OS ROMANCES PROBLEMÁTICOS DA WEB

Por volta de início de 2004 até início de 2006 muito me relacionei pela internet . Nesse tempo vivia só, após alguns relacionamentos fracassados. Na verdade eu sempre tive timidez e uma forte dificuldade de me aproximar das mulheres. Então nesse período a internet foi minha esperança de encontrar alguém e restabelecer o curso do sonho de formar uma família.

Por esse tempo, chats como o do Terra e outros, como Alma Gêmea, Par Perfeito e coisas assim, tornaram-se um vício. Madrugadas inteiras atravessei em busca de meu sonho. Conheci muitas pessoas maravilhosas. Mulheres bonitas, também não tão bonitas, gordas, muito magras, etc.. O chat do Terra me servia de vara de pescar para uma conversa mais extensa no MSN.

Pessoas interessantes encontrei em sites de relacionamentos. Entre as tantas, falei com solteiras de mais de trinta, mal-amadas, abandonadas e desprezadas. Algumas muito maravilhosas, com a aparência e perfil psicológico que agradavam meu gosto. Muitas delas apaixonaram-se logo por minha conversa romântica. Algumas já vinham da página do perfil prontas para o casamento. Por pouco algumas vezes não viajei para longe. Outras vezes viajei para lugares bem distantes. Umas vezes tive a ponto de mudar-me para o outro lado do país. Uma mulher ao Norte, com a qual me identifiquei muito, mudou de idéia na última hora, quando eu fazia os preparativos para a viagem. Por um tempo me pôs em standbay, depois mudou de idéia, mudando de idéia novamente e aparecendo mais de ano depois para me contar que estava casada e depois de mais um tempo queixar-se do novo marido, até ele se tornar uma nova página ruim de sua história.

Outra, bem menos ao norte, apaixonou-se tão loucamente por mim que disse que sufocaria se eu não ligasse imediatamente para ela. Entretanto, passados umas poucas conversas por msn, desvirtuou a conversa e por fim nem apareceu mais para o bate-papo.

Houve uma linda contabilista de Novo Hamburgo que o relacionamento virtual durou, passando quase seis meses, quando depois de muitas tentativas marcamos um encontro. Preocupado com isto, pois estava a pé, dei um jeito de comprar um carro, o que eu não podia no memento. Mas não poderia sair a noite com aquela flor e correr o risco de ficar empenhado por não ter ônibus para levá-la de volta para casa. No dia seguinte contei-lhe alegre que comprara um carro para o nosso encontro. Sendo que ela ficou muito contente com a notícia, seguimos mandando mensagens um para outro e nos falando por telefone durante todo o restante do dia. No dia seguinte, porém, um recado dela em minha caixa de e-mail cancelava o encontro, pois ela não estava certa do que queria. Também não mais atendeu ao telefone quando sabia que era eu. E, talvez por um desencargo de consciência, apareceu no MSN uma vez depois, quando respondeu a minha indagação do porque, dizendo que ela era mulher e tinha o direito de mudar de idéia.

Muito tempo depois voltou a conversar comigo e querer marcar encontro. Entretanto, não quis mais fazer papel de bobo.

Mulheres lindas também encontrei em Porto Alegre. Uma dessas, uma morena muito linda, vi de cara que não ia me querer. Perguntava-me, porém, porque, apesar da foto no perfil, quisera se encontrar comigo. Comemos numa pizzaria da Cristóvão Colombo, dei-lhe um de meus livros de presente e ao despedir-nos ela disse: “Nos falamos”, o significa: “Adeus”.

Visitei em São Leopoldo uma muito meiga ao telefone, tão apaixonada que já tinha até marcado a data do casamento. A recepção em sua casa foi extremamente fria, contrastando radicalmente com o calor do relacionamento virtual. Apesar da frieza, porém, insisti em entrar e ficar, mas muito mais a mãe dela falou comigo e me fez sala, como que querendo dar a arrancada para a filha. Entretanto, nada da minha conversa, nem mesmo meu interesse por seu falecido pai, fez que a moça se interessasse por meu assunto. Ao final, depois de ver que não renderia, fui ao banheiro para depois me despedir. E vi no trânsito ao sanitário que todos os cômodos da casa tinham câmaras de vigilância, incluindo a entrada do banheiro.

