MATOU, ESQUARTEJOU E MORREU EM VIDA...


Por Carlos Sena

 
“As histórias todas são iguais. Eu apenas faço delas mais uma canção de amor, ou de dor (...)”. Este trecho de uma canção de Roberto é um pouco do que acontece com as histórias de amor – podem se transformar numa canção de dor. O assassinato do dono da YOKI , MATSUNAGA, mexeu com a opinião pública, como se fosse uma coisa do “outro mundo” ou como se isto não CONFIGURASSE apenas uma repetição de outras mortes, outros esquartejamentos. Talvez o que mais importe, neste momento, seja a lembrança (nunca será demais) daquele adágio popular: “o que dá pra rir, dá pra chorar”, pela certeza de que se há rima no amor há em sua dor...
Vemos em tudo isto a natureza humana em xeque. Há quase três mil anos depois de Cristo que tudo isto acontece, mas nós, modernos, nos aterrorizamos diante de uma mulher (ex-garota de programa) que conhece um homem em seu site de encontros, por ele se apaixona e foi correspondida, casam-se, têm uma filha, vivem um “conto de fadas” meio tupiniquim e tudo se acaba em tragédia – talvez num conto de “fodas”. Desse episódio a mídia explora tudo  e vai até a última gota de sangue. Mas se há jornais sendo vendidos, ibopes aumentados, certamente é porque a população adora saber de tragédia, principalmente quando ela envolve uma plebeia, ex puta que se casa com um “príncipe” meio sapo, mas príncipe, meio sem princípio, mas agora com fim trágico.
Essa tragédia recupera as relações afetivas tão cheias de poucas novidades, mas repetida em sua parte violenta, animalesca. A rigor toda relação entre homem e mulher ou entre pessoas do mesmo sexo, não têm no seu bojo novidades. Não se inventa modos de vida e qualquer um modo de vida é repetido em formas variadas, mas sem variação do seu “status quo”. Dito diferente: a vida do vizinho sempre parece ser melhor que a nossa, mas não é. Nas relações afetivas tudo se repete, inclusive quando nada se repete e a mesmice começa incomodar os entes. Talvez seja esta a grande “novidade” se é que podemos falar em novidade: as relações também terminam! Mas nós, modernos, sempre achamos normais quando a TV queima e a gente logo a substitui por outra; quando outro bem material chega ao seu fim, a gente, imediatamente, se desfaz dele. A nossa cultura só não nos “treinou” para a separação afetiva. Talvez o que mude seja o aspecto físico, material, posto que não vimos a relação, nem tocamos nela, apenas a vivemos e sentimos...
O ser humano precisa entender que tudo termina. Não deve querer para si uma relação eterna numa vida passageira. Contudo, esse “elixir” miraculoso que nos leve a sair de um relacionamento sem arranhões ainda não foi descoberto. Sempre que duas pessoas se separam uma delas sofre mais que a outra, principalmente quando um mau começo se estabelece. Sair de um relacionamento afetivo não basta apenas querer. Requer competência dos entes no que concerne às responsabilidades do casal. Essa competência passa pela certeza de que “ninguém é de ninguém e na vida tudo passa”, até quem nos abraça... Competência que perpassa pelo modo de vida, pela história de cada um. Nesse caso da morte e esquartejamento executado por Elize, pesa o fato de ela ter sido pobre e garota de programa, retirada das ruas pelo dono da YOKI. Nem mesmo sua formação em Direito, adquirida durante a relação com o empresário, serviu pra ela ter uma conduta de viver sua vida sozinha, refazê-la do seu jeito, posto que a relação estivesse rompida com o aparecimento de uma amante... A ironia disto, ao que tudo indica é que Elize experimentou do seu próprio veneno: quantos homens ela já não teria “tomado” de outras mulheres e agora o seu havia sido tomado por outra. O feitiço não teria virado contra o feiticeiro?
Fato é que vivemos a tragédia humana de existir com pouco conhecimento da nossa própria natureza. Em sendo isto verdade, a grande contradição é que muitos se realizam nessa miséria, nessa tragédia repetida sempre desde que o homem é homem e que a mulher coabita com ele nos processos de afetividade... Esse é mais um momento que nos leva a reflexão. Certamente tem gente por aí vivendo momento parecido. De repente, podemos ser o “grito que salva a boiada” e, desta forma, evitarmos que alguém morra em vida cometendo idêntico homicídio, talvez esquecendo que “há fila enorme esperando para andar” ou que gente é como o trem “vai uma e vem cem”...