Umbigo III: a constatação do problema, a explicação e o desejo.

Umbigo III: a constatação do problema, a explicação e o desejo.

Luiz Eduardo Corrêa Lima

Tenho me referido relativamente bastante sobre o umbigo e andei sendo muito questionado a respeito desse fato, principalmente em função da minha condição de Biólogo. Por conta disso resolvi tentar me explicar para sanar todas as dúvidas possíveis, no que diz respeito a minha analogia.

Tenho dito várias vezes, que o homem do futuro deveria nascer sem umbigo. Por outro lado é claro que, como Biólogo, sei que isso é um contra-senso, haja vista que a nossa condição de mamíferos nos obriga a ter um umbigo, pois este é o registro da nossa ligação placentária com nossa mãe. Entretanto, no primeiro artigo que escrevi, no qual citei o umbigo: “Os políticos, o rabo e o umbigo”, tentei deixar claro qual era a analogia que eu queria fazer, relacionando o umbigo com o egoísmo humano, o que, aliás, é uma analogia bastante comum no pensamento popular. Entretanto, muita gente leu o segundo artigo (“De volta a questão do umbigo”), sem ter lido o primeiro e aí não entendeu direito o que eu estava dizendo e deve estar achando que eu sou “meio doido” (Se é que existe essa condição de “meio doido”).

O homem atual, quase que generalizadamente, por causa de seu extremo egoísmo, não consegue se aperceber de que vive num mundo com uma enorme quantidade de outros seres vivos, inclusive e principalmente outros seres humanos e assim, lamentavelmente, ele continua apenas olhando para o seu próprio umbigo. Isto é, segue preocupado apenas e tão somente consigo mesmo e esse é, a meu ver, o maior de todos os males da humanidade.

Infelizmente, o homem atual não é capaz, se quer, de se preocupar com outro ser humano igual a ele. O seu universo mental é restrito a sua figura e qualquer coisa diferente de si mesmo não é considerada, nem mesmo aqueles humanos mais próximos, como pais e os irmãos. Hoje se faz qualquer negócio para se manter e o resto, seja lá quem for esse resto, que se dane. Infelizmente, está havendo uma abstração absurda e inconsequente de tudo aquilo que é diferente do “eu”.

Desta maneira, fica difícil entender como se preocupar e muito menos como se investir em tentar resolver as questões planetárias, pois o indivíduo humano não permite nem mesmo outro indivíduo humano em seus interesses, quanto mais outros organismos vivos, ou mesmo planeta como um todo. Essas coisas externas são meros detalhes contingências que estão aí, mas não são nada de importante.

Agora mesmo estamos à volta com problemas sérios sobre o aquecimento global, sobre crise econômica e sobre a paz mundial. Porém, quantas pessoas (indivíduos humanos) estão de fato se importando com isso? Aliás, muitos humanos até nem sabem dos problemas e outros tantos nem querem saber. Aqui no Brasil, a roubalheira no governo (em todos os níveis) continua e no Congresso Nacional cada vez aparece com uma nova bomba, mas quem está de fato preocupado com isso? O Governo que aí está vai arrumar um jeito de ser eleito para um terceiro mandato, porque, por incrível que pareça, eles até acreditam mesmo que estão de fato fazendo um bom governo. Eles também se iludem pela ação da mídia, porque também são seres humanos. Mas, continuemos no nosso assunto.

Nós já estamos acostumados a viver as com as coisas erradas como estão e já achamos tudo isso “muito normal”. Anormal é fazer direito, é querer se envolver e opinar para tentar resolver essas questões no interesse maior da coletividade de todos os humanos (desculpem o pleonasmo, mas ele é necessário). Aliás, essa palavra, coletividade, há muito foi contingencialmente banida da nossa língua, ou melhor, ao que está parecendo foi banida de todas as línguas do mundo, pois quase ninguém mais pensa e muito menos age no interesse da coletividade. Os únicos interesses presentes para a grande maioria dos indivíduos humanos são os seguintes: “eu e o meu bolso”.

Grande parte dos humanos parece estar sozinha no planeta e, o que é pior, alguns se orgulham bastante disso. O mundo humano, o nosso planeta Terra, existe única e exclusivamente para cada um desses indivíduos em suas mentes. Eles se esquecem que a única coisa certa é que vão morrer e que não virão levar nada, seja lá para onde forem, se é que vão efetivamente para algum lugar.

