NENHUMA PENA PASSARÁ DA PESSOA DO CONDENADO:
Resumo
Este artigo científico versa sobre a aplicabilidade dos Princípios Constitucionais, em que a garantia da ordem pública esteja concatenada com a nova realidade social, sobretudo no aspecto dos Direitos Humanos, concernente, inclusive, à manutenção do Estado Democrático de Direito. Assim, os mandamentos preconizados na Carta Magna devem servir de azimute à resolução dos conflitos da coletividade. Desta forma, quaisquer que sejam os objetivos dos operadores do direito, devem balizados pelos valores principiológicos à consecução do bem estar comum. O presente trabalho aborda ainda acerca das nuances do Sistema Prisional Brasileiro, seus aspectos axiológicos, e as peculiaridades inerentes à revista íntima corporal dos parentes dos encarcerados, nos diversos estabelecimentos penais deste país, em especial, na Bahia.
Palavras-chave: Princípios Constitucionais. Sistema Prisional, Revistas Corporais Vexatórias.
Abstract
This paper examines the applicability of constitutional principles, in which the guarantee of public order is concatenated with the new social reality, especially in the aspect of human rights, regarding the maintenance, including democratic State of law. Thus, the commandments set out in the Charter should serve the azimuth resolution of conflicts of the collectivity. This way, whatever the objectives of the law, must be ensured by the principiologicals values to the attainment of the common welfare. The present work deals with still about the nuances of the Brazilian prison system, its axiologycal aspects, and the peculiarities inherent in the intimate of relatives of imprisoned visit, in the various penal establishments in this country, in particular, in Bahia.
Keywords: Constitutional Principles. Prison System, Humiliating Body Searches
Sumário: 1. Introdução. 2. Princípios Constitucionais. 3 Digressão Histórica da Pena e da Prisão. 4. Revistas Corporais Vexatórias. 5. Considerações Finais. 6. Referências.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo versa sobre aspectos relevantes relacionados à garantia dos princípios constitucionais estabelecidos pela Carta Magna de 1988 que norteiam as ações humanas, sobretudo pela força interpretativa que estes exercem na produção de leis e decisões judiciais.
Este estudo traz como base a Doutrina do Direito Penal, Constitucional e
Administrativo, aliado ao que disciplina a lei acerca da persecução da pena privativa de liberdade em seus aspectos normativos, a exemplo da LEP – Lei de Execuções Penais, apoiado pela lavra de consagrados autores: Cesare Beccaria, Michael Foucault, Emile Durkheim, dentre outros. Visa desnudar a complexidade da visitação dos familiares e amigos dos encarcerados que estão sob a tutela jurisdicional do
Estado nos diversos estabelecimentos prisionais da Bahia, numa compreensão de afronta ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, vilipêndio explícito à manutenção do Estado Democrático de Direito.
Assim, o presente trabalho tem o viés indagativo sobre as nuances do cárcere em algumas questões que passam despercebidas, ou melhor, sem o devido entendimento social sobre a pena privativa de liberdade, numa perspectiva teórica de mudanças políticas, sociais e estruturais à consecução de uma coletividade, que seja encarada de forma mais consciente e menos agressiva aos Direitos Humanos.
2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
As ações humanas no mundo jurídico são consubstanciadas pelo respeito aos princípios constitucionais, os quais norteiam as decisões inerentes aos fatos e sopesam na medida em que são confrontadas com as regras em cada caso concreto, daí os legisladores organizarem suas ideias na produção de leis e os magistrados na prolação de sentenças com ênfase nos princípios.
Avocar os princípios constitucionais é estudar a ciência e conhecer a fundo a base da própria ciência, sua formação e evolução, para que as situações geradas no seio social tenham amparo principiológico. Para o doutrinador Cretella Júnior, o vocábulo princípio, na linguagem corrente, tem o sentido de “aquilo que vem antes de outro”, “origem, começo”, “momento em que se faz uma coisa pela primeira vez”.
“Princípio contrapõe-se a fim, assinalando marco inicial, no tempo e no espaço”. A Professora Fernanda Marinela conceitua o princípio como proposições básicas, fundamentais, típicas, que condicionam todas as estruturas e institutos subsequentes de uma disciplina. São os alicerces, os fundamentos da ciência e surgem como parâmetros para a interpretação das demais normas jurídicas.
