A VIOLÊNCIA ESCOLAR E A EXPLORAÇÃO DA TRAGÉDIA NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA: um desafio de análise crítica da socie

A violência escolar e a exploração da tragédia nos meios de comunicação de massa: um desafio de análise critica da sociedade civil.

Por Luiz Carlos Serpa *

No último dia 07, infelizmente, uma tragédia envolvendo crianças e adolescentes com mais de dez mortos e quase duas dezenas de feridos, voltou a ser notícia nos meios de comunicação de massa. Não se trata, contudo, de mais um filme de ficção hollywoodiana, ou de episódios corriqueiros da nação da “liberdade”. O cenário, dessa vez, não estava acima da linha do Equador, mas, na “Terra dos Saquaremas”.

A velocidade de expansão da notícia, articulada à mídia cruzada, possibilitou, em pouco tempo, uma comoção social, permitindo aos blogs, revistas eletrônicas, jornais on-line e redes sociais a expandirem os comentários de repúdio na web.

Em entrevista, a presidente Dilma Rousseff, chega a dizer que: “Não era característica do país ocorrer esse tipo de crime”. Decerto, não estamos acostumados a ver “circulando” na mídia brasileira a ocorrência desse tipo específico de crime: “um psicopata que invade uma escola com fins de matar pessoas, deixando uma carta-confissão e por fim suicidando-se”. Foi essa a versão!

Todavia a memória não nos deixa negar, que em certo dia, no Brasil, um “psicopata” invadiu um cinema de um shopping e começou a atirar, protagonizando um “possível” personagem de um game bastante conhecido na época pela classe média. Se voltarmos um pouco mais no tempo, encontraremos algo relacionado à Candelária e tantos outros que simplesmente deixaram de existir, ou nunca existiram, por não fazerem parte da construção social da realidade das pessoas. Alguém se recorda do índio Galdino – Brasília-DF – um significante sem significado?

Quando temos a oportunidade em pesquisar sobre condutas de pessoas vulgarmente conhecidas como “Serial Killer”, há no bojo das informações, uma grande gama de questões relacionadas a algum tipo de violência sofrida na infância ou na adolescência, quando não decorrentes de problemas mentais, de relacionamentos interpessoais e até existenciais, que muitas vezes, passam despercebidos no seio da estrutura familiar.

A família, célula mater, tem o dever de internalizar limites, construir princípios e propagar valores norteadores para a vida do indivíduo, ensinando-o a viver e a conviver em sociedade, tornando-se cidadão.

Mas a educação como um palco de conflitos políticos, ideológicos e culturais, tem a árdua e espinhosa missão de formar pessoas, muitas vezes, sem as competências e habilidades para o pleno desenvolvimento de suas capacidades profissionais, desenganada ao atendimento a pessoas necessitadas de assistência especial. Essa realidade, sem dúvida, não é um exclusivismo da rede pública de ensino.

Entre os conflitos existentes no contexto educacional, a violência escolar é foco de atenção especial e de debates comumente presentes em encontros, seminários e congressos educacionais, cuja análise não se limita ao perímetro da sala de aula ou da escola, mas, sobretudo, um desafio à formação de atores sociais que hão de atuar – representando ou participando - em cenários e episódios diversos da ação humana.

A educação, portanto, deve ser entendida – mas, infelizmente, nem sempre internalizada – como um convite à liberdade, valendo-se do pressuposto que a liberdade e o conhecimento não se encontram dissociados de uma ética, e, que estes só advêm pela conquista!

A plasticidade do método educacional permite tirar do lúdico à moral para a vida; sem perder o encanto, a eficiência e a eficácia para internalizar e consolidar saberes estruturais. Isto é um legado do educador! Esses saberes, uma vez consolidados, farão parte do nosso mundo racional – que é mutante – mas a racionalidade do mundo precisa dar conta de suas mudanças para que as fatalidades sejam evitadas.

No cenário da violência escolar temos diversas discussões e debates a cerca da indisciplina - se é que possamos entender dessa forma - e das agressividades ocorridas na escola. A violência, contudo, apresenta-se, em três grandes caminhos que no decorrer das atividades educacionais se entrecruzam, convergem-se e até se excluem conforme as medidas adotadas por seus atores, nos diversos segmentos existentes na comunidade escolar. Assim, segundo o professor Vasco Moretto é possível analisar a violência escolar em três dimensões, a saber:

1. A violência da escola;

2. A violência na escola; e

3. A violência à escola.

Todavia não é nossa pretensão, neste momento, debater esses possíveis caminhos das discussões sobre a reprodução da violência escolar, mas enfatizar a exploração da tragédia nos meios de comunicação de massa em nossa sociedade, e refletir, embora rapidamente, de que a prática nefasta do “bullying” não se limita aos alunos à condição de vítima, pois, eles próprios, reproduzem tais práticas com seus colegas – o mais comum – bem como, com docentes e outros segmentos da comunidade escolar, na maioria das vezes, quando, tais pessoas, possuem determinadas posturas e/ou comportamentos que os caracterizam dentro de uma minoria social, passando a sofrer preconceitos e discriminações, prejudicando o estado de bem-estar social necessário ao bom desempenho das atividades profissionais; isto é, quando não agravadas com crime à dignidade da pessoa humana - um preceito constitucional.

