O que é isto que fala nas coisas? Uma ampliação da noção de inconsciente sob uma perspectiva metanalítica.

Quando Descartes publicou o cogito, “penso logo existo”, ele criou uma ilusão de que o ser humano era composto por duas substâncias distintas e independentes, uma material e outra imaterial, e que se comunicavam por algum meio misterioso, sendo a tal “coisa que pensa” a instância soberana, por onde passaria toda a interioridade do sujeito, e através da qual se construiria todo o conhecimento. Essa ilusão cartesiana de domínio da realidade pela razão, sem o auxílio da intuição, canal por onde se expressa a participação do ser humano na ordem transcendente do real, gerou a loucura no contexto moderno, transformando a moral em repressão. Foi então que Freud retomou a ideia de inconsciente prenunciada em Santo Agostinho, guardadas as devidas diferenças, a saber, impactado por pensadores trágicos como Nietzsche, enquanto em Freud, o inconsciente é um espaço de conflito entre as pulsões e as normas sociais, refúgio dos desejos obscuros e traumas, no santo, em contrapartida, o inconsciente é uma zona de comunhão com Deus, através da qual a criatura se infunde da verdade e da felicidade. Embora Freud traga consigo os vícios da pretensão iluminista morta e enterrada, não podemos ignorar o fato de que a psicanálise traz consigo uma importante pergunta: “que é isto que fala em mim?” Essa indagação conduz à libertação da tirania da moral, possibilitando uma saudável exploração do inconsciente, ainda que de um modo limitado e pessoal. Já quando retornamos a Agostinho de Hipona, defrontamo-nos com a possibilidade de com o auxílio da intuição, infundirmo-nos da graça no encontro com a vocação pessoal e na sacralização da vida. Na Metanálise Clínica Tridimensional o que se busca é o governo daquilo que no homem se abre para a totalidade do real, para a porção do Verbo presente em cada coisa, o que chamamos de Intuição. A intuição é aquilo que há de propriamente humano, um dom natural, mas que foi negligenciado e reprimido pela cultura moderna, que valoriza apenas a razão e a ciência como formas de conhecimento. A metabordagem tridimensional propõe uma recuperação e uma valorização da intuição como um guia para a compreensão e a intervenção clínica. Através da intuição, o terapeuta pode entrar em sintonia com o paciente, com o meio e com o transcendente, e assim facilitar o processo de cura, de crescimento e de realização pessoal. A intuição também permite ao terapeuta integrar as diversas escolas e técnicas de psicoterapia, sem se prender a dogmas ou paradigmas.

Para desenvolver a intuição, é preciso cultivar uma atitude de abertura, de humildade, de confiança e de amor. É preciso também exercitar a atenção, a sensibilidade, a criatividade e a contemplação. A intuição não é algo que se possa forçar ou controlar, mas sim uma faculdade passiva que envolve recepção. Ela permite-nos ouvir a voz que subjaz e fala nas coisas, e que nos convida a participar da harmonia do universo. Através da Metanálise Clínica Tridimensional uma nova e profunda pergunta se abre: "O que é isto que fala nas coisas? Através dessa pergunta o indivíduo é capaz de construir a sua metacognição, percebendo-se junto ao meio e podendo ver-se como parte de um todo maior. Assim, o paciente de metanálise clínica tridimensional pode aprender com a crise, produzir a sublimação da dor e o autodesenvolvimento. Ele pode infundir-se com sentido e vocação, tornando-se capaz de abrir diálogo seja com a doença, com o trauma, com o fora de mim, ou com a própria Ordem e o próprio Deus.

Yuri Mc Murray
Enviado por Yuri Mc Murray em 16/08/2023
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