Sociedade alternativa

Outro dia observei o vento que me trouxe notícias de outro tempo. Um tempo em que os corações pulsavam mais e as gargantas cantavam apaixonadas um sonho.

O ar musicado embriagava as almas sedentas de paz. Os rostos revelavam que todos ainda permaneciam atônitos e incrédulos com que seus olhos viram, seus ouvidos ouviram, suas entranhas sentiram.

Tudo parecia suspenso no ar. O peito sufocava um grito de dor.

Não!

Era a palavra presa nos lábios entreabertos de uma geração, que pagava o preço da loucura de alguns.

Porquê?

A pergunta que não foi respondida.

E agora?

A pergunta que precisavam responder.

O sonho de fazer "o agora" ser o que desejavam que fosse, explodiu a paixão que ardia no peito pela vida e para a vida. Mobilizou-os numa corrida contra o tempo, que lhes parecia curto demais e os fez mostrar ao mundo a força da rebeldia.

Desfilaram seus cabelos crescidos emaranhados, suas roupas despojadas desajeitadas, seus pés quase descalços em seus corpos que transpiravam química. Soltaram a voz presa de cólera da vontade de dizer não. Produziram um som pesado para falar do peso que lhes pousava nos ombros.

Caminharam pelas estradas levando quase nada, somente uma mochila nas costas e um sonho no coração.

Aonde ir? O que buscar? Onde encontrar?

Para essas perguntas sem respostas, restava a companhia anestesiante das folhas secas da erva.

Na voz rouca e cheia de poder, traduzia-se o sentimento órfão da estrutura rompida, da vida esfacelada. Era preciso sentir o sangue correr nas veias para acreditar que sobrevivera. Era preciso materializar a vida nas cordas de um instrumento capaz de eletrizar os corações e fazê-los pulsar forte.

A voz! O som! A guitarra! A vida! A ansiedade pela vida era desmedida, a ponto de morrer de tanto querer viver!

Uma sociedade alternativa foi a razão dessa geração herdeira dos traumas dos ventos da guerra. Outros ventos sopraram e os acalmaram.

Alguns ficaram perdidos nas estradas, outros se adaptaram novamente, porém todos fomos contagiados por eles e ainda os ouvimos apaixonados.

O vento levou o sonho entre outras coisas, mas deixou os sons das notas musicais e o cachimbo da paz.

Tita Miranda
Enviado por Tita Miranda em 10/02/2012
Reeditado em 26/10/2023
Código do texto: T3492055
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