Mas o fato é que nossa sociedade anda “sedenta” – infelizmente - por notícias trágicas! A tragédia como consumo cultural parece ter uma clientela fiel nos meios de comunicação de massa. A prova disso são os inúmeros programas sensacionalistas que procuram desvirtuar o objetivo da democratização da informação numa sociedade, por assim dizer, democrática de direito, à divulgação de um produto de consumo em um “horário nobre” com uma publicidade que chega a gerar milhões de dólares anualmente, e, mesmo que, usufruindo da legitimação da invasão nos lares e domicílios de modo geral, não se vê uma boa parte desse montante convertido em benefícios para a sociedade que aprova e consome esse tipo de produto.

Na verdade, tornamo-nos acionistas/investidores de um conglomerado midiático que gera milhares de milhões de lucros, mas que não são compartilhados com àqueles que se encontram na base da cadeia alimentar – a sociedade civil!

Entendendo, dessa forma, a tragédia como um dos grandes “Boom” da audiência midiática, entenda-se: não apenas os programas televisivos, mas toda a mídia cruzada, não seria de se estranhar a exploração por aquilo que garante um consumo direto: a tragédia!- e um consumo indireto: suas especulações e outros produtos agregados ao seio da sociedade capitalista, inclusive ao comprometimento de setores da sociedade civil, buscando garantir e dar visibilidade a seu projeto: quer político, quer econômico, para futuros empreendimentos.

Somando-se a isso, a reprodução de um tsunami de sentimentalismos sem raízes reais, promissoras e concretas capazes de gerar árvores frutíferas para as futuras gerações; mais um estorvo que a própria dinâmica midiática ainda não se interessou para aprofundar as discussões sobre problemas dessa magnitude: a violência escolar – no âmbito da complexidade de suas motivações, causas e consequências; discussões essas que precisam ser apreciadas pelas instâncias de poder do Estado e em constantes projetos educacionais que envolvam a sociedade civil como um todo, com a implementação de políticas públicas e sociais que, de certa forma, possam favorecer economicamente a iniciativa privada, a fim de motivá-la a aderir a um projeto de sociedade participativa que se deseja construir.

As discussões são amplas. Temos a consciência que o debate é complexo e navega por várias outras discussões como: a produção da riqueza, as desigualdades sociais, as políticas públicas sociais e educacionais, as questões relacionadas aos direitos humanos, a construção social da realidade das minorias como projeto de inclusão social, o processo de formação política da sociedade, entre outros...

Inúmeras discussões que ajudariam, portanto, a entender e dar importância a educação como uma grande alternativa para o desenvolvimento da nação num sentido macrossocial ao que chamo de: “o caminho da serenidade”; que seria à busca do equilíbrio com os limites da natureza; e o tempo como o espaço epistemológico, sendo valorizado para implementar políticas públicas que dialoguem com os respectivos profissionais da área, em todo o processo de formação do indivíduo, subsidiando as condições estruturais, psicossociais e de oportunidades de ingresso à sociedade, inclusive a de consumo, imprescindíveis ao seu desenvolvimento político, social, moral e educacional.

Assim como o processo de ensino apresenta resultados positivos no diálogo do aprender a aprender, ou seja, em políticas de atitude; a violência escolar não será arrefecida sem a mão visível de um Estado comprometido com todo o processo educacional, articulado nas três esferas de governo, com ações transformadoras em múltiplas plataformas, a partir da educação básica em parceria com a família.

Nesse contexto, mais importante que a exploração selvagem da tragédia como consumo midiático, seria a participação na construção de uma sociedade participativa que repudiasse tais incidentes com práticas educacionais estruturais e frutificadoras de cidadania, que deveria ser um dos grandes produtos de consumo da sociedade civil patrocinado pela própria mídia, e não uma balança de contrapesos onde a cidadania passa pelo Tribunal de Osíris e, mesmo assim, não consegue atingir o ponto de equilíbrio.

O desafio das políticas públicas no cenário educacional caminha, portanto, pela formação da estrutura sócio-política da sociedade, num terreno de saberes e representações que muitas vezes encontram-se desvinculadas da compatibilidade do Estado-midiático-empresarial e do compromisso com o processo de formação social, num projeto maior chamado de educação.

(*) Historiador, Pós-graduado em História, mestrando em Comunicação Social pela UFPE e membro do Núcleo de Estudos Avançados em Democracia e Direitos Humanos da UFPE.

Luiz Carlos Serpa
Enviado por Luiz Carlos Serpa em 20/05/2011
Código do texto: T2982532
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