Aqui há uma questão filosófica que precisa ser discutida, pois há muitos humanos que não acreditam que vão para lugar algum depois de morrerem e desta maneira, isso talvez possa justificar seus comportamentos egocêntricos. Entretanto, muitos desses humanos têm filhos, os quais também não têm nenhum valor para eles, pois nem a presença dos filhos é capaz de modificar seu comportamento egoísta. Quer dizer que eles não valorizam nem mesmo os seus filhos. Alias, para certos humanos, produzir filhos também é mera contingência e muitas vezes é apenas um acidente de percurso, o qual precisa rapidamente ser esquecido para dar continuidade aos planos pessoais.

Caramba! É muito difícil para que eu e alguns “meio doidos” como eu, possamos entender isso. Aliás, quero crer que a maioria dos humanos nem sabe (não é consciente) que faz isso, porque é levado a fazer por conta de condição promovida por outros humanos, em razão da indução produzida pela propaganda e pelo marketing que iludem as pessoas e as levam a realizar coisa que efetivamente não podem e que não querem, ou pelo menos, que não deveriam poder ou querer. Infelizmente criamos um monstro, a propaganda, muito maior que nós e estamos nos deixando levar por ele. A televisão é o principal agente coletivo no interesse desse monstro, mas existem outros. Entretanto, isso não cabe ser discutido nesse momento.

Será que é tão difícil ser um pouco mais racional e pensar que se ajudarmos a alguém, talvez alguém nos ajude. Se formos leais, talvez alguém seja leal. Se formos bons, é bem provável que alguém seja bom conosco também. Enfim, será que é tão difícil entender que se acreditarmos nas pessoas certas e não nas propagandas erradas, talvez essas pessoas acreditem na gente? Talvez, o problema esteja exatamente aí: como sabermos quais são as pessoas, os indivíduos humanos certos, em quem devemos acreditar?

Parece que estamos sofrendo de um medo coletivo, uma paúra generalizada, um temor crônico, que nos leva a desconfiar de tudo e de todos os demais humanos. Entretanto, eu não consigo acreditar que sejamos uma espécie necessariamente egocêntrica e obrigatoriamente má. Não, isso não pode ser verdade. Talvez, por isso, por esse medo coletivo e em autodefesa contra ele, é que a maioria de nós só tem se dado ao direito de se preocupar com os próprios umbigos.

Então, quero crer que devamos desconfiar e abolir de uma vez por todas a famigerada “Lei de Gérson” (a idéia de “levar vantagem em tudo”) e tudo aquilo que se relacione diretamente com ela. A humanidade não precisa de novos profetas, porque talvez esses possam ser, mais uma vez, falsos profetas. Porém, certamente a humanidade precisa de novos homens, os quais devem se fazer precursores de um novo tempo, que nos afaste dessa condição absurda que estamos vivenciando. Nesse novo tempo, com homens corajosos e longe do medo, o umbigo e o interesse pessoal exclusivo, deverão ser banidos de uma vez por todas de todas as sociedades humanas. O interesse coletivo deverá estar acima de qualquer coisa.

O novo homem passa, necessariamente, por uma nova forma de compreender a humanidade, a qual se relaciona diretamente com a necessidade de entender e de priorizar o interesse coletivo e de esquecer o umbigo de uma vez por todas. Precisamos acreditar mais na idéia de que “a união faz a força” e que devemos nos unir e ampliar as nossas relações com outros humanos para crescermos moralmente.

Bem, quero crer que eu tenha me feito entender agora e deixo aqui claramente registrado que doravante não falarei mais de umbigo, pelo menos no sentido pejorativo que esta parte importante de nosso organismo possa ter em relação ao comportamento de cada um de nós, seres humanos. Mas, por outro lado, deixo aqui também a minha expectativa de ter colaborado para que os seres humanos se lembrem, antes de tudo, que são humanos e, como tal, também são seres sociais e que, por isso mesmo, precisam, de uma maneira altruística, de outros humanos para viver. Isto é, o ser humano precisa ver outro ser humano como algo que se justifica e que demonstra a sua importância apenas por ser humano.

Nesse momento, minha analogia do umbigo acaba de virar uma utopia humanística, mas quero acreditar que ela possa ser realizável. O futuro a Deus pertence, mas podemos e devemos trabalhar ativamente para que ele seja bom para toda a humanidade.

Luiz Eduardo Corrêa Lima (53) é Biólogo, Ambientalista, Escritor, Professor de Ensino Superior, Médio e Técnico;

Membro da Academia Caçapavense de Letras, ocupando a Cadeira 25.