O VALE TUDO DO AMOR
Por Carlos Sena


 
Estar com alguém nestes tempos de facebook, de internet e de relações afetivas tão gasosas é motivo de comemoração. Principalmente se essa relação ultrapassa um ano de convivência, independente da forma ou da estrutura em que esteja estabelecida. Há quem diga que prefere estar sozinho a estar mal acompanhado. Depende. Mal acompanhado é muito intersubjetivo, principalmente se existe amor em maior ou menor grau. Isto mesmo: amor. Porque estar com alguém sem alguma forma de amorização aí sim, é melhor estar sozinho. O grande dilema do ser humano reside na solidão. Esta é dita e desdita pela nossa cultura que dificilmente terá condições de substabelecer formas similares de substituição. Algo como meia solidão. Impossível. Toda solidão é inteira, desde que estejamos falando da solidão de afeto – daquela em que nos sentimos assim porque não temos com quem dividir o cotidiano, nem a cama, nem o sexo, nem a sexualidade, nem as birras, nem... Podemos ter um milhão de amigos, mas eles não servem para que nossa solidão clássica se recomponha e deixe de ser. São relações distintas e complementares. Podemos ter a casa cheia de amigos, mas a cama vazia de afeto. Podemos ter a cama cheia de afeto, mas a casa vazia de amigos. Afinal, viver tem essas coisas, mas uma boa companhia, um bom caso, um bom casamento, que nome outro tenha, são fundamentais na vida. 
Há casamentos por aí que duram cinco, dez, vinte anos e mais. Questão de somenos importância. A vida não é definida em quantidade, mas em qualidade, principalmente o afeto. O ideal do afeto é a eternização dele, dado sua ação extenuante e libertadora capaz de levar aos céus ou aos infernos. Por isto para quem estiver de fora, considerando que um amigo vive uma relação doida, neurótica, etc., o melhor é entender. Não o amigo, mas o amor. Amor não é pra se saber, mas apenas para se entender. Entendê-lo nos faculta alguns dons que podemos utilizar bem esse produto tão complexo que é o amor. Entender o amor é sabê-lo revolucionário, senão seria um bolo de chocolate; entender o amor é senti-lo em seu efeito aerosol – tente pegá-lo e não conseguirá. Tente guardá-lo e não conseguirá. Há uma diferença entre o perfume no frasco e o aroma dele no ar. O perfume no frasco não é o amor, talvez a atração, o tesão. Quando ele vira perfume no ar, eis que se pode dizer do amor solto, livre, libertador. É essa a grande controvérsia do amor que só aos amantes se permite viver e saber, embora nem sempre. De fora, amigos e parentes tendem a se meter em nome do bem de um deles ou dos dois. Pode ser que dê certo, mas tem tudo para não dar em nada. Pior: nem tem efeito positivo, mas, algumas vezes tem negativo. 
As relações neuróticas se justificam em si. Mas a nós, de fora, não compete teorizar. Afinal, o que é o lado neurótico de uma relação? Principalmente se houver amor nutrindo os espaços vazios dos entes que vivenciam suas histórias de amor. Ou de humor. Mas se de um tipo ou de outro só eles tem que definir:  parar ou ir adiante? Por isto, deixemos que os amantes o sejam em plenitude. Se houver uma violência, perguntamos: há violência maior do que viver num país tão violento? Pelo menos a violência dos que se amam, se amam, é deles e foi por eles patrocinada. Como sabemos, “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”, ou seja, se viver o que se vive conscientemente. Há um risco? A vida é um risco que um dia vira traço na horizontal dos cemitérios. 
Portanto, o amor não cabe olhares externos nem arquibancadas desiludidas. Haja ilusão para os amores complicados e simples, porque sem ilusão a gente morre antes do tempo... Às plateias deixemos para palpitarem acerca do futebol. No amor, melhor ser feliz, beijar na boca sem se preocupar com sapinhos e pererecas... Portanto, se houver amor, não cabe o conceito de melhor sozinho do que mal acompanhado.