cuidadosa. Pois, se houver um problema lá em cima, já era.
Agora ouvimos e vemos pela TV, que vai explorar ao máximo o acontecido – há que se atingir os maiores índices de audiência possíveis – que autoridades reúnem-se com o objetivo de definir um conjunto de leis capazes de, sendo obedecidas, impedir que tais acidentes se repitam.
Vemos também profissionais de órgãos como o CREA (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia), e outros órgãos específicos, dizendo o que deve ser feito para que resultados como esses não sejam verificados. Ironicamente profissionais que deveriam trabalhar antes do acontecimento, zelando pela observância de leis ou posturas que já existem, na fiscalização e vistoria de casas noturnas, escolas de samba, restaurantes, estádios, palcos grandiosos em praias ou outros locais, teatros, cinemas, casas de show em geral, etc. Curiosamente tais profissionais só aparecem depois do ocorrido. São como engenheiros cujas obras já foram concluídas.
É mais do que natural a comoção generalizada. E de que dela redundem proposições, por parte de deputados, senadores e até da Presidência da República, visando o aperfeiçoamento da legislação existente para a prevenção de acidentes terríveis como o de Santa Maria. Afinal foram cerca de 230 vítimas fatais. Mas é natural também que reconheçamos que o Brasil talvez seja o campeão do mundo em número de leis. Há leis para tudo. Só que as leis sozinhas não fazem nada. A questão é fazer com que sejam observadas.
Rio, 29/01/2013