Esta luta estéril

Na noite do último sábado, ao passar na rua, deu até tristeza quando vi a meninada toda uniformizada, todos iguaizinhos, vestindo camiseta preta com logotipo do Jabuka Fight, em grupos animados. Dirigiam-se para o Ginásio de Esportes, as pobres ovelhinhas. O que me dá alguma esperança é ter noção de que esta molecada, quando crescer, vai se dar conta do quanto foi ridículo ter dado atenção a estas porcarias.

Nada contra um adulto acompanhar estas lutas. Nada contra o sujeito abrir uma cerveja, sentar-se à TV ou numa arquibancada e gargalhar, assistindo aos galos de briga humanizados massacrando-se. O problema é o acesso excessivo e fácil dos mais novos a este tipo de conteúdo, sem qualquer supervisão.

E lá vão educadores e pais - aqueles com algum miolo - tentarem reverter a situação. Para tanto, dão conselhos a respeito das mazelas da violência e abraçam os pequenos, elogiando-os quando estes praticam gestos de solidariedade e gentilezas aos amiguinhos.

Mas nos recreios das escolas, na hora da saída e mesmo nos momentos de passeio com a família, o que de fato observo são miniaturazinhas lobotomizadas de lutadores de MMA, tais quais os bonequinhos vendidos junto com o ringue nas lojas de brinquedo. Estes praticam com outros garotos - não só da mesma idade, mas menores também - a coreografia dos golpes que viram durante o show.

E quando o garoto passa dos quinze e continua gostando dos "fights" mundo afora, aí, meu amigo, a situação fica mais séria. A não ser que este indivíduo seja pipoqueiro, lutador, jornalista, fotógrafo, sorveteiro, organizador ou qualquer outro tipo interessado no lucro ou na repercussão do acontecimento. Para estes, pouco ou nada importa os efeitos colaterais do suposto esporte.

Vamos lembrar o que tem acontecido em Jaboticabal. Na palestra do escritor Menalton Braff, na feira literária, havia dez pessoas. Os concertos da comemoração do centenário da Gomes & Pucinni e da Orquestra Sinfônica Jovem de Tatuí, ambos gratuitos, não lotaram o Cine Teatro. Na noite da exibição da sensacional peça "As coisa tem o valor que nóis dá pra elas", os funcionários da Cultura tiveram que se desdobrar para arranjar ônibus, ir às escolas, trazer alunos e formar público, para a peça não ser cancelada. Já o festival de pancadaria "ferveu". Imagino guris sacrificando suas mesadas e outros implorando aos pais pelo dinheiro do ingresso. Esta comparação mostra o que esta meninada dita "antenada", "precoce", "mais privilegiada que as gerações anteriores", "moderna" e "descolada" tem na cabeça.

Perguntem para estes guris que adoram o lutador "Silva", sobre outra pessoa de brasileiríssimo e comum sobrenome: Joaquim Barbosa. Será que este também representa um herói para eles?

A palavra "lutar" deveria ser ensinada, para esta geração, com ênfase nos significados mais importantes. Será que esta garotada está aprendendo a "lutar" por seus direitos? Vão lutar, como lutou o movimento estudantil da UNE, no fim dos anos sessenta, ou os caras-pintadas no início dos noventa? Sabem da importância de lutar pela saúde e bem-estar de seus semelhantes ou, no mínimo, de seus amigos? Vão saber ao menos o nome das pessoas com quem elas terão de lutar contra? Ou para estes jovens, "lutar" e "vencer" serão sinônimos apenas para coisas tão degradantes, vazias e inúteis quanto presenciar um adversário ir à lona por nocaute?