O Computador Togado

A necessidade de uma justiça mais célere, mais proba, mais limpa, mais justa e mais humana, voltada exclusivamente aos interesses da sociedade, vem sendo discutida e caminha para uma solução que promete revolucionar o planeta. Pelo que se comenta, será o fim definitivo do acúmulo dos processos, da superlotação dos presídios. Fala-se até na redução no consumo do papel, da poluição do planeta com produtos químicos, o que será uma conquista da sociedade que hoje reclama por um meio ambiente mais limpo e mais saudável. A simples redução no consumo de papel se refletirá na poupança da vida da árvore, hoje abatida antes mesmo de ter alcançado a sua maturidade.

Não se pode mais conceber uma justiça que em pouco ou nada se diferencia das concepções pré-socráticas ou platônicas, pensadas muitos séculos antes de Cristo. As reações serão ainda mais violentas do que aquelas que se opunham ao fim do ábaco chinês, da régua de cálculo, do relógio de sol, do código morse, do telegrama, da máquina de escrever. Como justificativas, além das razões já citadas, será o fim da lerdeza, da prepotência, da vaidade, da ânsia pelo poder e, como conseqüência, da corrupção, da fraude, das indenizações cobradas do Estado por conta dos erros de todas as sortes. Melhor ainda, será o fim da prescrição e da decadência.

O computador não terá nenhuma dificuldade em dosar, com erro praticamente zero, a pena para um mesmo crime praticado em condições semelhantes, que hoje pode variar, grosseiramente, a depender do julgador, na forma do seu convencimento. Não vai precisar ser pago, convencido, não conhecerá nenhuma das partes, não terá interesse no processo, não será atingido pela vaidade, pelo poder político. Poderá trabalhar ininterruptamente sem esboçar qualquer cansaço, não precisará de férias e, na sua aposentadoria será substituído por um funcionário de mais nova geração, mais ágil e mais preciso. Será o fim da venda de sentença e do crime organizado que se alimenta justamente das falhas, inconsistências e imprecisões deste modelo de justiça herdado do início das civilizações. No Brasil será o fim dos Marcolas, dos Fernandinhos Beira Mar, das crianças transferidas para Febens, em alguns casos por juízes que acham que os pais dessas crianças são piores do que aquelas instituições. Será o fim das demandas intermináveis, da falta de esperança para quem não tem dinheiro para comprar o Direito, para pleitear justiça.

O computador será o resultado do seu programa. Advogados de defesa e de acusação serão injetores de informação para serem interpretadas logicamente pela máquina. Provas, laudos, perícias e testemunhas também (pelo menos, enquanto não puderem, mesmo que parcialmente, serem substituídas por máquinas precisas e ininfluenciáveis). Ao juiz caberá cuidar de fazer cumprir as sentenças prolatadas, de dar encaminhamento às revisões requeridas e poderá contribuir na implementação do controle interno tão discutido e almejado por todos os mortais. As árvores crescerão frondosas e o meio ambiente agradecerá feliz.

O projeto se desenvolve a passos largos e já se encontra em avançada fase de desenvolvimento. Corre em segredo de guerra para que notícias precipitadas não se transformem em bombas atômicas. Os softwares têm sido aperfeiçoados e o silêncio é a grande arma para desviar-se da oposição do segmento do poder econômico que encontra na justiça a grande máquina de fazer dinheiro. Os defensores mais entusiastas dizem que só a economia de tecido no tamanho das togas seria razão justa, e mais do que suficiente, para justificar o vulto do investimento.

Justino Francisco

07/09/2008

Justino Francisco
Enviado por Justino Francisco em 03/09/2010
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