Foto - Poluição da Usina Termelétrica

POLO NAVAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL - PARTE 2

Dando seguimento ao artigo da terça passada (que pode ser acessado na página do jornal da Internet) podemos pensar, a partir dos pressupostos estabelecidos, o que o Polo Naval em fase de instalação vai exigir de Charqueadas em termos de desenvolvimento sustentável. Antes, porém, um salutar resgate histórico do desenvolvimento da cidade e seus efeitos no meio ambiente.

O primeiro ciclo de desenvolvimento econômico e tecnológico de Charqueadas foi o da indústria do charque, justamente o que denomina a cidade. Por volta de 1753 já existiam charqueadas no baixo Jacuí (Benedito Veit, 2008). Em 1821 e em 1834, respectivamente, Auguste Saint-Hilaire e Arséne Isabelle, navegando pelo rio Jacuí, identificaram vários estabelecimentos do ramo na margem direita, no local onde hoje fica a cidade (Saldino Pires, 1986). E esse foi o ciclo de desenvolvimento que menor dano causou ao ecossistema local. A não ser pelo terrível mau cheiro e proliferação de moscas, apontados por Saint-Hilaire.
Pois foi daí que começou (e continua) a cidade, pelo rio, devido a sua localização estratégica como ponto de transporte fluvial a atrair indústrias. A pesca, até hoje, é artesanal e de subsistência, nunca teve predominância econômica significativa. Em 1920, conforme Veit, não mais existiam charqueadas na região.

Em 1956 temos o marco de outro ciclo de desenvolvimento econômico e tecnológico da cidade, com a inauguração do Poço Otávio Reis, num grande acontecimento econômico gaúcho, como atestam as presenças do então governador do Estado Ildo Meneghetti e de vários secretários estaduais. Era mina de extração de carvão mais profunda da América Latina, com quase 300 metros de profundidade. Para vocês terem a noção do significado do empreendimento no imaginário desenvolvimentista da época, saibam que até a miss Brasil desceu de elevador ao fundo da mina! Mas de macacão e capacete, sem vestido insinuante ou maiô, para alegria pouca dos mineiros suados e pretos de carvão.

Já aqui começam os danos de grande porte a natureza. A própria extração do carvão mineral já é uma atividade essencialmente danosa ao meio, foi assim em todo o lugar desse planeta onde ela ocorreu. Todas as pessoas na faixa dos 40 anos lembram dos fedidos e intermináveis morros de carvão despejados a céu aberto, por toda a cidade, locais onde a gurizada adorava brincar, seja nos "laguinhos" formados pela água da chuva entre o negrume dos morros, seja catando o “ourinho dos trouxas”. Nesse contexto foram instaladas, atreladas ao “polo carvoeiro”, a Termelétrica de Charqueadas (1962) e a Aços finos Piratini (1973), sendo a última inaugurada pelo presidente Emílio Médici e pelo governador Euclides Triches, sem a presença de misses, mas com grande quantidade de soldados do III Exército.

Mais desenvolvimento econômico e tecnológico e ampliação da degradação ambiental. Agora eram o solo, o ar e a água em martírio ecológico. “Estou sentido o cheiro da poluição, estou sentindo o cheiro do pó de carvão” – dizia a letra do compositor charqueadense Hermes Fagundes, na década de 1980, cantada por Paulo Ricardo Rebelo. Carvão por toda a cidade e a poeira do mesmo saindo das chaminés e depositando-se nos pulmões dos moradores (antes as vítimas eram só os mineiros que “desciam a mina”) e no fundo do amado e judiado rio Jacuí, que nunca mais foi o mesmo. Perguntem aos charqueadense maiores de 60 anos como era bom (e possível) tomar banho do rio nos anos 50, 60 e 70 do século passado...

Na próxima terça, vamos ver as realidades presente e futura sob a luz do embasamento teórico e do resgate histórico já realizado.


Texto publicado no jornal Portal de Notícias em 04.09.2012
http://www.portaldenoticias.com.br/Colunas/jo%E3o/index/jo%E3o.htm