Metanálise Tridimensional: Manifesto por um novo paradigma de saúde em psicoterapias
Quem entrou em contato com o sistema filosófico da Análise Clínica Tridimensional sabe que me distancio bastante do paradigma de saúde mental atual que está erigido sobre a ideia de bem-estar. Para a Metanálise, embora os conceitos de saúde e bem-estar estejam embricados, ambos não se confundem, ainda que o paradigma hegemônico de saúde mental diga o contrário.
A ideia sustentada atualmente é resultado de um movimento social de viés relativista cuja ênfase reformista busca romper com o que se chama "lógica manicomial". Cá entre nós, essa ideia trás até alguns pontos bem interessantes e que embora nada novos, são reproduzíveis, como a proposta de construir uma rede de atenção à saúde mental na comunidade, respeitando os direitos humanos e a diversidade das pessoas em sofrimento mental.
Infelizmente essa bandeira precisa ser levantada nesse momento onde a Igreja que era a principal promotora de cuidados nessa área, desde o advento da modernidade, - com a cisão entre a cidade de Deus e dos homens, - tem perdido cada vez mais o apelo político e social. Essa cisão se intensifica a medida em que o ensino de massa trás o estreitamento da mentalidade pública.
Com uma cosmovisão imanentista, baseada numa ótica burguesa, voltada ao trabalho, o novo paradigma cultural, sem apoio no aio civilizacional cristão, já não pode sustentar-se no universal, enfrentando desafios e limitações insuperáveis, que influenciam diretamente o conceito saúde mental. Acontece que a negação do fato cristão trás com ele a sensação de ansiedade e desorientação, a extinção dos modelos de virtude teológicos, o que cria o cenário perfeito para o ode a personalidade, para o populismo e o culto ao Estado.
O final do século XIX e início do século XX são tristes retratos disso. Atualmente seguimos a trágica trilha dos erros do passado, alavancada agora pela pretensão de domínio da realidade pela ciência, AIs, Metaverso, nanotecnologia e etc. Como diria o professor Olavo de Carvalho, damos seguimento a uma longa marcha da vaca para o brejo.
Não tenho pretensão de mudar a sociedade inteira, ou ditar tendências sociais, todavia acredito ser possível impactar positivamente a sociedade e salvar a psicologia da sua ruína, particularmente se entendemos a saúde mental como meio para a eudaimonia, e que aqui defino: um estado pessoal, individual de excelência, construído sobre um esforço comportamental sacrificial, a manifestar-se harmonicamente a um senso de sentido geral, cuja expressão, essa sim, é de natureza social.
Falar em saúde mental só é possível quando se estabelece um norte, um rumo ou modelo pelo qual o homem possa realizar-se não apenas individualmente, mas socialmente, colocando em harmonia todas as esferas da vida humana. Para isso, deve-se ter em mente que a saúde mental plena é SEMPRE uma promessa, dada a impossibilidade da realização total em ato, da excelência humana, todavia os efeitos dessa busca são o que aproximam a pessoa da sua melhor versão.
Essa melhor versão é a "tal da maturidade", a consolidação de uma personalidade ancorada em sua nuclearidade, o que leva ao estado de eudaimonia. Isso implica NECESSARIAMENTE uma lógica sacrificial, dado que a eudaimonia se diferencia de bem-estar sendo que uma narrativa onde a existência se resuma à felicidade momentânea, a uma busca do prazer ou a fuga da dor imediatas, é por si mesma não somente impossível como inviável.
É a pessoa madura aquela ancorada em sua nuclearidade, estabilizada a ponto de ser feliz mesmo diante do sofrimento, dos paradoxos e dissonâncias da vida. Nada parecido com a visão atual, onde a pretensão hedonista desemboca na imaturidade, conduz ao falseamento do ser pelo prazer, resultando em medicalização excessiva. Tudo isso em larga escala, leva a normatização da loucura e por consequência, a uma marginalização do homem saudável e maduro.
Há quem vá criticar a postura metanalítica em suas implicações políticas, todavia assumir um parâmetro de normalidade, não significa que o neurotípico deva ser acolhido em detrimento dos demais, pelo contrário, dar ao "louco" o devido cuidado e respeito é dever de uma personalidade sólida. É quando não temos uma diretriz de normalidade que tudo o mais sucumbe. Quanto ao papel do Estado, é preciso lembrar que a política não é feita senão por pessoas, e se é assim, é bom que ela seja feita por pessoas maduras.
Sendo assim, devemos reaprender a felicidade, restando-nos caminhar rumo à excelência, sempre atentos aos momentos em que gozamos simultaneamente de um suficiente estado de bem estar e saúde mental, e que essa busca infinita jamais se enfraqueça e que não acabemos nunca perdendo a fé no Sagrado e a poesia da vida.