A importância de clamar pela aplicabilidade dos Princípios Constitucionais está diretamente adstrito à manutenção do Estado de Direito, em que o poder punitivo deste esteja consubstanciado aos seus valores, sem que haja descompasso na produção de leis, decisões judiciais e medidas administrativas.
Nesse diapasão, o presente trabalho visa demonstrar a responsabilidade do Estado por Atos Administrativos, conforme textualiza o art. 37 § 6° do Constituição Federal:
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Portanto, o mandamento constitucional é explicito acerca da responsabilidade do Estado; então pergunta-se: o Agente Público que realiza a revista corporal está cometendo algum dano moral à pessoa do revistado? O Agente Público estaria agindo com dolo, culpa ou simplesmente cumprindo seu dever funcional? Merece destaque aferir se o agente público está prestando um serviço essencial à manutenção da segurança nos estabelecimentos prisionais, sem que possa declinar desse mister.
Nesse sentido, pela forma ortodoxa de revista corporal, vários visitantes
queixam-se de desrespeito em razão de não ter cometido delito e ter que passar pelo constrangimento em inspeções realizadas em seu corpo.
Sobre as atividades desenvolvidas pelo agente, não nos parece que o
servidor público esteja agindo com dolo ou culpa, entretanto realça-se a
responsabilidade objetiva do Estado no tocante a evidências de atos comissivos, ou seja, comportamento positivo deste.
Corroborando com o tema, o mestre Celso Antônio entende que no caso em tela ocorre a “omissão, rigorosamente falando, não é causa de dano, conquanto seja certo que condiciona e irresistivelmente sua ocorrência nos casos em que, se houvesse a ação, o dano seria evitado”.
Na mesma linha de raciocínio é bom frisar os ensinamentos de Oswaldo
Aranha Bandeira de Mello:
(…) que a regra em nosso direito constitucional é a responsabilidade
objetiva para os comportamentos comissivos do Estado e, salvo casos
excepcionais, responsabilidade subjetiva (por culpa do serviço), para os
comportamentos omissivos: a saber, quando o Estado devendo legalmente agir para evitar um dano e podendo fazê-lo não o fez ou não o fez tempestivamente ou eficientemente.
A professora Zanella Di Pietro (1998) traz a lume sobre a responsabilidade objetiva, vejamos:
(...) que se trate de pessoa jurídica de direito público ou de direito
privado prestadora de serviços públicos (ou seja: fundações, empresas
públicas, sociedades de economia mista e permissionárias/concessionárias); que haja dano causado a terceiros em decorrência da prestação de serviços públicos (nexo entre causa e efeitos); que o agente, ao causar o dano, aja nessa qualidade, ou seja, no exercício de suas funções.(......)
Nota-se que os autores apontam para o dever do Estado na prestação de serviço público, devendo este agir em nome da legalidade para evitar danos, em que os atos administrativos realizados por entes públicos são passivos de sofrer sanções em face aos desrespeitos às leis constituídas, bem como responder pelos danos causados por seus agentes, ainda que possa avocar ação de regresso.
Neste contexto, é inexorável destacar o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, preceito constitucional que se aplica ao assunto estudado, na certeza de que fora insculpido em nossa Carta Magna, no Título I, art. 1º, III, para balizar os valores sociais e frear quaisquer ações que venham agredir o ser humano, independente de sua casta social, consubstanciado, é claro, em Tratados Internacionais que ao longo da história vem cristalizando esse Princípio como importante conquista da sociedade.
No tocante ao assunto, vejamos as considerações de Ingo Wolfgang Sarlet:
[...] temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e
distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste
sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.
No mesmo entendimento afirma Chaves Camargo:
[...] pessoa humana, pela condição natural de ser, com sua inteligência e possibilidade de exercício de sua liberdade, se destaca na natureza e
diferencia do ser irracional. Estas características expressam um valor e
fazem do homem não mais um mero existir, pois este domínio sobre a
própria vida, sua superação, é a raiz da dignidade humana. Assim, toda
pessoa humana, pelo simples fato de existir, independentemente de sua
situação social, traz na sua superioridade racional a dignidade de todo ser.
Vê-se que os doutrinadores enfatizam acerca da razão, liberdade individual, respeito, bem como outros valores sociais intrínsecos à participação do indivíduo em sociedade, focado em concepções lógicas de sobrevivência coletiva, nas condições ideais.
