“Sem ética pode haver progresso?”

Paradoxo! Este foi o primeiro conceito que me ocorreu quando decidi refletir sobre um tema para este espaço. Paradoxo porque, à primeira vista, parece simples responder ao questionamento proposto. Entretanto, numa análise mais detida, nos damos conta de que tanto a Ética quanto o Progresso são termos de significados e aplicações diversas, por vezes antagônicas ao longo do tempo.

Assim sendo, convém, primeiramente, esboçar brevemente o sentido com que usarei cada um deles, a fim de delimitar a abrangência desejada, posto que a conceituação ampla e suficientemente fundamentada dos referidos termos, excederia o espaço e os objetivos inerentes a esta empresa.

Tomemos, portanto, Ética no sentido de ser a virtude que conduz o ser humano na busca do bem e da justiça. Ou seja, a qualidade que orienta o agir humano, visando o bem comum. Esta é a concepção de inúmeros filósofos. Entretanto, há ainda outras concepções, defendidas por outros, os quais não trarei a esta discussão, muito embora reconheça seu valor e importância para melhor compreensão do tema em questão.

Quanto ao Progresso, também nos vemos diante de um panorama conceitual significativamente amplo e diverso, o que também me faz optar pela escolha de uma conceituação o mais simples possível, mesmo reconhecendo o inconveniente e os riscos de tal escolha, porque nem sempre é possível explicar convenientemente pela via mais simples.

Dito isto, tomarei o Progresso no sentido de progressão gradual e permanente dos indivíduos (e das sociedades), expressos nas suas produções materiais e culturais. Nesse sentido, não é difícil encontrar referências ao progresso em nosso cotidiano. Basta olhar ao nosso redor: há sinais do progresso tecnológico, científico e econômico por todos os lados. É possível vislumbrar referências a ele até mesmo em nosso símbolo máximo, a bandeira nacional, na qual lemos “ORDEM E PROGRESSO”, dois pilares do ideário Positivista.

Dito isto, é hora de responder ao questionamento que motiva esta reflexão.

Não obstante a tudo que foi exposto, que a ética é a virtude que orienta ao bem e à justiça e que o progresso é o avanço, isto é, a progressão gradual e permanente dos indivíduos, defendo que, enquanto ideal, a ética é imprescindível ao progresso. Porém, ao olhar criticamente a realidade das sociedades atuais – e mesmo as do passado -, notadamente a brasileira, haveremos de concordar que (lamentavelmente) o progresso prescinde, sim, da ética. Basta citar os constantes escândalos nas mais diversas áreas e segmentos sociais: comércio, política, indústria tecnológica e tantas outras, cotidianamente expostos nos meios de comunicação – mídias, para usar o termo advindo com o avanço do progresso tecnológico.

Destarte, a todo instante nos deparamos com exemplos de indivíduos particulares, empresas e governos que agem sem nenhum escrúpulo e sem qualquer compromisso ético para atingir suas metas e objetivos. A eles o que parece importar é simplesmente que os obstáculos e limites sejam superados e que as metas relacionadas ao lucro e/ou à manutenção do poder, mantidas, não importando se pessoas ou mesmo nações inteiras acabem prejudicadas.

Face a isto, e embora acometido por sentido pesar, é difícil ver outra saída, a não ser constatar o fato de que, mesmo não sendo o desejável, o estágio atual de desenvolvimento da humanidade parece apontar para a concepção de um progresso desvinculado de intenções éticas. Não obstante a isto, porém, nos vem a reflexão e o alerta – feito por pessoas e entidades sérias - de que tal concepção e as práticas dela decorrentes nos levam a uma encruzilhada perigosa, da qual não sairemos sem grandes esforços e danos, talvez, irreversíveis. E, quanto a isto, já se manifestava abertamente o escritor Alceu Amoroso Lima, ao defender a liberdade e a expressão do ser tão decidida e insistentemente em sua atuação profissional e em sua obra.

Azé di Souza (2010)