600 mil óbitos e sem segunda dose

Estudos epidemiológicos demonstrando a subnotificação de mortes por Covid-19 no Brasil e a inaceitável falta de CoronaVac para a segunda dose são os fatos mais marcantes e lamentáveis da semana que passou.

Dois estudos, feitos pela Universidade de Washington (1) e Fiocruz (2), chegaram ao mesmo índice de subnotificação de óbitos em nosso país: 46%. Esses índices corroboram o que o microbiologista Átila Iamarino informava sobre 2020, que ficou na faixa de 40%. Assim, o Brasil, em números reais, hoje, já ultrapassou as 600 mil vítimas fatais e deve estar com algo em torno de 60 milhões de contaminados. Os números oficiais, logo, estão longe de dimensionar a realidade da pandemia em solo nacional.

A análise da universidade estadunidense demonstra que aquele país está com mais de 900 mil óbitos reais, e não apenas os 575 mil notificados oficialmente. Por esse estudo, o Brasil não é o segundo país com mais óbitos no mundo, mas sim o quarto, atrás de Estados Unidos, Índia (655 mil) e México (620 mil). Mais: não figura entre as 20 nações com mais mortes por 100 mil habitantes em números reais. 

Mudando de assunto, mas ficando no mesmo tema, não há como não expressar horror e repugnância sobre a condição de milhares da gaúchos e brasileiros que ainda aguardam a segunda dose da CoronaVac, já ultrapassado o prazo de 28 dias recomendado pelo fabricante. Deus do Céu, que país é esse, até onde chegará a incompetência, a negligência e a perversidade para com a vida das pessoas? O Ministério recomendou que não se guardasse vacinas para a segunda dose e ela faltou! Agora estão atacando a China, país que produz o IFA que o Butantan necessita para fazer as doses! Estão sabotando a "vacina do Dória", não importando o custo de vidas humanas que isso acarrete? É estarrecedor isso aconteça, mesmo num país onde o surreal e o absurdo parecem naturalizados pela política e pela ideologia negacionistas, que defendem o mercado e negam o direito à vida, agravando a pandemia em solo pátrio. Revoltante.

Finalizando, nesse quadro onde flexibilizações acontecem no Rio Grande do Sul, liberando escolas, atividades econômicas e outras, o recuo da pandemia verificado em abril - o segundo pior mês de toda pandemia (3) -, alertam os epidemiologistas - que não erraram previsão até agora -, estabilizou-se, o que pode indicar o início de uma nova onda no Estado (4) junto com a chegada do inverno, período epidemiológico sazonalmente crítico por aqui. Na ZH deste final de semana, a jornalista Rosane de Oliveira alertou na página 8: "O governador está flertando com o perigo ao retirar as balizas que impedem os prefeitos de fazer liberação ampla, geral e irrestrita. (...), pode ser difícil retomar o controle em caso de ameaça de colapso do sistema hospitalar, que é integrado e opera com margem estreita de folga".

O fundamentalismo economicista e neoliberal que grassa, reavivado nos últimos anos, segue invertendo a prioridade da vida humana, colocando-a em risco. Parece que retomamos a lógica que, no século XX, gerou mortandade em duas guerras mundiais, onde políticos e homens de negócios tomavam as decisões que repercutiam sobre a vida daqueles que morriam na linha de frente, nos campos de batalha: o povão.

O que fazer, ante tudo isso? O que protege a vida é o que a ciência e a medicina recomendam: fiquem em casa, tomem vacina, usem máscara e mantenham o distanciamento social. A prática tem demonstrado cabalmente que aqueles que tomam todo o cuidado - o possível e o que podem tomar, dependendo da circunstância - conseguem, com um pouco de sorte, passar incólumes pela pandemia. Uma boa semana a todos. Fiquem com Deus e que Ele nos proteja e ilumine.


(1) - HARTMANN, Marcel. Com subnotificações, Brasil já teria quase 600 mil óbitos. Zero Hora. Porto Alegre, 7 maio 2021, p. 24.
(2) - COVID-19: estudo analisa subnotificação de óbitos e desigualdades regionais. Fiocruz, 2021. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/noticia/covid-19-estudo-analisa-subnotificacao-de-obitos-e-desigualdades-regionais?fbclid=IwAR2YdjclQTd9ktSqu7bwZyTb4QpY7bpe8POjPi9i8xx_EFxmML-4f38Zw6c Acesso em: 9 maio 2021
(3) - GUERREIRO, João Adolfo. COVID-19: abril despedaçado na região. Portal de Notícias, 2021. Disponível em: https://www.portaldenoticias.com.br/ler-coluna/1461/joao-adolfo-guerreiro-covid-19-abril-despedacado-na-regiao.html Acessado em: 10 maio 2021
(4) - GONZATTO, Marcelo. Após recuo, temor de outro agravamento da pandemia. Zero Hora. Porto Alegre, 8 maio 2021, p. 23.