Contribuindo com o tema, Rizzatto Nunes considera a Dignidade da Pessoa Humana como sendo um “supra princípio constitucional, entendendo que se encontra acima dos demais princípios”. Ainda afirma: “dignidade é um conceito que foi sendo elaborado no decorrer da história e chega ao início do século XXI repleta de si mesma como um valor supremo, construído pela razão jurídica”.
Diante dessas premissas, conclui-se que Princípios Constitucionais são os sustentáculos teóricos que disciplinam a conduta humana, sobretudo porque representam um inexorável vetor concernente à aplicação das normas, a consecução do bem estar social e a manutenção do Estado de Direito.
Dito isso, para melhor compreender acerca da especificidade deste trabalho, adentraremos agora no ramo do Direito Penal, mas precisamente no universo prisional, em especial, à execução da pena privativa de liberdade que, indubitavelmente, é um dos principais assuntos da atualidade e, portanto, composta de nuances e desafios.
Assim, antes de esmiuçarmos o tema em voga sobre as peculiaridades da prisão, perpassaremos por um breve contexto histórico da pena como punição, em que as “chagas sociais” eram “curadas” pela força, por imposições cruéis com o propósito de combater o mal cometido.
3 DIGRESSÃO HISTÓRICA DA PENA E DA PRISÃO
Apesar de haver alguns resquícios de sanções em períodos históricos
anteriores, a exemplo do Código de Manu, da Índia; a prova de Ordálio, no Egito; o juízo de Deus, dos povos bárbaros (germanos); a Lei da XII Tábuas do Direito Romano, é com o Código de Hamurabi que a punição começa a aparecer.
Por volta do século VIII, já com o surgimento do Direito Canônico, o delito passa a ser visto como um pecado contra Deus. A Igreja Católica detinha poder absoluto na época. As penas tinham um caráter de reconciliação com o divino, eram aplicadas sanções como: censura, excomunhão, trabalhos forçados e outros meios de torturas para se obter a confissão. Exemplos disso eram práticas como afogamento, estrangulação, esquartejamento, arrastamento, tortura na roda,
arrancamento das vísceras e enterramento em vida, sem contar com as mortes de pessoas queimadas na fogueira, no período da santa inquisição.
A pena imposta no início da Idade Média tinha a visão de segregar o pecador, expiar o mal, obter penitência. A prisão não era propriamente uma pena, mas sim uma forma de segregação cautelar para que o suposto penitente aguardasse a sanção que lhe seria aplicada, em regra, penas corporais.
Nessa época, a classe dominante punia com rigor as pessoas que
transgrediam as leis constituídas formuladas pelo príncipe. Esse pensamento era de toda a Europa Ocidental, onde a pena era aplicada de forma desproporcional ao delito, com requintes de dor e crueldade.
O mestre Aníbal Bruno faz comentários acerca desse período denominando de absolutismo do poder público, vejamos:
[...] com a preocupação a defesa do príncipe e da religião, cujos interesses se confundiam, e que introduziu o critério da razão de Estado no Direito Penal, o arbítrio judiciário, praticamente sem limites, não só na determinação da pena como ainda, muitas vezes, na definição dos crimes, criavam em volta da justiça punitiva uma atmosfera de incerteza, insegurança e justiçado terror.
Fatos como estes ensejaram diversos pensadores a questionar os modelos de punições, constituindo o período humanitário e apontando novos rumos para o Direito Penal.
Césare Beccaria, o Marquês de Beccaria, por sua vivência empírica com o regime prisional, escreve uma de suas importantes teses, “Dos Delitos e das Penas”, com críticas contundentes sobre essa época, além de filósofos, juristas e moralistas, como: Jeremias Benthan, Emannuel Kant, Friedrich Hegel, Michael Foucault etc.
Para Foucault, “o suplício repousa na arte quantitativa do sofrimento. Mas não é só: esta produção é regulada. O suplício faz correlacionar o tipo de ferimento físico, a qualidade, a intensidade, o tempo do sofrimento com a gravidade do crime, a pessoa do criminoso, o nível social de suas vítimas”.
