FALSO MORALISMO: UM TESTEMUNHO
Há 25 anos, quando cursava universidade, freqüentei uma igreja evangélica de muito prestígio no Recife. A razão maior dessa minha participação na condição de visitante era uma namorada evangélica fervorosa. Mas havia outros motivos, pois como cristão e diante da seriedade daquela congregação me sentia muito bem assistindo aos cultos. Justiça se faça, os cultos evangélicos são muito bem conduzidos e primam, quase sempre, pela requintada apresentação de corais afinados. O acolhimento aos visitantes é impecável e cheio de calor humano.
O testemunho que darei agora em nada modifica meu respeito pelas igrejas, mas demonstra a fragilidade humana daqueles que são dirigentes religiosos. O que segue nos torna tristes porque evidencia a prática falso-moralista daqueles que, em nome de se dizerem “vidraça” não passam de “bodoque”, estilingue que ao invés de pedras arremessam o pecado que, no púlpito, condenam.
Tudo começou quando, num culto evangélico, o pastor pediu para quem estivesse ali pela primeira vez levantasse a mão. Depois ele fez uma oração que induzia aos visitantes “aceitarem Jesus” - ritual frequente nas igrejas nas igrejas evangélicas. Algumas pessoas, após a persistente aclamação do pastor, se disseram querer aceitar a Jesus. Confesso que é uma parada difícil de ser enfrentada, pois a insistência beira a “lavagem" cerebral. Contudo, aceita quem quer, penso eu. O que eu não imaginava era que aquele pastor, já acostumado a me ver na igreja, percebendo que eu não levantara minha mão, saiu do seu púlpito e se dirigiu a mim: “vamos irmão, chegou sua hora, aceite Jesus”, etc. Senti-me acuado, pois toda a igreja estava esperando minha resposta positiva o que não aconteceu. Confesso que fiquei constrangido com aquela estratégia equivocada e, por conta disto, passei a freqüentar com menos assiduidade aquele templo. O pior vem agora: certa noite, esperando meu ônibus no centro da cidade, percebi um senhor posicionado como se estivesse, como eu, aguardando condução. Ele estava de chapéu, de sobretudo e de óculos escuros, o que me despertou observá-lo. A parada do ônibus ficava na frente do cinema Trianon (hoje fechado) e que, naquela época se caracterizava por exibir filmes pornôs. Os ônibus chegavam e partiam, mas aquele homem não entreva em nenhum. Como a minha condução , após as 21h demorava bastante, decidi observar aquele senhor mais amiúde. Ele verificava as horas no relógio como se estivesse preocupado com alguma coisa. Resolvi passar perto dele e, pra minha surpresa, era aquele pastor que insistiu para eu “aceitar Jesus”. Como era inverno, começou uma chuva fininha e ele, então, aproveitou o embalo: dirigiu-se a bilheteria do cinema, comprou um ingresso e adentrou rápido. Foi tão ligeiro que o bilheteiro teve que segurar a borboleta, senão ela registrava duas entradas. Nada demais um pastor ir a um cinema, não fosse para ver um filme pornô. Lembro até qual era a película: “Chichiolina”, que naquela época era precursora desse gênero. Sinceramente continuo não achando nada demais, mas passo a não achar nada de menos, por se tratar de um uma pessoa que tudo condenava como se fosse Deus. Por várias vezes eu o vi pregar contra homossexualidade, traição, filme pornô e tudo mais.
O Lado prático disto: o pastor é homem e tem direito a suas fantasias, pois não fica difícil imaginar como esses religiosos casados devem ter um sexo apenas para fazer criança, apenas para o “crescei e multiplicai”... A carne é fraca para todos e, por isto, somos todos pecadores. Talvez o grande pecado dos religiosos fundamentalistas e pseudo progressistas seja posar de Deus: julgam, condenam, absolvem, mandam pro céu, pro inferno e para o limbo. Estou fora. Permaneço cristão e temente a Deus, mas quero distância dessas congregações, e adianto: há muitas igrejas que merecem minha admiração e meu respeito, inclusive pelo trabalho social que desenvolvem junto a comunidades carentes. A quem couber a carapuça não se abstraia, não é Mala Faia?
Ps.: a) Uma coisa me intriga: todos os evangélicos se dizem salvos. Por que choram diante da morte de um ente querido? Certamente não será por conta do vazio que o morto pode deixar; mas se o defunto for rico, então tudo pode ganhar novo significado.
b) Outra coisa que me encafifa: se Deus nos fez à sua imagem e semelhaça, por que os padres têm que rejeitar a função natural de homem? Por que têm, os padres, que não permitir que os sacramentos sejam oficiados pelas mulheres? Por que os padres e pastores agem diante do pecado de forma diferente? Exemplo: não se tem complacência com um gay como se tem com um adúltero. Existe pecado pequeno, grande e médio?
Talvez eu tenha estas e outras interrogações porque sempre entendi a ovelha perto da lã (dos pastores), mas parece ser bem o contrário. As igrejas deixam transparecer a lógica de que o mais importante não é não ser, mas parecer que não é. Uma prostituta "social" convive com a congregação sem nenhum problema, desde que não se torne pública a sua relação afetiva na condição de "amante" de um homem casado. Se essa questão envolver um homem, a igreja, machista como é, fará corpo mole e, possivelmente, as punições serão brandas. Pode ser que eu esteja equivocado, mas quanto mais as igrejas estiverem lotadas de pecadores, mais elas estarão cumprindo com o seu papel. Os pecadores, nesse caso, seriam os de "pecados cabeludos"... Diferente da prática em que todos os crentes se sentem salvos porque estão dentro da igreja, os pecadores estarão sempre do lado de fora. Perguntar não ofende!