E semelhantes a estes foram mais de uma dezena de casos.

Ao final de 2005 eu já raciocinara bastante a respeito do perfil dos relacionamentos na internet. Tinha concluido aos poucos que a aproximação pela rede é um paradoxo. Significa o oposto do que parece, pois fui vendo uma a uma que as pessoas que buscam outras pela internet para relacionamentos íntimos estão fugindo da intimidade do relacionamento. Não querem expor sujeitar suas vidas as pessoas que conhecem seus defeitos.

Para que relação mais próxima do que a vivência com nossos vizinhos, com colegas de escola, de trabalho, pessoas que vemos no ônibus, nas filas, na igreja, no clube, nas viagens, etc., com os transeuntes que vemos várias vezes, sem, no entanto, jamais dizer-lhes “bom dia!”?

Se a proximidade com essas pessoas é muito mais fácil, obvia e até obrigatória, porque muitos de nós temos problemas de ajuste em casa, com os pais, com os irmãos, com os parentes chegados, com os vizinhos, colegas, etc., mas, apesar disso, pretendemos nos relacionar com pessoas distantes? Porque muitos de nós já saímos de um casamento ou dois e três e sonhamos encontrar no outro lado do mundo nosso para perfeito?

Seria porque as pessoas da internet não conhecem os defeitos que desejamos esconder? Seria porque essas pessoas não sabem que temos problemas de ajuste com as outras pessoas, que sempre que alguém se tornar comum para nós, logo nos sentimos a vontade para censurar-lhe tudo, dizer o que pensamos sem conter a língua, tratar com intolerância, com exigência desmedida e tudo o mais, além da dedicar-lhe pouco tempo, como fazemos com nossos familiares e pessoas que julgamos muito comuns para nós.

Tão simples como a água cristalina, a verdade é a seguinte: 1. Pessoas que já passaram dos trinta e estão só é porque algum problema há. Certamente são complicadas demais, indecisas demais, inconstantes ao extremo, imprevisíveis, incompreensíveis, exigentes, orgulhosas e sem amor, etc.. 2. Pessoas que buscam outras distante é porque já esgotaram as alternativas no convívio próximo. Da mesma forma que umas pessoas mudam-se de lugar para fugir dos problemas, pessoas buscam outras pessoas distantes pensando que essas não trarão problemas.

Entretanto, nosso rol de convívio é inesgotável. O Número de pessoas que podemos conhecer com nossa presença é inestimável e em nenhum lugar do mundo encontraremos pessoas mais compreensíveis do que as que podemos conhecer presencialmente. É que para ser mais compreensível uma pessoas teria que se anular muito mais e permitir que apenas nossas vontades e idéias predominassem no relacionamento. Entretanto, um relacionamento só poderá ser se houver doação de ambas as partes e anulação mútua um pouco aqui, outro pouco ali. Do contrário, seríamos uma sanguessuga a cavalgar no parceiro e se não queremos abrir mão de nada para compreendermos os outros, não podemos igualmente esperar encontrar alguém melhor que isso, pois os seres humanos são todos iguais.

Portanto, concluí que a maciça maioria das pessoas atrás de relacionamentos na internet são problemáticas e de difícil ajuste com as outras pessoas. E, sendo assim, dificilmente eu encontraria a pessoa que iria se harmonizar comigo, pois cada nova pessoa vinha com pensamentos e dificuldades de relacionamento parecidos com os meus. Sendo assim, se queria ter um relacionamento duradouro, precisava mudar tais pensamentos e vencer essas dificuldades de relacionamento, especialmente flexibilizar as exigências.

E assim, no início de 2006, quando eu já estava com quarenta anos, meu amigo me apresentou sua irmã que estava saindo de um casamento problemático que durava vinte e quatro anos. E, por termos descoberto que tínhamos muito em comum, nos unimos e há cinco anos estamos aprendendo a tolerar os defeitos um do outro. E assim, nos mantemos harmônicos, porque nossa amizade e tudo de bom que acontece entre nós é muito maior e pesam muito mais do que nossos pequenos desajustes.

Wilson do Amaral

Autor de Os Meninos da Guerra, 2003, e Os Sonhos não Conhecem Obstáculos, 2004.