A Verdade Segundo Platão (I)
A verdade, segundo Platão é que ela precisa estar sempre sendo buscada. A verdade não é algo concreto, palpável. Não se pode dizer dela: essa, a verdade. Ou a verdade das verdades. Tudo é relativo. Antes de Einstein Platão já sabia disso. Senão vejamos parte da narrativa platônica denominada "O Mito da Caverna", quando Sócrates afirma concludente para Glauco:
"Agora,meu caro Glauco, é só aplicares com toda exatidão essa imagem da caverna e tudo o que antes havíamos dito. A caverna subterrânea é o mundo visível. O fogo que ilumina é a luz do sol. O acorrentado que se eleva à região superior e a contempla, é a alma que se eleva ao mundo inteligível. É este pelo menos meu modo de pensar (minha verdade pessoal) que só a divindade pode saber se é verdadeiro (relatividade da verdade com relação à divindade). Quanto a mim é como passo a dizer-te. Nas últimas fronteiras do mundo inteligível está a ideia do bem criador da luz e do sol no mundo visível, autora da Inteligência e da Verdade no mundo invisível e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos levantados para agir com sabedoria nos negócios individuais e públicos."
Se a pessoa fica passiva a olhar apenas as aparências das coisas, as sombras delas, ela morre na ignorância pensando, talvez, ser a dona da verdade, quando conhece apenas a superfície sombria das aparências. Para conhecer a verdade (ainda que provisória) das coisas, é necessário agir, caminhar, voltar-se interrogativo em busca do conhecimento, da luz, da explicação mais razoável do por que existem as sombras e aqueles que nelas acreditam. As sombras são toda a realidade e toda a verdade para aqueles que não saem da caverna e se contentam em acreditar nelas.
Cada pessoa deve a si mesma um melhor conhecimento do mundo real, e para isso precisa mover-se em direção à luz do conhecimento mais amplo desse mundo, da vida, da realidade. Se toda verdade é relativa, essa relatividade mostra que verdades anteriores a um conhecimento mais amplo da "alma do mundo" se mostram sombrias, quando se alcança um conhecer mais abrangente e atual. Para conhecer uma verdade (mais ampla, abrangente e atual) a pessoa necessita reconhecer que precisa se mover em direção a essa amplitude, abrangência e atualidade. Sem esse movimento ("O movimento é a mais bela das qualidades da natureza") as verdades menores se tornam inquestionáveis e definitivas.
Uma pessoa, um grupo de pessoas, uma grande parte da sociedade, comportam-se como sombras desinteressadas da luz do conhecimento, contentando-se com o que é dito e mostrado nos canais de tv que funcionam como sombrias realidades, induzindo-as a aceitar tudo que mostram como se essa realidade à mostra não pudesse ser diversa, como se as forças sociais por trás delas, não pudessem agir de outra maneira, segundo outros, novos, paradigmas.
Essa realidade mostrada na telinha pode ser vista como a sombra atualizada da caverna de Platão. As pessoas voltadas para a contemplação dos acontecimentos sombrios se isentam da responsabilidade de se movimentarem rumo a alteração dessa realidade da sala de jantar globalizada por interesses que, presume-se, não são os delas. A telinha, cada vez maior (41, 51, 90, 105, 370 polegadas) está cada vez mais prestigiada, violenta, corrompida pelos que tiram proveito dessa corrupção das vontades (individual e coletiva) enquanto entretenimento sombrio para os observadores passivos dessas sombras semoventes da realidade do horário nobre da sala de jantar.
A verdade para Platão é que o conhecimento exige movimento, superação da passividade. A busca da verdade sugere que a pessoa possa afastar-se do lugar sombrio no qual ela se reflete enquanto sombra. É preciso, suponho, demitir-se de uma intimidade representativa da interação com os objetos e da apropriação aparente destes, confundindo-se com eles. A centelha da luz do conhecimento, uma vez saída a pessoa do mundo limitado das sombras, sugere uma série de infinitas descobertas, à proporção que o conhecimento de novas realidades as aproxima de novos questionamentos e problemas que sugerem a realidade de soluções inusitadas. Esse caminhar rumo a novas interações com a realidade, significa a superação da sombra da realidade anterior.
A pessoa que se satisfaz em contemplar a violência visível, amplamente divulgada pela mídia, e a aceitação desta contemplação, representa, numa visão atualizada da Caverna de Platão, a sombra inconsciente do sofá da sala de jantar, olhando os terrores que se sucedem na telinha, como se não fossem parte dela: sombra de uma realidade sombria.
Essa violência sombria visível é produzida por outra ainda mais feroz, a violência invisível produzida pelos que exercem comando, comunicação e controle social por detrás dos bastidores. Os manipuladores das sombras invadem países para defender privilégios e direitos de suas empresas particulares e conglomerados empresariais, dizendo que estão a defender os princípios do "mundo livre". A democracia.
A democracia: seus representantes são os responsáveis pelo tráfico de drogas estupefacientes entre milhões de crianças em todo o mundo, que, para sustentarem os vícios, têm de se prostituir desde cedo, criando uma massa de marginais que geram milhões de outros marginais, numa roda viva de sucessivas gerações que terminarão por disseminar a globalização satanizada da violência e do tráfico de uma maneira irreversível. Tornando a realidade planetária globalizada pela tirania dos bastidores. Se não há movimentação coletiva no sentido de superar esta estagnação contemplativa (dessa realidade) então as pessoas da sala de jantar podem ser consideradas sombras manipuladas por intenções sombrias.
Os grandes partidos políticos começam a negociar com instituições criminosas tipo Primeiro Comando da Capital (PCC). O PSDB ao negociar com os chefes do tráfico (para cessar a ultraviolência nas ruas e avenidas de São Paulo) está a criar elos de interação com seus interesses de eleger políticos representantes de toda a sociedade. Marcola um dos chefões da facção do PCC em São Paulo, foi acionado, segundo reportagens investigativas de vários jornais e revistas, por políticos, para que pudesse fazer parar o "tsunami" de violência que produziu aproximadamente 500 mortos em apenas uma semana na capital paulistana.
Outra forma de violência visível é a "xuxalização" (a banalização) das formas de violência via jogos interativos em máquinas, micros, Internet, "Lan house". Há muita violência e ultraviolência na maioria dos filmes produzidos por Hollywood, nos seriados de tv, nas novelas, mini-séries, desenhos animados. Essa não será uma forma de produzir sombras no fundo da Caverna de Platão??? Com a conivência silenciosa das pessoas passivas da sala de jantar??? A queda das Torres Gêmeas não é um espetáculo sombrio para a nova Caverna de Platão da sala de jantar???