VIVER é fácil em sua complexidade.
Às vezes eu penso que viver é simples – um raciocínio meio calcado em cima de que os outros é que complicam. Talvez um pouco da visão de Sartre em que o “inferno são os outros”. Certamente que o sentido prático da vida exige um pouco de exercício, para que consigamos avançar em direção a uma vida menos complexa e sem “burocracias” existenciais.
Há pessoas que nos rodeiam dotadas de todas as características. Em tese isto é bom porque nos leva à convivência entre os diferentes que, quando bem conduzidas, essas idiossincrasias nos permitem evoluir em maior ou menor grau.
Certo é que não há receita para conviver. Senão os psicólogos teriam tudo para não ter problemas de relacionamento; senão médico não adoecia; padre não ia pro inferno, etc. Conviver, por não ter receita, no mínimo deve obedecer alguns parâmetros da praticidade encontrados em nossa própria natureza: dois olhos para ver muito, dois ouvidos para escutar muito, duas narinas para respirar muito, mas apenas uma boca, para falarmos pouco.
Falar pouco pode nem ser sinônimo de sabedoria, mas um ignorante calado passa por sábio e o contrario não é verdadeiro. O silencio de alguém pode ser timidez, mas nesse caso, nada como buscar alternativas para romper esse bloqueio.
Importante neste tear de convivência saudável é ser parcimonioso nas relações. A cautela, mesmo quando exagerada, dificilmente causa grandes danos nas relações. Encontrar o limite, o meio termo, talvez seja o grande desafio.
Querer conviver socialmente sem se preocupar com a forma de interagir não é bom. Neste sentido, nossas medidas particulares podem agravar ainda mais nossa participação nos vários grupos que diariamente convivemos. O principio disto é que não podemos medir os outros por nós, nem o contrário. Mas é isto que tem nutrido a vida de muita gente nestes dias de tantos valores invertidos e controvertidos.
Contudo, todos querem ser feliz. Essa felicidade, por sua vez, tem sido buscada em cima de valores materiais e atitudes nem sempre éticas, mas difundidas pelos meios de comunicação que, no geral, estão a serviço do capitalismo selvagem.
No viés da simplicidade da vida, nos recompomos no entendimento de que viver seja, de fato, muito fácil. Esta premissa se estrutura no sentido particular de cada pessoa ao redefinir seus processos de amor e de felicidade. Podemos ser feliz ganhando pouco? Podemos amar apenas a quem tem dinheiro? Dá felicidade o fato de que, com dinheiro, pode-se viajar para o exterior, comer em bons restaurantes, ter bens materiais de ultima geração? É certo que sim, mas não é errado que não seja. Há pessoas que são felizes vivendo vida simples e até distante das benesses do consumo. Correto talvez seja defender que a felicidade é um sentimento individual e, deste modo, requer princípios singulares que poderão ser encontrados em qualquer forma de vida. Acerca do amor, muitos de nós temos em nossa volta casos idiossincráticos de amores bem e mal sucedidos. Em ambos os sentidos, o que podemos avaliar é a natureza deles, ou seja, em que ética foram construídos. Isto mesmo: construídos! O amor verdadeiro não nasce por osmose. No geral é produto de construção coletiva de duas pessoas que se decidem conviver sob princípios éticos de afeto. Por isto é que entendo como burra aquela pessoa que sofre sozinha esperando que alguém a ame. O princípio é o do amor próprio. Quem se ama, quem se gosta, não se permite a romances platônicos, exceto se se tratar de uma patologia.
Viver não é fácil, mas pode ser. Amar não é simples, mas pode ser. Ser feliz é complexo, mas pode não ser. O meio, o ponto de equilíbrio de todos esses sentimentos não está escrito nas estrelas, nem vende nos supermercados. Nem depende de promessa de santo nem das benzedeiras do Rio Vermelho, nem mesmo dos santos de pai Edu no Recife.
De repente, o inferno são os outros como disse Sartre. Ou não, com talvez tenha dito Caetano Veloso... Nem sim nem não, muito menos pelo contrário, como dizem os políticos do planalto central. EU me calo imitando os sábios. Sendo feliz como sou!