Na busca pelo controle das ações humanas, baseada na segregação do
indivíduo, surgem as prisões em Londres, Bridewell, como casa de correção para mendigos e vagabundos. A partir daí, assiste-se ao desenvolvimento do sistema pensilvânico, aurbuniano e progressivo. Até o ano de 1340, eram encontrados na legislação portuguesa resquícios da vingança privada, salientando que esse direito era positivado nas leis visigóticas ou revindicta, transmitido aos herdeiros como forma de retribuir o mal causado.
Essa forma de punir só foi abolida com a vitória política de D. Afonso IV, que fez importantes mudanças políticas para banir as crueldades da época.
No Brasil, após a chegada dos portugueses na época colonial, constatou-se que não existia nenhum direito escrito. As relações se davam pelos costumes e tradições, sendo raras as formas de coações para reparar o “mal”. Durante toda a metade do século XIII até o século XV, leis importantes foram aprovadas em Portugal, tendo forte influência nas legislações brasileiras.
Com o surgimento das ordenações Manuelinas e Filipinas, vigorou no Brasil a parte criminal, e só bem mais tarde, em 1830, com o advento do Código do Império, essa situação de justiça privada e vingança foi aos poucos banida. Nesse período, que vai do Brasil Colônia à República, muitas atrocidades aconteceram a exemplo da morte de Tiradentes, acusado de crime de lesa-majestade, que fora enforcado e teve seu corpo mutilado e exposto para o público de Vila Rica, em Minas Gerais.
Faz-se necessário frisar que só no ano de 1890, com o surgimento do regime penitenciário, é que a pena passa a ter um caráter correcional, ou seja, corrigir e reparar o mal cometido, além do processo de reeducação, ou melhor, ressocialização do indivíduo infrator.
Agora, o indivíduo passa a ser privado de sua liberdade e de suas condições “normais” de vida cotidiana. A prisão é o seu “lar”, onde, inclusive, passará a receber seus cônjuges, familiares e pessoas que gozam de seu afeto.
4 REVISTAS CORPORAIS VEXATÓRIAS
Convém abordar o quão é “problemático” o ingresso de familiares e amigos no sistema prisional brasileiro. Pais, filhas, filhos, netas, sobrinhos, irmãs, esposas, amigos e amigas adentram aos presídios e penitenciárias, cotidianamente, na tentativa de confortar (suavizar a pena) de seus entes encarcerados. Entretanto, diante do modelo atual ultrapassado, estas pessoas enfrentam situações desconfortáveis, em que sua dignidade é ferida com as revistas corporais.
O artigo 5º, inciso XLV da Constituição Federal, preceitua que “nenhuma
pena pode passar da pessoa do condenado....”. A hermenêutica deste artigo visa garantir a aplicabilidade da sanção penal, sem que sua execução recaia sobre quem não cometeu qualquer delito. É imprescindível também frisar que a Lei 7.210/84 – LEP - Lei de Execuções Penais, art. 41, inciso X, preconiza - “ao preso deve ser concedido o direito à visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados”.
Observa-se que a legislação infraconstitucional brasileira dá ênfase à
participação da família no ambiente carcerário, pois revela que o tratamento desumano, a vingança penal, cedeu espaço à dignidade da pessoa humana. Outrossim, o Estatuto Penitenciário do Estado da Bahia, Decreto Nº 12.247 de 2010, consigna no mesmo entendimento.
Sabe-se que esse método de revista corporal é ortodoxo e vai também na contramão ao quanto estabelecido na Declaração Universal dos Direitos Humanos que veda qualquer tratamento degradante, desumano, e a submissão do cidadão a práticas que devassem sua honra. Isto constitui, em verdade, uma grande encruzilhada que digladia o princípio da dignidade da pessoa humana.
Esta revista vexatória tem gerado situações de desconforto e indignação, pois os familiares precisam tirar suas roupas, tendo seu corpo totalmente inspecionado pelo agente público responsável em manter a ordem pública nas prisões. Visitantes e servidores são expostos a este conflito, uma vez que a revista “precisa ser feita
minuciosamente para garantir a segurança da unidade”.
Nessa seara, faz-se necessário mencionar a argumentação do Estado que “vários visitantes são flagrados tentando adentrar ao presídio com armas, drogas e celulares, muitos destes objetos estão escondidos nos órgãos genitais, por isso a revista precisa ser efetuada, justifica-se”?
