MULHERES EM PANELAS

 

Matar mulher virou moda? Só se pode responder esta indagação, diante de dados sistemáticos e atuais acerca da violência contra a mulher. Isto se reforça em função de que a violência com o SER HUMANO no Brasil parece não ter mais controle. Os poderes constituídos nos três níveis de governo claudicam em função de teorias cujo prazo de validade já venceu faz tempo. Neste sentido, o que ninguém parece querer enxergar é a ausência do Estado na vida dos cidadãos. As favelas são o nicho maior da violência porque os governos as deixaram de fora dos processos sociais básicos. Isto é corroborado observando como as nossas grandes cidades têm suas orlas marítimas bem cuidadas, saneadas, um luxo. Nas favelas há lixo, falta de escolas, postos de saúde, etc. A rigor, os governos pecaram pela ausência absoluta de planos urbanísticos que evitassem a favelização, os bolsões de pobreza e o êxodo rural.

Independente de tudo que possamos levar em conta, há um fato que ninguém pode desconhecer: a  VIDA HUMANA no Brasil está banalizada. Não bastassem as razões políticas e sociológicas, outras menos complexas não têm andamento concreto como a REFORMA DO CÓDIGO PENAL. Neste caso particular, cientistas sociais do mundo inteiro são unânimes: a impunidade é a maior causa estimuladora da violência urbana. Não fica difícil entendermos a evidencia desta questão, posto que perto de nós há inúmeros casos de pessoas convivendo conosco quando deveriam estar presas.

Associando esse conjunto de teorias e fatos, inserir a violência contra minorias é apenas um detalhe a mais. Neste sentido, mulheres e gays são os exemplos mais cruéis da violência urbana, principalmente por conta de aspectos culturais machistas. Talvez não seja exagero o entendimento de que vivemos em uma sociedade falocrática. O poder da virilidade, da masculinidade, da força, da “espada”, ainda permeia o inconsciente (?) coletivo dos homens, mesmo considerando a modernidade que acreditamos viver.  A mulher ainda é vista como sexo frágil. O gay é fragilizado na mística reducionista de que eles são “mulheres”. Neste contexto, a mulher continua frágil e o gay que nem é homem e mulher nunca será, embora acredite que seja, são colocados na mesma sarjeta. É como, grosso modo, imaginamos que o machão entenda, embora nunca admita isto.

Mas onde entram as MULHERES DE PANELAS? – No viés do cachorro que foi morto a pauladas. Panelas é um município pernambucano de 25.000 habitantes, localizado no agreste a 201 km do Recife e a 50 km de Caruaru. Está a 533m acima do nível do mar e sua principal atração turística é o Festival Nacional de Jericos. Coisa de “jericos”? Talvez. Panelas foi palco no dia 21 de agosto de um  triplo homicídio de três mulheres.

O CASO:

(transcrito do portal PE. 360 graus, da Rede Globo Nordeste)
“José Marcelo da Silva e os sobrinhos dele - Antônio Magno do Nascimento e Wellington Quitério do Nascimento - são suspeitos de terem assassinado as três mulheres no último sábado (21), na Zona Rural do município. A polícia diz que os três conheciam as vítimas e deram carona para uma festa. De acordo com s investigações, elas foram mortas a pauladas e depois tiveram os corpos queimados. Um dos suspeitos admitiu que manteve um relacionamento com uma delas - Maria José da Soledade, de 19 anos, conhecida como Marcinha. As mortes aconteceram por ciúmes e, também, porque as mulheres sabiam do envolvimento dos suspeitos em outros crimes.

Como se pode observar, os crimes tem uma lógica já conhecida, principalmente porque envolve MULHERES, passionalidade, bandidagem.  Se quisermos inverter a lógica desse crime, certamente teremos dificuldades tipo: as três mulheres matando os três homens. Dificilmente a gente vê essa construção do mal, mas isto tem sido muito comum no Brasil, principalmente em Pernambuco onde o índice de assassinato de mulheres e gays é um dos maiores”.

Os criminosos foram presos. Tio e sobrinhos apareceram na TV como se nada tivesse acontecido – fisionomias tranqüilas, encarando as câmeras numa "nice", (lembrei de Bruno do Flamengo), aparência boa. Dava para ler no semblante deles o que já estamos acostumados a ver: dentro de pouco tempo estarão nas ruas, certamente matando mais mulheres feitas cachorros sem donos. Os cachorros ganharam para as mulheres, pois dependendo do cão, o dono faz o enterro decente. Elas, não. Além de mortas a cacetadas, foram queimadas e enterradas num terreno baldio tipo lixão.

Às mulheres compete grande responsabilidade neste sentido. Infelizmente boa parte delas ainda vive sonhando com um príncipe encantado; ainda são exageradamente românticas e cultivam a falsa concepção do “tudo por amor”, só o amor constrói etc. Com certeza o amor é bom e é um sentimento grande e majestoso. Talvez seja o sentido da vida. Mas amor é construído sob as bases do respeito, do companheirismo, da reciprocidade. Amor é coisa de dois e quando um só ama sozinho, permite ao outro o uso afetivo da pessoa. Nesse viés entra o perigo. Estabelece-se o “jogo” do forte contra o frágil, na visão machista recalcitrante em nossos dias. Estabelece-se um cardápio propenso à violência:  uso da afetividade do outro associado a condições financeiras e outras variáveis comuns ao nosso tipo de sociedade de valores tão supérfluos.

Certamente os habitantes de Panelas ficaram chocados com os crimes. E devem mandar um recado para os assassinos: “que idéia de Jericos”, conterrâneos!

 

 

 

Carlos Sena, enquanto a PANELA não ferve para passar o cafezinho.