O filho como sócio ou sócio do filho

Vivemos sob o jargão “Não quero ter patrão, nem receber ordens”.

Para quem ainda não se deu conta, nosso maior patrão é o cliente, com independência e primazia de escolha.

Encontraremos fãs, rabugentos, cordiais, “reclamões”, condescendentes, palpiteiros, negligentes, uma série imensa. Cada um com suas características, mas há um em especial que não nos incomoda, ainda que cometamos os piores erros: aquele que se vai sem reclamar. Entre todos, esse é o pior patrão.

Você não precisa se defender e nem ele quer ouvi-lo. O fato é concreto, para ele você está demitido! Um olhar atento vai nos mostrar que o mercado está repleto de patrões como esse.

Alguns herdeiros, para não serem “empregados”, passam a trabalhar em empresas da família.

Gosto, ainda que o termo não seja exatamente esse- quem sabe alguém uma hora sugere um melhor- separar empresas familiares de empresas da família.

No primeiro caso, famílias se reúnem para explorar o mercado, com objetivos comuns. Buscando equilíbrio nas ações por vocação, talento e escolha.

No segundo, integrantes das famílias vão sendo agregados ao processo.

Essa observação é importante pela simples razão de que a história empresarial está repleta de casos de fracasso da segunda geração em diante por falta de “inclinação” para os negócios, como já me disseram muitos fundadores.

Outro ditado, repetido frequentemente, é o seguinte: “A primeira geração construiu, a segunda desfrutou e a terceira destruiu”.

É uma afirmação que pode ser contestada? Sim, mas ao observarmos que poucas são as empresas centenárias, as críticas perdem força.

Um aspecto que deve ser observado pelos herdeiros é que o fato da família ter tradição em um segmento empresarial essa expertise não passa pelo DNA. É fundamental para qualquer gestor se expor às dificuldades para adquirir experiência e usar como apoio a adição de competência, contratando-a.

Não se engane, você jamais será um especialista em tubarões brancos vivendo na Serra da Mantiqueira, nos lindos recantos mineiros. Para aprender terá que ver o bicho de perto!

Sou um estudioso da arte de gestão empresarial, leio tudo que posso alcançar, mas a consolidação do conhecimento se dá quando me defronto com a realidade.

Visito o mercado com frequência, me envolvo nos processos de venda nos projetos de consultoria - usando o jargão de mercado “bato mala com os vendedores” - e sempre vejo o “aperto” dos teóricos quando se defrontam com aquela pessoa do outro lado do balcão.

Sabe quem está ali? Simplesmente o “patrão”, avaliando cada passo e cada palavra dita!

Ora, você vai assumir a gestão de uma empresa familiar, então se comprometa com o aprendizado. Esteja atento à cultura ali instalada, pois pode não ser a mesma à qual está acostumado. Observe se não seria importante passar por estágios em outras organizações ou mesmo iniciar a carreira em outro lugar para adquirir conhecimentos e experiência.

Que tal efetivamente trabalhar em todas as áreas da empresa da família, “batendo cartão”, para aprender e conhecer o mundo que um dia comandará?

Uma frase ficou gravada na minha memória quando um amigo, há alguns anos, fez essa pergunta a um dos colegas de classe, que vivia às turras com o pai, e este respondeu: A empresa é da minha família, portanto também é minha. Você acha que vou fazer isso?

Nosso amigo simplesmente respondeu: - Não, acho que não! Nunca mais os vi falando sobre negócios e até evitávamos o assunto quando este se reunia conosco. Não era planejado, mas nunca mais houve “clima”. A disputa com o pai extrapolava a empresa, a própria casa e invadia as demais relações. Notávamos, claramente, que havia necessidade de apoio e aceitação. Ter razão era o fundamento de qualquer debate.

Nessa época comecei a refletir sobre as questões das empresas familiares e observar que a relação pais–filhos, em um empreendimento, tem nuances interessantes. A própria cidade em que nasci e cresci tinha um grande parque industrial, formado por empresas têxteis.

Há filho que chega e não tem a mente aberta para aprender com o pai, ou depois de algum tempo já se considera pronto e mete os pés pelas mãos. Temos pais que não cortam o cordão umbilical e, qualquer que seja a competência dos herdeiros, jamais passam o bastão.

Encontramos os que não só delegam, mas entregam a empresa, sem qualquer acompanhamento, para correrem depois atrás do desastre. Alguns, não delegam nem entregam o comando. Da forma como desaparecem, aparecem. Quando presentes tomam as rédeas sem saber o que está acontecendo e saem mudando tudo, deixando todos loucos.

