Gentileza

Quando alguém nos aborda, nem sempre é mendigo, vendedor ou golpista. Outro dia, um esfarrapado ser humano veio direto a mim e pediu um minutinho.

- Tudo bem. Em que posso ajudar? (com arrogância)

- Não, senhora, não preciso de ajuda

- Ãã...

- eu só queria conversar um pouquinho.

Meu... e eu com uma pressa danada, hora de chegar em casa, fazer almoço. Foi só uma rápida parada para comprar o pão...

- Bom, o que quer falar?

- É que a senhora é a única pessoa que passa por mim, me olha e diz bom-dia.

Eu nem sabia o que dizer, pois não me lembrava de ter visto esse elemento. Com tanta notícia ruim na mídia, já pensei em sair correndo, achando que poderia ser um golpista. Mas me contive e fiquei esperando.

Ele mexeu e remexeu numa sacola suja, eu ficando cada vez mais assustada, olhei em volta, vi o pátio de estacionamento cheio de gente, tranquei mais uma vez meu carro em caso de ter esquecido, apertando com muita força o botão do controle e em vez de ir embora, fiquei aí, paralisada

- Ah, achei! Minha mulher faz artesanato para vender e pedi que fizesse uma peça para presentear a senhora.

- Presente para mim? Como assim? Nem o conheço e nem o senhor me conhece.

Ele ergueu o chaveirinho, muito delicado, com florzinha de fuxico, estendendo-o para mim. Notável o trabalho, Certamente, feito com bastante habilidade.

Meu deus, que situação. Aceito ou não? Mas porque justo pra mim?

- O senhor deve estar- me confundindo.

- Não, não estou. Sou servente deste mercado e entre outras coisas, limpo este pátio. Trabalho sempre por aqui. E hoje é meu último dia nesta empresa, aposentei-me e vou ajudar minha mulher na feitura dos fuxicos. Ela tem artrite e seus dedos já estão muito detonados. Sente muitas dores.

- Onde o senhor mora?

- No horto florestal. Mas estamos saindo de lá porque o aluguel é muito caro. Vamos voltar para nossa terrinha, lá no interior.

- Como é o nome da sua mulher?

- Anivone, mas todos a chamam de Vone e o meu nome é Arturo. Aceite, por favor, é de coração.

Olhando bem para ele agora vi que, apesar de seu trabalho nada limpo, suas roupas deviam estar limpinhas pela manhã e que não era nenhum ser humano esfarrapado, mas sim um simplório homem simples, sem vaidades, porém, orgulhoso por ter recebido alguns ‘bom dia’. Realmente faço isso, mas nunca reparava nas pessoas, tanto assim que quando ele estava na minha frente, não o reconheci. Tem tantos e tantas iguais cruzando nosso caminho e ele era só mais um. De agora em diante olho com mais atenção a pessoa e cumprimento. Aceitei agradecendo, enquanto ele se virava para ir embora. Estendi a mão e ele com largo sorriso, apertou e a minha enquanto falei:

- Estou surpresa, sem palavras. Mas desejo ao senhor e sua mulher o que há de melhor. Muito obrigada pelo mimo.

E nunca mais o vi.