Vejamos alguns acontecimentos de flagrantes nas unidades prisionais:
Itabuna: Jovem é presa durante revista no presídio com drogas na
vagina. Uma jovem foi presa nesta quarta-feira (29) após tentar entrar no Conjunto Penal de Itabuna, no sudoeste do estado, com drogas na vagina.
Segundo informações do site Radar Notícias, Shirley Jesus de Carvalho, 21 anos, foi flagrada durante a revista do presídio. Uma agente prisional
encontrou um pacote de maconha embalada em papel alumínio e dentro de um preservativo. A droga pesava 50,17g. Shirley foi encaminhada para o mesmo presídio, onde permanecera à disposição da Justiça. Ainda não se sabe para quem a suspeita levava a droga. A delegacia da cidade investiga o caso. (BN – Bahia Notícias, Samuel Celestino - Quinta, 01 de Março de 2012 - 19:20).(gn)
Visitante é presa com maconha em presídio do Rio - 03 de novembro
de 2005, 17h 56. Agentes Penitenciárias do Complexo Penitenciário de
Gericinó, zona oeste do Rio de Janeiro, prenderam em flagrante, no início da tarde de hoje, Valéria da Silva Oliveira, 33 anos. A visitante escondia nas partes íntimas cerca de 250g de maconha e um carregador de telefone celular. Valéria estava acompanhada da filha de 9 anos e iria visitar o irmão, Welington da Silva Oliveira, de 28 anos, preso desde junho deste ano na unidade por tráfico de drogas. Ela foi encaminhada para 34º DP (Bangu), onde será autuada por tráfico de drogas. (noticias.terra.com.br – Jornal do Brasil).(gn)
Esplanada: Mulher é presa ao tentar entrar em presídio com
droga: Uma jovem de 21 anos foi presa em flagrante ao tentar entrar no
Presídio Regional Rui Penalva, localizado em Esplanada, no nordeste
baiano, com quase 100 gramas de maconha na genitália. A cabeleireira
Erdilândia dos Santos Souza, conhecida como Galega, permanece à
disposição da Justiça, na Delegacia Territorial do município, para onde foi conduzida. Ela pretendia entregar a droga ao companheiro, interno no presídio, durante uma visita íntima. De acordo com o delegado titular, Clécio Pimenta Bastos Filho, quando Erdilândia passou pelo detector de metal com os entorpecentes, o sistema de alarme foi acionado. Antes que fosse submetida ao exame ginecológico, a acusada confessou a uma agente penitenciária que estava com a droga - (BN – Bahia Notícias, Samuel Celestino - Quinta, 24 de Maio de 2012 - 16:30). (gn)
Como se observa, vários visitantes são flagrados tentando adentrar com
drogas, celulares ou outros objetos nos presídios, o que reforça a importância do tema na busca por uma solução que atenda aos anseios do Estado no efetivo dever de prestar a segurança à sociedade, bem como a efetivação da garantia dos preceitos constitucionais concernente à dignidade da pessoa humana. Poder-se-ia, relatar diversos problemas acerca da revista corporal abordando os fatos e as complicações inerentes a este trabalho, principalmente os conflitos entre servidores
e visitantes.
Na busca pela conscientização, os Assistentes Sociais e Psicólogos que
laboram nas unidades prisionais, responsáveis pelas entrevistas com os familiares e amigos dos encarcerados, têm se esforçado em disciplinar sobre esses fatos relatados, entretanto ainda não tem surtido o efeito esperado em virtude dos constantes flagrantes já citados.
Alguns Estados da Federação vem buscando meios tecnológicos visando
encontrar uma solução para este problema. O Scanner Corporal é apontado como uma viável solução para este problema, uma vez que possibilita identificar objetos estranhos à segurança que esteja no corpo de quem pretenda adentrar à visitação.
A adoção dessa ferramenta propiciaria melhor agilidade no processo de revista, respeito aos visitantes, bem como a aplicabilidade dos preceitos constitucionais, em especial, aos Direitos Humanos. É importante frisar que o método não é barato, mas o benefício social é inquestionável.
O ideal, fato que já ocorre em unidades prisionais mais modernas, é a
visitação acontecer em parlatórios (espaços de convivência reservados para visitantes) e a revista corporal ser efetuada na pessoa do preso após o término do convívio social. Dessa forma, evitar-se-ia o desconforto moral ora mencionado, além do melhor cumprimento da execução penal.
