RACISMO?
No Brasil tem racismo? Essa é uma pergunta que diariamente se repete, como é repetida a sua resposta: sim. Talvez não haja mais de maneira tão escancarada, afinal, racismo é crime inafiançável, e ninguém quer ser preso por causa de um negro. O fato é que a lei não mudou o pensamento da sociedade em relação a esse povo que tem a pele mais favorecida de melanina.
Em 1888, quando a princesa Isabel assinou a lei que abolia a escravidão, pensou-se que tivesse feito um bem enorme aos escravos, que, aliás, até hoje comemoram essa data por meio de seus descendentes. Eles se livraram da escravidão, mas, até hoje não são livres. Na época, saíram de sua condição de escravos, sem a mínima condição de se estabelecerem na sociedade. A única posição que tinham, era a de escravos. Fora disso, não eram ninguém. Tiveram que se amalgamar às margens, vivendo em situação precária. Então, além de ninguém, ainda eram marginais.
O reflexo de tudo isso, hoje, é que muitos ainda pensam que negros são marginais, ou, que são ninguém. A maioria da população carcerária é de negros. A maioria da população das favelas é de negros. A minoria dos que possuem uma condição econômica mais elevada é de negros. A minoria dos que ingressam em cursos superiores é de negros. Pare-se por aqui, e reflita-se um pouco diante dessa realidade que se apresenta: o racismo não se justifica. Porém, o fato é que essa situação precária e desigual em que a maioria da população negra ainda se encontra, alimenta esse racismo. De certa forma, essa situação dá subsídios para que se dissemine a ideia de que os negros pertencem a uma classe inferior.
Uma questão que se levanta é: como mudar esse quadro? Com cotas raciais nas universidades? Com cotas de emprego nas grandes empresas? Refletir-se-á sobre essa questão mais na frente. Agora, suscitou-se refletir sobre o termo raça: existe raça negra? Ou branca, amarela, parda...? Na verdade, não. Existe a espécie humana, com variações de características meramente estéticas. Todos são racionais, bípedes, onívoros, com a necessidade de alimentar-se, beber água, procriar-se, etc. Por isso, tão pouco existem raças inferiores ou superiores. Do ponto de vista sociológico, não importa se o indivíduo é preto ou branco. Importa é que todos são humanos e fazem parte de uma mesma humanidade.
Já pôde-se perceber, no entanto, que essa conceituação errônea de dividir humanos em raças, não foi o que preponderou para a discriminação, mas, sim, a cultura da marginalização. Aliás, no Brasil, um país de pessoas tão miscigenadas como é, não poder-se-ia determinar, mesmo, essas raças. Salvo poucas exceções de estrangeiros ou descendentes puros de estrangeiros, não se pode falar de brasileiros brancos, negros, ou amarelos, puramente. Volte-se então para a questão suscitada anteriormente: como mudar esse quadro discriminatório e marginalizante?
Em primeiro lugar, é preciso reconhecer o problema. Afinal, muitos ainda acreditam no “mito da democracia racial” no Brasil. Há racismo, há discriminação, há desigualdades, há marginalização. Em segundo lugar, é preciso perquirir a origem do problema. Os escravos nunca foram libertos. A situação de marginalidade e precariedade com que começaram suas vidas depois da escravidão, perpetua-se até hoje. Os negros ainda são escravos do sistema perverso que vige na sociedade. É preciso entender, então, que esse é um problema “socioeconômicocultural”. Assim, a “solução” deverá abranger esses três aspectos: social, econômico e cultural. Em terceiro lugar, é preciso agir. Chegou-se, então, no ponto culminante.
Ninguém nasce sabendo de nada. As pessoas vão formando suas ideias com base no que lhes é demonstrado por aqueles com quem convivem, ao longo da vida, sem muitas vezes se darem conta. Uma vez uma garota, de pele branca, e olhos azuis, disse que, quando criança, chamava o seu amigo “colorido” para brincar. Esse amigo era negro, por isso o termo “colorido”, usado inocentemente por uma criança que só queria divertir-se com outra criança. Isso não pode se perder. Essa é a mensagem que deve ser ensinada para as crianças, desde a mais tenra idade. Se a criança, adolescente, se forma com essa ideia de que o outro é igual a ele, apenas de outra cor, começar-se-á a resolver o fator cultural.
Do ponto de vista das ações sociais afirmativas para a inserção social do negro, tais como as cotas, tem-se um certo problema. Por um lado, facilita-se, ou força-se a inserção do negro em lugares fundamentais em que ocupam poucos espaços. Essa ocupação é positiva. Porém, artificial. São números, mas, não há mudanças socias plenas. As ações afirmativas por parte do Estado devem afetar o problema estrutural. Objetivamente, tem-se que tirar o negro da sua condição de marginalidade, dando condições de que ele tenha uma vida digna, e possa buscar a sua ascensão social de maneira natural. Só então haverá legitimidade nessa ascensão, e reconhecimento por parte da sociedade.
A conclusão a que se chega é que o problema existe, é complexo, e demanda tempo para ser “resolvido”. E, principalmente, ação. Não só do poder público, mas, de toda a sociedade. É preciso que cada um comece a se indagar em relação a essa questão: “Existe racismo?”; “Será que eu sou racista?”; “Por que eu sou racista?”. A partir do momento em que as pessoas tomarem consciência do problema, e de sua posição em relação ao problema, começará a ficar mais fácil de enfrentá-lo! Enquanto isso, fica-se divagando: “Racismo, isso existe?”.