E, felizmente, há os sensatos. Dão liberdade aos filhos para escolherem seus caminhos e, efetivamente, preparam os que têm interesse na gestão da organização. Os que não encontram sucessores contratam profissionais para a direção.

A influência das relações familiares em um empreendimento pode ocorrer vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana, uma vez que casais debatem assuntos com as cabeças nos travesseiros, passando pelos churrascos aos domingos e encontros de férias.

Já vi projetos, exaustivamente debatidos, durante meses, aprovados depois de muitos acordos e concessões, serem suspensos por questões pessoais, conversas fora hora, em lugar inapropriado e, também, porque um dos membros da família resolveu defender o ponto de vista de um colaborador, que não era simpático a um dos integrantes do clã.

A chegada dos filhos à empresa, muitas vezes, faz com que os pais, gestores, os tenham como sócios, procurando orientá-los quando e naquilo que for possível, com preferência de comando, contudo à medida que entregam o bastão passam essa preferência, a gestão, e se tornam sócios destes.

Um paralelo a essa reflexão é o caso do irmão do astro. Enquanto a fama do irmão superar a dele, lhe resta a posição de irmão do astro, mas se um dia sua fama superar a do irmão a situação se inverte.

Um pequeno jogo de palavras para uma grande decisão quando o objeto em foco é a gestão de empresas familiares.

Debatemos essa questão em cursos, workshops, e não faltam recomendações para que o pai se afaste e permaneça no conselho de administração, mas temos que lembrar que poucas são as empresas familiares com porte para essa estruturação.

O que muda são as atribuições no processo de condução, que permanece, muitas vezes, sofrendo influências dos privilégios da paternidade.

Vivenciei situações em que a empresa tinha dois momentos de gestão distintos: Quando o pai estava e quando não estava. A ausência tornava a empresa ágil e moderna, a presença antiga e arcaica.

As conversas informais com o antigo gestor eram interessantíssimas, repletas de sábias considerações, mas impossíveis de serem praticadas pelo seu próprio modo de conduzir as ações. Um molde perfeito da expressão “faça o que eu falo, não faça o que eu faço”.

Em outros casos, a presença dos pais trazia ordem e equilíbrio ao processo. As “maluquices”, como eram tratadas algumas ações mais arrojadas e incertas, tinham que ser feitas na ausência.

Já administramos projetos onde o objeto mais valioso para o filho gestor era um par de chuteiras trancadas no cofre. Não é figura de linguagem não. As chuteiras para os jogos com os amigos ficavam no cofre, se você está pensando que estavam autografadas por algum craque, não estavam não! A boa notícia é que hoje é um excelente profissional.

Já tive projetos onde quase uma dúzia de parentes “estava” gerente de departamentos, sem limites de gastos, comprando o que achava necessário, enquanto o caçula se digladiava com o primogênito pela preferência dos olhares do pai.

O aspecto interessante é que eram irmãos-amigos e gestores extremamente ciumentos e competitivos.

Com diz o velho ditado, com uma pequena adequação de palavras: “Entre o mar e a rocha quem leva as pancadas é o marisco”! Nesse ambiente, quem sofria eram os colaboradores que tinham de estar de um lado ou do outro.

Não poucas vezes, o recém-chegado usa do privilégio de ser filho do sócio para obter vantagens, esquecendo-se de agir com a responsabilidade devida. Naquele momento o pai não o tem apenas como filho, mas como sócio.

E há momentos em que o pai é que se esquece que é sócio do filho e age com o poder da paternidade de pai do sócio.

Quem efetivamente perde com essa situação? Todos!

A empresa, fruto de um projeto empreendedor, não pode privilegiar. Esta distribui lucros ou prejuízos, resultado da soma do desempenho de todos.

A analogia do barco que faz água é bem apropriada. Imagine que você é um dos tripulantes e a água começa a entrar. Alguém lhe pede para ajudar a retirá-la, mas você nota que o furo não está do seu lado, então não se sente na obrigação de fazê-lo.

Ora, se os demais não derem conta o barco afundará, então, definitivamente, a questão dirá respeito unicamente a você, principalmente se não for um bom nadador.

Ivan Postigo

Diretor de Gestão Empresarial

Autor do livro: Por que não? Técnicas para estruturação de carreira na área de vendas

Free e-book: Prospecção de clientes e de oportunidades de negócios

Postigo Consultoria Comunicação e Gestão

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Ivan Postigo
Enviado por Ivan Postigo em 09/04/2011
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