IDOSO: NOSSO ALARMANTE "PASSIVO SOCIAL"

OPINIÃO:

O mundo contemporâneo passa por intensas e aceleradas transformações sociais, não apenas nas visões holísticas, naquelas que incluem a mudança do pensamento coletivo e do enfrentamento da espiritualidade, não discuto nesse caso holístico se nos transformamos para melhor ou para pior, fato é que socialmente avançamos “ materialmente” no tempo, transformações tantas, todas elas alicerçadas na agregação do desenvolvimento científico das amplas áreas do conhecimento e principalmente da atual revolução informática.

É mais do que sabido e divulgado que a perspectiva de vida aumentou em todo o planeta, principalmente nos "países em desenvolvimento" dos quais o Brasil se insere com bons índices teóricos mas discutíveis de melhora humanística.

Aumentamos nossa expectativa de vida para mais de setenta anos de idade e mesmo que tal dado não estivesse cientificamente registrado, bastaria olharmos o nosso entorno para nos impressionarmos como em tão pouco tempo, principalmente nas últimas quatro décadas, aumentou o número de pessoas que já entraram na terceira idade.

Todavia, se por um lado a ciência comemora seus incríveis avanços e conquistas, por outro lado a sociedade, em especial a nossa, acumula um "passivo" para a qual nitidamente não está preparada para receber.

A população idosa cresce em proporção exponencial bem maior do que a infra estrutura social a ela destinada.

Se aqui no Brasil ainda não conseguimos resolver questões básicas como a de fornecer a mínima educação aos que estão chegando neste nosso mundo confuso, o que dizer então da garantia, ainda que pelos meios políticos tão carcomidos, das condições de vida digna aos que já estão se despedindo daqui.

Este meu texto, a principio, pode até parecer algo pessimista, mas na verdade é uma visão muito realista que já faz certo tempo que me norteia, todavia esclareço que escrevo apenas baseada na minha vivência profissional do dia a dia.

Saibam os que me lêem, excetuando-se os raros idosos que pertencem às classes sociais mais favorecidas, as demais condições de vida desfrutadas pela maioria que adentra a terceira idade são duma precariedade ASSUSTADORA.

Repito, falo com conhecimento de campo.

A previdência social está muito longe de assegurar as devidas providências ao amparo da dignidade da pessoa idosa.

Afora o problema financeiro que atinge essas pessoas de maneira cruel , momento em que adoecem e precisam dum "status financeiro" mais alargado, temos mais um difícil impasse de promoção do "bem estar social do idoso", uma difícil situação a ser equacionada: a logística do dia a dia dessas pessoas, a infraestruturação social programática que não existe.

Às duras penas aprendemos que a manutenção duma sociedade idosa demanda por investimento social e financeiro, tanto individual como coletivo, inclusive na área da saúde pública.

Quando dentro dos seus lares, os adoecidos nos seios das famílias, sem autonomia e independência, muitas vezes ficam ao léu da sua sorte, pois as famílias precisam trabalhar para garantir o sustento da casa e nem sempre contam com cuidadores habilitados para atuarem juntos aos seus idosos.

Quando adoecidos gravemente nos leitos dos hospitais, muitas são as vezes em que as altas não se consolidam porque as famílias, inseguras, temem assumí-los de volta aos lares, e mesmo as famílias mais estruturadas socialmente nem sempre têm como cuidar dos seus idosos na tão difícil logística do dia-a -dia.

Não há serviço de "Home Care" (cuidados domésticos especializados em saúde) suficientes pelas cidades, sequer instituições de retaguarda para recuperação dos eventos pertinentes às doenças crônicas cada vez mais prevalentes, e os leitos dos hospitais de alta complexidade ficam, muitas vezes por tempo indefinido, ocupados por problemas de desamparo social, mesmo depois de solucionadas as questões prioritárias de saúde que deram origem às internações.

Tenho percebido, e é muito difícil constatar a veracidade desta situação QUE DESCREVO como pessoas iguais que todos somos, que são MUITOS os idosos que ficam totalmente reféns de sua doença, dos seus indignos proventos depois de uma vida inteira trabalhada em prol do país e a mercê dos familiares que muitas vezes não sabem como mantê-los seguros e saudáveis em casa.

E de nada adianta vir lá um "Estatuto do Idoso" que escreve tudo bonito demais mas que parece que NEM DE LONGE conhece a atual, complexa e muito triste, situação do IDOSO NO BRASIL.

Ninguém sobrevive de textos, ainda que bem intencionados.

É nessa hora que pergunto a sei lá quem, já sabendo de antemão que não terei resposta alguma: Cadê o papel do nosso Estado no sentido de receber esta nova realidade social que se apresenta, com verdadeira vontade política de atuação?

Cadê a criação duma política de real amparo social para acomodarmos nossos idosos que se avolumam doentes, desamparados e segregados como se fossem um "passivo social" que ninguém quer enxergar?

Será que aos políticos basta comemorarmos o avanço da longevidade das pessoas como se todas as DEMANDAS SOCIAIS que decorrem deste avanço já estivessem solucionadas e garantidas?

Números de idosos por aqui, saibam, pouco refletem a sua qualidade de vida.

Ao contrário: há idosos cuja longevidade só significa muito, MAS MUITO SOFRIMENTO., portanto uma curva de longevidade bem inversamente proporcional à felicidade de se viver bem.

É o que , infelizmente, tenho presenciado ao vivo, desbotadamente.

A situação é preocupante demais entre tantas outras que assolam o Brasil, como por exemplo, a corrupção já gritada ontem, dia Vinte e um de Abril, aos quatro cantos do país.

Dizem que Tiradentes morreu pelos impostos, e nós? Somos solidários a ele até hoje!

Afinal, morremos a cada dia, não apenas por eles, mas também pela corrupção que nos assola.

E depois ainda temos que ouvir certos de líderes de países poderosos opinarem que por aqui alguém ainda luta contra a corrupção.

É brincadeira ou é algo sério...aquele discurso nada embasado na realidade?

Por aqui basta se "caiar" as paredes dos tantos cenários... e os índices de desenvolvimento sobem...sobem...sobem...com a qualidade de vida despencando em todos os setores sociais!

Quanto do nosso passivo corrompido ou do nosso extenso ativo corruptível de país potencialmente rico aos olhos dos lá de fora , este que todos os dias se noticia a se perder de vista pelos ralos do descompromisso nacionalista, não poderia, por exemplo, ser aplicado em prol da terceira idade do Brasil, para que não nos transformemos num abandonado “passivo social” longe de solução?

Ou empregado na saúde que agoniza, na educação que degringola, ou na violência que assola, enfim, do respeito pela cidadania tão aclamada mas em nada respeitada?

Difícil responder a esta pergunta quando sequer repensamos a situação da nossa mais que abandonada e primordial Infância.

O risco da qualidade da vida de quem aqui nasce é bem maior do que o da vida de quem aqui está a morrer, já que uma criança naturalmente sem passado, poderá, em determinadas condições, estar condenada a não ter presente, muito menos futuro de idoso.

Fica aqui o meu questionamento que me vem lá do fundo d'alma.

Dizem que não há mal que sempre dure, todavia estamos bem longe de vivenciar o bem que nunca se acaba, e bem lá no fundo do meu sentimento, aonde eu mal consigo me enxergar, eu talvez ainda acredite que vamos acordar...ainda que num bem REMOTO dia dum sol refratário às nossas tantas “peneiras”.

Nota: Confesso que temo fazer parte, num futuro não tão remoto, desse passivo social histórico atualmente tão “negligenciado”.