A Barbárie do Sistema prisional brasileiro.

Uma bomba relógio se estabelece hoje nos presídios brasileiros abarrotados de presos cautelares. A estimativa é de pelo menos 500 mil homens e mulheres presos aguardando o cumprimento de pena, ou mesmo serem sentenciados. Um exército sem causa sonhando todos os dias com a liberdade, mesmo forçada, traduzida em incontáveis rebeliões quase sempre tendo como resultado cenas de barbárie.

Quando o Estado não mata, por meio de sua Polícia para sufocar as rebeliões e tentativas de fugas, eles mesmos ( os presos) submergem-se num processo autofágico numa aparente luta pela autopreservação: matar para não morrer.

Estaria certo Thomas Hobbes no seu Leviathan quando defendia que a primeira lei natural do homem é da autopreservação que o induz a impor-se sobre os demais?

Para ele a vida seria uma guerra de todos contra todos, na qual o homem seria o lobo do homem.

No contexto de sua época Hobbes se referia à origem do Estado, mas numa linguagem moderna tal idéia se manteria atual se for considerado o atual momento pelo qual passa o sistema prisional brasileiro. São 500 mil homens ou mais, que um dia voltarão para a sociedade mais lobos do que homens.

Há poucos meses o mundo testemunhou em Pinheiro (MA) um fragmento da situação do nosso sistema prisional. Uma tentativa de fuga frustrada, na noite de uma segunda-feira, acabou numa tragédia que poderia ter sido evitada. Na rebelião os presos mataram e decapitaram seis colegas.

Pelo que se apurou os presos já haviam emitidos sinais de insatisfação por conta das péssimas condições da cadeia onde estavam depositados.

Tirando um, ou outro exagero, todas as reivindicações, antes do massacre, feitas pelos cautelados eram justas e previstas na Lei de Execuções Penais (LEP). O sistema fez ouvidos moucos, ignorou os lobos ali ergastulados e o resultado foi o que se viu, e que continua sendo mostrado para todo mundo via rede mundial de computadores. Cabeças separadas dos corpos entulhados no pátio da cadeia. Uma cena mais forte do que as de um filme de terror.

Recorrendo ao sempre atual Cesare Beccaria no seu Dos Delitos e das Penas , obra do século XVIII, este já definia as prisões como “horríveis mansões do desespero e da fome”, definição que bem pode ser aplicada ao caso de Pinheiro e dos demais presídios Brasil a dentro.

No nosso ordenamento jurídico contamos com uma lei, a Lei de Execuções Penais, que se fosse aplicada poderia pelo menos diminuir tensões como essa verificada na maranhense Pinheiro e que resultou naquela tragédia; mas como já dizia Beccaria, “nossos costumes e nossas leis retrógadas estão muito distantes das luzes dos povos”.

Em Pinheiro ficou patente a falência do nosso sistema prisional e o que é pior, em que pese às tentativas do legislador de modernizar nosso Código de Processo Penal na parte que trata das prisões cautelares com o objetivo de esvaziar as cadeias, a médio e longo prazo não se vislumbra uma solução, pelo menos paliativa para o enfrentamento desse problema. São 500 mil presos cautelares aos quais o sistema aguarda que se junte mais 350 mil, que é o número de mandados de prisão expedidos pela Justiça Brasileira, aguardando cumprimento.

CONCLUSÃO

O mais traumático nesse episódio de Pinheiro foi a frieza glacial como a sociedade maranhense o assimilou. Não houve comoção popular ou grandes manifestações; foi como se nada tivesse acontecido. A repercussão foi maior externamente do que nas quatro linhas do Estado. A sensação que ficou é a de que o mencionado massacre nada significou.

“O homem apenas é cruel por interesse, por ódio ou por medo” dizia Beccaria. No caso de Pinheiro percebe-se que se estabeleceram os três itens: interesse dos presos de chamar atenção para a situação de calamidade estabelecida na cadeia, o ódio do sistema e o medo de morrer.

O marquês de Beccaria num trecho da sua clássica obra talvez explique a frieza como a sociedade maranhense tenha absorvido esse episódio ao escrever que “ o coração humano não é capaz de sentimento inútil; todos os seus sentimentos são resultado das impressões que os objetos provocam sobre os sentidos”

As cenas de barbárie, dentro e fora das cadeias, tornaram-se tão triviais que, o quê sentia-se ontem, não se sente mais hoje.

Sem uma solução plausível para a crise no sistema prisional, nos presídios brasileiros o homem continuará a ser o lobo do homem fazendo prevalecer, a cada dia, o extinto da autopreservação que o autoriza a matar, decapitar e buscar constantemente a liberdade mesmo que forçada.

BIBLIOGRAFIA

Beccaria, Cesare. Dos Delitos e das Penas.Tradução de Torrieri Guimarães. Texto Integral. São Paulo, Martin Claret, 2000.

elson araujo
Enviado por elson araujo em 20/06/2012
Reeditado em 10/10/2013
Código do texto: T3734114
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