Osama Bin Laden: uma página virada?
(mais textos em www.cronicasdobeto.blogspot.com)
Era por volta de meia-noite e meia. Eu, para variar, estava insone e assistia a um jogo de baseball, que acontecia na Filadélfia, pela televisão. De repente, a torcida começa a vibrar. É o meio da temporada e o jogo não vale praticamente nada. Aliás, nada acontece no estádio para tal comemoração. Então vem a notícia e descubro o motivo: Osama Bin Laden está morto.
A primeira impressão é de susto. Como assim, está morto? Piada? Troco de canal e coloco na Globo News e vejo a imagem de uma multidão, laureada por bandeiras americanas e gritos. Logo abaixo, um tarja traz a manchete: “Pessoas comemoram em frente à Casa Branca a morte de Osama Bin Laden”.
Coloco na CNN, a mesma coisa. BBC de Londres, a mesma coisa. Deduzo que realmente aconteceu. O anúncio foi dado, oficialmente, pelo Presidente Barack Obama. Diagnóstico: não estou sonhando, estou bem acordado e minha insônia prevalece.
A partir de agora segue meu relato sensorial. E optei por fazer assim porque devo admitir: não consegui ficar indiferente. Fiquei engasgado. Não me aterei a análises de certo, errado, contextos, conspirações, nada disso. Falarei qual foi a minha sensação porque tenho a certeza de que muitas pessoas aí, pessoas da minha geração principalmente (credo, já posso falar ”minha geração”), também ficaram tocadas. Inclusive, escrevi à caneta, no instante, ao longo da madrugada de 02 de maio de 2011, enquanto assistia a tudo, ávido, e agora só passo a limpo.
É um marco histórico, querendo você ou não. Todos se lembram onde estavam, com quem estavam e o que faziam no dia dos ataques ao World Trade Center. Eu ainda não era jornalista, nem imaginava que seria. Ainda não escrevia uma vírgula de nada em 2001. Era outro mundo para a coletividade (perdoem a redundância) e para mim como indivíduo. Contudo, apesar de ser uma pessoa diferente, não tão atenta à mídia, digamos assim, lembro-me perfeitamente de acompanhar sem piscar toda a cobertura do evento – assim como fiz esta madrugada.
Não sou fã de carteirinha dos Estados Unidos, mas estaria sendo desonesto se dissesse que não me comovi com as pessoas nas ruas, vibrando. Uma jornalista brasileira, localizada em Nova York, disse (salvo exageros) que talvez tenha sido a maior vitória militar americana desde a Segunda Grande Guerra. Ora, e não foi? Dos americanos e, repito, querendo você ou não, um acontecimento cujos motivos e consequências refletem o mundo todo. Afinal, semana passada, 16 pessoas morreram em um atentado terrorista em Marrakesh, no Marrocos – entre elas, marroquinos, franceses, canadenses e holandeses. A jornalista comentava que, tal qual o Beijo em Times Square (veja a crônica sobre a foto famosa), as pessoas se abraçavam e vibravam ontem à noite como naquele longínquo 1945. O que é compreensível, ainda mais para aqueles que estavam tão próximo quando tudo aconteceu.
Pense de forma global. Houve a geração que viveu na pele a Segunda Guerra Mundial, a geração do pós-guerra, os que cresceram sob as estrelas e martelos da Guerra Fria, consequentemente aquela que viu o Homem pisar na Lua, a que viveu – principalmente na América Latina – sob o julgo de ditaduras, a que viu a queda do Muro de Berlim (eu tinha 11 anos de idade e não compreendia direito o que acontecia) e a geração do Onze de Setembro. A minha geração.
Por volta de 3 horas da manhã (sim, virei a madrugada assistindo) o jornalista Luís Fernando Silva Pinto, via celular, falava em frente à Casa Branca e relatava que acabara de entrevistar uma senhora. Ela pedia o seguinte: “Transmita ao mundo essa notícia. Conte ao mundo todo que Bin Laden está morto. Eu perdi uma filha naquele dia, em 11 de setembro.”
Luís Fernando ainda comentou, um tanto quanto emocionado, que a mulher não estava triste, nem com um tom vingativo, nem eufórica. Ela simplesmente entendia que algum capítulo da História, enfim, havia acabado. É isso, uma página foi virada. Muita água ainda vai rolar sobre o assunto, mas, definitivamente, uma página foi virada. Apenas uma.
Antes de terminar, quero deixar claro o porquê de “apenas uma”. Este artigo não é nenhuma exaltação à vitória do bem sobre o mal, como pregava o ex-presidente (e odioso) George W. Bush. Muito pelo contrário. Neste quesito, acho que todos os lados, usando (perdoem-me) a absurda forma de linguagem, são “do mal”. Judeus já apedrejaram pecadores; cristãos foram atirados aos leões por romanos; católicos queimaram bruxas, nazistas exterminaram judeus (hoje, inclusive, é o dia que, em Israel, é lembrado o Holocausto); protestantes e católicos se mataram anos a fio na Irlanda; muçulmanos jogaram aviões contra infiéis nos Estados Unidos e promovem ataques ao redor do planeta. Portanto, não há comemoração, alívio ou surpresa no dia de hoje. Apenas a preocupação em se saber quando será a próxima perseguição e quem será a vítima da vez.