FIM DOS TEMPOS
Domingo, 9h30 da manhã.
Batem em minha porta. Toc, toc, toc.
- Quem é?
- Somos uns vizinhos aqui da redondeza!
- Bom dia!
- Bom dia!
- O senhor já ouviu falar sobre o Reino de Deus? O senhor gosta de literatura bíblica? Sabia que Jesus Cristo foi morto numa estaca? Que o nome de Deus é Jeová?
E o homem disse mais um monte de coisas sobre suas crenças, eram os famosos Testemunhas de Jeová.
Depois de dizer tudo o que tinha para ser dito o homem me ofereceu uma “literatura” a preço módico. Eu disse:
- Não quero!
- Por que o Sr. não quer?
- Primeiro porque o Sr. foi desonesto!
- Eu, desonesto? Admirou-se aquele que testemunhou os feitos de Jeová.
- Sim, desonesto! O Sr. utilizou uma artimanha para que eu lhe abrisse a porta, pois se dissesse que era uma Testemunha de Jeová, certamente não obteria sucesso.
- Artimanha, eu utilizei uma artimanha?
- Sim, pois eu atendi à porta pensando ser algum vizinho, mas de fato era o Sr., uma Testemunha de Jeová.
- Senhor, nós estamos apenas pregando a palavra!
- Tudo bem, mas no domingo, às 9h30 da manhã, vocês não têm é noção do que estão fazendo!
- O senhor é alguém ímpar, disse-me aquele que viu o que Jeová fez. E continuou:
- As pessoas costumam gostar da nossa mensagem e nos recebem bem!
- Se eu quiser ouvir sua mensagem eu sei bem onde procurar, não preciso que vocês batam no meu portão no domingo às 9h30 da manhã. E digo mais, as pessoas apenas SUPORTAM vocês e não querem ser indelicadas a ponto de falarem o que estou falando.
O homem tremia de nervoso e eu também já começava a tremer.
- Olhe moço, eu tenho mais o que fazer! Vá falar sobre esse tal de Jeová em outra freguesia!
O homem foi embora desolado com as coisas que lhe falei.
Talvez suba ao púlpito do salão do reino (é assim que as Testemunhas de Jeová chamam o seu templo) e diga o quanto as pessoas de nosso tempo são insensíveis e que este episódio significa realmente que o fim dos tempos está próximo, bem próximo.
E que eu sou um representante de toda incredulidade deste tempo. E sou mesmo. Sou alguém tem consciência plena de sua laicidade e não me escondo, não vivo um ateísmo prático sob uma dissimulada prática religiosa apenas teórica que é como se apresentam os crentes dos nossos dias.
O bom é que eu tenho certeza de que eles não vão mais me acordar no domingo cedo.