A escola criminológica do etiquetamento social aponta que o cárcere por si só não ressocializa, ao contrário, reforça estigmas que aderem à personalidade do condenado, tatuando-o socialmente de tal forma que torna difícil para o egresso se desvincular da vida carcerária. Essa assunção de estigmas é apropriada, segundo Goffman, na era “Manicômios, Conventos e Prisões”, por meio das “cerimônias
degradantes”, que macula o preso em um “homem institucionalizado”, ou seja, identificado com a Instituição que o mantém encarcerado.
O professor Alessandro Baratta, reforça esse entendimento quando afirma que a: prisão se caracteriza por dois processos complementares: um processo de desculturação em face da sociedade com redução da vontade, perda de senso de responsabilidade, formação de imagens ilusórias da realidade e distanciamento progressivo dos valores sociais, e um processo de aculturação em face da prisão, com absorção de valores e adoção de modelos de comportamento próprios de subcultura carcerária.
Ele afirma que o criminoso assume um papel de “bom preso”, com atitudes de conformismo e oportunismo, ou assume o papel de criminoso da comunidade carcerária, com poder sobre “recursos” e culto à violência ilegal.
Emile Durkheim, em “As Regras do Método Sociológico”, descreve o crime como um “fato social e não patológico”. No entanto, afirma que não está isento de se tornar uma doença social; basta que o índice de criminalidade atinja níveis elevados.
Nesse raciocínio, Durkheim aponta que o crime é algo normal e presente em todas as sociedades. “... um ato é criminoso quando ofende os estados fortes e definidos da consciência coletiva”.
Observa-se que Durkheim, numa visão do século XIX, e Baratta com o
pensamento contemporâneo do século XXI, trazem debates convergentes inerentes ao crime, ambos colocando em xeque o modelo de sociedade em que vivemos, num processo necessário de transformação desta.
Essa “cerimônia de degradação”, a submissão dos visitantes a inspeções
corporais, nada mais é do que elemento reforçador destes estigmas, mantenedor de estereótipos, de modo que o cumprimento da pena é expiado não só pelo preso, mas também por sua família, ultrapassando assim, de forma indireta, à pessoa do condenado.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
À luz dos preceitos fundamentais, em virtude do aprimoramento social ao longo da história, o homem vem tomando consciência e canalizando suas atitudes em respeito à dignidade da pessoa humana, minimizando os limites do jus puniendi para que não se puna em função das causas, mas com o olhar sistemático acerca das consequências, sobretudo porque estes fatos fazem parte do contexto social, onde o fator crime é apenas parte dele.
É preciso perceber que o Sistema Prisional perpassa por novos desafios, urge de procedimentos hodiernos que sejam capazes de identificar e demonstrar a necessidade de mudanças, quebras de paradigmas, pois, numa compreensão lógica dos fatos exaltados por pensadores da nvergadura de Beccaria, Durkheim, Weber, Marx, dentre outros que, numa visão mais aprofundada dos valores cultivados em sociedade, apontaram caminhos à implantação de políticas públicas para atingir uma reação social.
Como bem descrito neste trabalho, não se pode vendar os olhos a esta
problemática, uma vez que há uma compreensão de desrespeito ao Direitos Humanos e as normas estabelecidas. Sustentar a bandeira da segurança pondo em xeque à aplicabilidade dos princípios é, no mínimo, impor que a segurança pública prisional deva ser “garantida a qualquer preço”.
Indubitavelmente, esse embate dialético preme por novas medidas que
aprofunde estas discussões em torno das consequências morais, psicossociais e afetivas daqueles que estão diretamente envolvidos na inspeção corporal, seja ao agente público executor das revistas íntimas, ou a quem se submete.
Mediante ao exposto, conclui-se que o Sistema Prisional caracteriza-se por diversos paradoxos, pois, se por um lado é preciso garantir a segurança das unidades prisionais, por outro é inderrogável o arbitramento dos Direitos Humanos como conduta norteadora à execução de pena privativa de liberdade, além de elo indispensável à manutenção do Estado de Direito e da ordem social vigente.
Luís Antônio N. Fonseca
Agente Penitenciário/Assessor Especial da SEAP/Ex - Superintendente de Assuntos Penais-SJCDH/Bacharel em Direito/Especialista em Direito Público e Segurança Pública e Doutorando em Ciências Sociais e Jurídicas. Email: fonsecalan@yahoo.com.br
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