Cagada Filosófica
Quando a fuga é a última, senão única, escapatória para nos encontrarmos da forma que queremos nos ver. Quando tudo que nos cerca não tem o sabor peculiar do interesse, nem nos desperta or ares da curiosidade. Quando a necessidade de comprar não nos da motivos para consumir, muito menos para nos perdermos nas horas exaustivas de um trabalho que nos mata cotidianamente, sendo mais um fardo que uma benção. Quando a liberdade nos é tirada sem explicações, e nós, que deveríamos ser seu mais ferrenho defensor, nada fazemos, a vendemos ou simplesmente a jogamos fora por uma falsa sensação de segurança que nos parece cada dia mais distantes de alcançar, ou por promessas vazias de um vida melhor noutro mundo, quando só temos certeza da nossa vida agora, nesse pedacinho de chão, chamado terra.
Quando o pensar nos é roubado pela facilidade e mecanicidade de um "sim senhor", deixando que nossos neurónios sejam meras molduras internas de castrados pensamentos, e nem sequer nos damos conta disso, ou pior, damos e nada fazemos, por que ir contra um sistema, seja lá qual for, sempre nos joga contra a maioria, por mais burra e estúpida que ela seja, ainda é uma maioria, e assumir tal ato é correr o risco de uma vida solitária, mas vendo por um lado menos degradante, seria uma distanciamento de pessoas vazias e que não pensam, ou que fingem que pensam, quando na verdade apenas tomam para si as ideias alheias, como turbadores que roubam para si a posse dos outros; mas por outro lado seria um viver repleto de idéias e questionamentos dignos de horas de conversas infindáveis com pessoas, que de tão raras, teremos sorte na vida se encontrarmos duas ou três em toda vida.
Quando a quebra de um pequeno paradigma, como andar descalço onde somente se veem pés vestidos, ou falar que se ve naturalidade na nudez, independente do local, é visto como estardalhaço, quando não passa de uma tentativa de voltar a um estado anterior, onde tais coisas eram simples e naturais, ou, até mesmo, defender o amor, seja ele qual for, hetero, homo, bi, pan... e por ai vai, quando tais coisas forem vistas como medidas simples de chamar atenção, ou como atos de loucura, esquecendo-nos que nossos antepassados, os tão bem falados gregos clássicos, nada de mais nisso viam.
Tornamo-nos escravos de nossos desejos, de nosso consumo vazio, deixando de lado os pensamentos e sentimentos, por que produzir está acima de ser e sentir, está além da vontade de tornar-se humano, seja pela posse desenfreada de bens fugazes ou pelas promessas de elevação espiritual instantânea, pregada em tantos templos, que mais parecem abatedores de homens, visto que aqueles que lá se formam são tudo menos homo sapiens sapiens, pois a condição humana não tem ligação com a natureza mítica dos anjos, mas sim, pelo menos no meu ver, está atrelada a eterna mutação, trazendo tal atributo como única constate, é trazer dentro de si a benção da dubiedade do pensar e do sentir e seus inúmeros resultados. Os únicos entes imutáveis, que tenho conhecimento, são (D)eus e o passado, como não somos (D)eus, nem vivemos no passado, nem muito menos o somos, não a imutabilidade como atributo, ainda bem, pois ser eternamente um ser errante deve, perdão pelo termo, uma merda, ou mesmo ser um ser perfeito não deve ser tão bom, só de pensar em ser eternamente a figura que sou já me causa um tédio sem fim. Se eu fosse deus, muito provavelmente eu teria inveja da condição humana, uma caótica e única dança de salão.
Sonho com o tempo que seremos livres para vivermos, para sermos, para conquistarmos o maior bem que o podemos nos dar: nosso auto-conhecimento, nossa evolução moral e espiritual, não para nos tornarmos anjos, mas sim para virmos a ser homens melhores, que não se vendem por promessas impalpáveis, nem se tornam escravos de seres abstratos.