Você é feliz?

Um colega de escola me fez a pergunta do título num e-mail.

O conceito de felicidade é complexo porque é subjetivo.

Comecei a refletir sobre isso porque periodicamente pessoas próximas a mim, como esse colega, me questionam o porquê de eu não estar aproveitando minha vida me divertindo e viajando por aí, se tenho condições econômicas para isso.

Anteontem mesmo outro amigo, que sempre toca no assunto quando nos encontramos, me questionou sobre o fato de eu não viajar para espairecer. A resposta usual que adoto é dizer que no momento faço algo melhor que me toma tempo, como estar atualmente empenhado num mestrado em filosofia que me dá prazer de cursar.

Mas essa não é uma resposta adequada para responder ao cerne da questão.

Por isso, resolvi lhe dizer que o conceito de felicidade não é objetivo e sim subjetivo. Cada qual é feliz de acordo com seu jeito próprio de ser. Por exemplo, se o indivíduo gosta de viajar, mas na maior parte do tempo fica trancado em um escritório, ele é infeliz porque sua vontade subjetiva não se conforma à sua ação. Mas pode ocorrer exatamente o contrário com outro indivíduo. Se este outro indivíduo gosta de ficar trabalhando ou estudando sossegado dentro de uma sala, mas é obrigado a viajar (como os promotores de produtos), ele é infeliz porque sua vontade subjetiva também não se conforma à sua ação.

É por isso que é temerário dar conselhos a outrem sobre a felicidade porque cada qual a vê de seu modo particular.

Logo, a felicidade de uma pessoa depende da conformidade perfeita da sua vontade subjetiva - desde que esta não esteja vinculada a nenhum tipo de vício de caráter fisiológico ou moral, que, a longo prazo, leva à infelicidade - à sua ação. Quando não há conformidade, mas conflito entre a vontade subjetiva do indivíduo e a sua ação, haverá infelicidade.

O filósofo Kant também viu como a felicidade, por seu caráter subjetivo e de gradação, é um conceito difícil de ser determinado objetivamente, com estas palavras:

"Ora, é impossível que um ser, embora imensamente perspicaz e, ao mesmo tempo, potentíssimo, mas finito, faça uma ideia determinada daquilo que verdadeiramente quer. Quer ele riqueza? Que de preocupações, invejas, ciladas não vai atrair sobre si! Quer maior soma de conhecimentos e de ilustração? Talvez isso lhe aumente o poder de penetração e a perspicácia do olhar, lhe revele de maneira ainda mais terrível os males que por ora lhe estão ocultos e que não podem ser evitados ou incremente a exigência de seus desejos que muito a custo consegue satisfazer. Quer vida longa? E quem lhe afiança que ela não se converteria em longo sofrimento? Quer, ao menos, a saúde? Mas quantas vezes a indisposição do corpo impediu excessos, em que uma perfeita saúde o teria feito cair! E assim por diante. Em suma, ele é incapaz de determinar com plena certeza segundo qualquer princípio, o que o tornará verdadeiramente feliz, pois para tal precisaria de ser onisciente."

(Kant, I. "Fundamentação da metafísica dos costumes". Tradução de Antonio Pinto de Carvalho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1964, p. 79)

Imaginamos, por exemplo, que aquele catador de papel maltrapilho que vemos na rua seja infeliz. Mas, na sua liberdade de ir e vir, ele está mais feliz do que aquele milionário tetraplégico que está entravado numa cadeira de rodas ou aquele político corrupto que está pagando sua pena na prisão. Ou, na sua consciência, está mais tranquilo do que aquele ex-bilionário que perdeu a maior parte da sua fortuna lesando milhares de investidores.

Por conseguinte, a felicidade de cada um se resume no que segue. Se eu estou fazendo exatamente aquilo que me dá vontade de fazer e me dá prazer por isso, não importa qual seja essa vontade subjetiva - desde que esta não esteja vinculada a nenhum tipo de vício de caráter fisiológico ou moral, que, a longo prazo, leva à infelicidade - eu sou feliz. Se ocorrer o contrário disso, isto é, se estou fazendo exatamente algo que não se conforma à minha vontade, não importa qual seja essa vontade subjetiva -desde que não vinculada a nenhum tipo de vício - eu sou infeliz.

E ponto final.

Paulo Tadao Nagata
Enviado por Paulo Tadao Nagata em 10/03/2014
Reeditado em 20/03/2014
Código do texto: T4722821
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