O Hemisfério Sul: a parte do mundo que ainda não deu certo.

O Hemisfério Sul: a parte do mundo que ainda não deu certo.

Luiz Eduardo Corrêa Lima

(Professor Titular da FATEA/Lorena/SP)

A maior parte das Terras emersas do planeta está localizada no Hemisfério Norte aqui no Sul fica apenas 30% do total. Observa-se apenas uma grande parte da América do Sul, a metade meridional da África, parte da Oceania, incluindo toda a Austrália e a Nova Zelândia, além de um bom pedaço da Indonésia e, obviamente toda a Antártica. Além disso, existem ainda várias ilhas oceânicas, mas que representam muito pouco em termos de áreas emersas. A população do Hemisfério Sul também é bem menor, alcançando cerca de 10 a 12% do total planetário.

Ainda nem existíamos aqui no Sul e o Norte já era habitado e já existiam várias civilizações ativas e algumas até extintas. Somos o chamado “novo mundo” e lá o “velho mundo”. Por uma questão da Força de Coriolis, o velho mundo caminha no sentido anti-horário e nós, aqui no Sul, caminhamos no sentido horário. Embora, aparentemente, isso não tenha nada a ver com o que eu quero dizer, vou me esmiuçar aqui e fazer todo possível para provar exatamente o contrário. Vou tentar demonstrar que o hemisfério Sul não é apenas contrário ao Norte nos sentidos físico e geográfico, mas que ele é de fato contra as atitudes naturais e temporais dos humanos mais velhos. Ou melhor, vou tentar esclarecer que o homem aqui do hemisfério Sul é realmente diferente daquilo que o homem do Hemisfério Norte definiu e padronizou, na grande maioria dos casos. Talvez, seja por isso, que as coisas aqui costumam ocorrer sempre das maneiras mais difíceis, mais demoradas, mais complexas e mais estranhas.

As massas de ar que movem o mundo no Hemisfério Norte, isto é, os anticiclones nórdicos, produziram consequentemente algumas normas (modelos ou padrões) que se disseminaram culturalmente na humanidade, desde os tempos mais antigos da história e possivelmente tenhamos desenvolvido um ou mais pares de genes que nos remetem a essas características culturais. Entretanto, nascemos aqui no Hemisfério Sul e tivemos que nos adaptar as condições ambientais primárias imperantes, que são oriundas e impostas pelos anticiclones que fazem tudo girar no sentido horário, ou seja, contrário àquele que trazemos geneticamente. Obviamente isso deve ter produzido um conflito operacional para o bom andamento de nossa Cultura original, por conta da nossa “nova” condição geográfica e ambiental, pois nascemos no Sul, mas nossa origem cultural é do Norte.

Efetivamente, do ponto de vista natural, acredito que nos saímos muito bem. Porém, do ponto de vista sócio-cultural a coisa é muito estranha e difícil, certamente ainda temos muito que aprender, para nos adaptarmos melhor ao hemisfério em que nos encontramos. Estamos no início do processo, pois o homem sul-americano, por exemplo, possui pouco mais de 3 mil anos de história e isso não representa quase nada do ponto de vista genético e evolutivo. Nesse sentido, ainda somos crianças.

Nossa natureza geográfica e biológica sulista nos coloca numa condição adversa no que se refere a nossa origem cultural nortista e isso tem produzido inúmeros acontecimentos desastrosos e conflitantes ao longo de nossa curta história. A maioria dos desenlaces desses acontecimentos não apresenta similaridade nenhuma com os eventos semelhantes ocorridos no Hemisfério Norte, haja vista que a nossa realidade ambiental é diferente daquela e assim as respostas têm que ser também distintas. Por exemplo, aqui temos grandes florestas com alta biodiversidade, quase não temos vulcões, nossas porções dos oceanos são mais rasas. Nossos deuses primitivos são objetos naturais, do universo ou do próprio planeta. Estamos muito presos à natureza e a terra. Temos mais água doce, mas em compensação valorizamos menos esse fato. Temos mais diversidade biológica e obviamente menos cultura antrópica e social. Elegemos mal os nossos políticos, nossas leis são ruins ou utópicas e inoperáveis. Não gostamos de regras e parece até que temos uma tendência deliberada a desenvolver uma má índole social. Enfim, somos muito diferentes dos homens do Norte. Talvez seja por isso que nosso “mundo sulista” não tenha “dado certo”, pelo menos até aqui.

O Brasil, como quinto maior país do planeta e maior país do Hemisfério Sul, com 8.514.876 km² de área e sendo a principal nação sulista, com quase 200 milhões de habitantes, a quinta população da Terra, precisa dar o exemplo e começar a por ordem na casa. Precisamos eleger gente séria, competente e preocupada em mudar a cara do mundo e em particular melhorar a situação do hemisfério Sul, onde se concentram alguns dos grandes bolsões de pobreza da Terra. Temos que aproveitar a nossa Geografia e a nossa Biologia privilegiadas para convencer o Hemisfério Norte de nossa importância, mas temos que galgar um pouco mais de Cultura e de postura social adequada para alcançarmos esse objetivo.

Talvez, tenhamos apenas que ser um pouco mais polidos e educados e para isso há necessidade de investimentos maciços na Educação do povo e não na sua progressiva massificação, como até aqui se tem visto. Queremos e devemos dar certo, assim como o Norte, mas precisamos trabalhar bastante para que isso ocorra. Infelizmente, os governos que temos elegido, sistematicamente em todo o Hemisfério Sul, ainda não se tocaram da realidade e continuam querendo nos manter diferentes do mundo nórdico civilizado. Infelizmente, temos que convir que Evo Morales, Hugo Chaves, Lula e outros líderes políticos do Hemisfério Sul, estão bem aquém daquilo que precisamos.

Certamente não temos poder para inibir a Força de Coriolis e talvez nem a nossa tendência comportamental meridional natural, mas é necessário que consigamos desenvolver um mecanismo que possibilite um meio termo entre a nossa Natureza e a Cultura desejável na hora de escolher novos líderes para os países do Sul, pois do contrário não conseguiremos mudar o “status quo”. Obviamente não vamos fazer os ponteiros dos relógios andarem ao contrário, até porque, independente do Hemisfério em que se esteja, os ponteiros sempre giram no mesmo sentido, mas podemos e temos que conseguir avaliar as horas de uma maneira menos esdrúxula e mais compatível com os nossos interesses.

Educação e Cultura são fundamentais para mudança de comportamento. É disso que nós aqui no Sul, particularmente no Brasil, estamos precisando. Não podemos prescindir de adquirir novos conhecimentos e muito menos de desenvolver mecanismos que nos permitam identificar um pouco mais os valores e as vicissitudes humanas.

Luiz Eduardo Corrêa Lima (53) é Biólogo (Zoólogo), Professor, Escritor e Ambientalista;

Membro da Academia de Letras de Caçapava, ocupando a Cadeira 25;

Membro associado do Instituto de Estudos Valeparaibanos – IEV;

Ex-Vereador e Presidente da Câmara Municipal de Caçapava.