Rosalda Cruz Nogueira Paim, em 1978, publica o seu livro Problemas de Enfermagem e a Terapia Centrada nas necessidades do paciente.(1)
Primeiramente e na própria bibliografia do livro, menciona-se a publicação do livro de Carl Ransom Rogers intitulado Terapia centrada no paciente;(1) noutra bibliografia menciona-se o mesmo livro com o título inexistente de Terapia Centrada nas Necessidades do Paciente.(2)
A obra referida de Carl Rogers foi traduzida com este título e publicada no Brasil em 1974, pela Livraria Martins Fontes Editora, com o título Terapia centrada no paciente. Originalmente em língua inglesa, este livro de Carl Rogers foi publicado em 1951 e com o título Client-Centered Therapy: its current practice, implications, and Theory. A obra foi publicada em Boston por Houghton Mifflin e, na sua primeira edição, continha 560 páginas.
Ainda em 1951, Carl Rogers publica um artigo intitulado Client-centered therapy: a helping process. Este artigo foi publicado pela The University of Chicago Round Table. Mas não é só: já em 1946, Carl Rogers publica um artigo intitulado Psychometric tests and cliente-centered counseling (pela então revista Educ. Psychol. Measmt) e, ainda em 1946, publica outro artigo intitulado Significant aspects of cliente-centered therapy (pela Associação Americana de Psicologia).
Ou seja, desde o princípio de suas publicações originais, Carl Rogers utilizou-se do termo cliente – e não paciente. E várias teoristas norte-americanas de Enfermagem foram influenciadas pelo pensamento de Carl Rogers, algumas apenas utilizando-se da sua linguagem revolucionária para o modo de conceber e de realizar terapia e psicoterapia: uma dessas notáveis influências é a concepção de Carl Rogers de que a psicoterapia é uma relação de ajuda; a enfermeira Ida Jean Orlando Pelletier, em 1961, em 1972 e em 1990 adota essa concepção e declara que Enfermagem é relação de ajuda; a concepção de Carl Rogers de Tornar-se Pessoa foi em alguma medida adotada e redenominada, no início dos anos de 1960, pela enfermeira Martha E. Rogers; em 1981 e em 1992, respectivamente, a enfermeira Rosemarie Rizzo Parse nomeia a sua teoria de Homem-vivendo-saúde e Teoria do vir-a-ser-humano.
Pelos fatos é improcedente o título da tradução brasileira, obviamente obedecendo ao pensamento medicocêntrico do tradutor e da própria editora, na época.
Evidente e a própria Rosalda Paim diz em seu texto da noção de se pensar o “paciente” como pessoa, remetendo-se às concepções de Carl Rogers. Talvez uma das questões incompreensíveis na Enfermagem seja exatamente esta: Pensar a pessoa como pessoa e abordá-la e nomeá-la de paciente, estabelecendo uma contradição entre pensamento e realização; pensar a integralidade da pessoa e do cuidado e apenas referenciá-la pela situação de doença e majoritariamente num cenário curativo, hospitalocêntrico e centrado no ato médico.
Carl Rogers inicialmente batizou seu modo de realizar psicoterapia de Terapia Não Diretiva, expressão usada em apenas duas de suas publicações em 1945 e 1946 (respectivamente, The non-directive method as a technique for social research e Recent research in non-directive therapy and its implications); depois, pelo mau uso geral da expressão, mudou-a para Terapia Centrada no Cliente, significando que o processo terapêutico se dá em função da experiência do cliente e não do terapeuta;(3:28) E, ainda depois, Terapia Centrada na Pessoa para finalmente qualificá-la de Abordagem Centrada na Pessoa.
Em toda a obra de Carl Rogers e expressando as suas concepções o neologismo abordagem (approche), introduzido por ele no campo da psicoterapia, tem a sua preferência ao invés do termo terapia: approche insere a interação terapêutica especificamente no plano humano, opondo-se às noções de técnica evocadora de objeto, assim como as noções de tratamento, paciente, enfermidade não expressam as concepções de Carl Rogers.(3:25-6)
O livro de Rosalda Paim de 1978 não foi republicado, embora as mesmas concepções terem sido publicadas em 1986;(2) no entanto, poder-se-á deduzir que a autora, se tivesse oportunidade, acompanharia as próprias redenominações de Carl Rogers para sua abordagem da pessoa – inequívoca e não sinonimizada ao termo e à ideologia paciente. E isto porque, em todas as publicações de artigos posteriores, evidencia-se em Rosalda Paim uma concepção humanista da vida onde a referência acadêmica é a Psicologia Humanista de que Carl Rogers é um dos maiores expoentes.
No entanto, isto é uma inferência: pode ser que a concepção de Rosalda Paim seja realmente a de Homem (indivíduo, família, comunidade) como paciente quando precisa da assistência de Enfermagem.
De qualquer modo, os vários e específicos conceitos definidos por Rosalda Paim não podem ser costurados com outras teorias ou modelos conceituais de Enfermagem. Entre alguns dos vários de seus conceitos, destacam-se:
- Enfermagem é ciência e arte do diagnóstico das necessidades de saúde, da prescrição, execução, avaliação e reajuste da assistência de enfermagem, atuando sempre e, simultaneamente, sobre o homem (família, comunidade, sociedade) e o ecossistema, com a finalidade promover, preservar e restaurar a saúde. (2:89)
- Necessidades e Problemas são coisas distintas: necessidades relacionam-se aos processos necessários para a vida e com a resposta da pessoa ao meio ambiente; problemas surgem quando há conflito entre uma ou mais daquelas necessidades, impossibilitando a pessoa de realizar adequadamente as trocas de matéria, energia, informações com o ecossistema.(1:47)
- Necessidades de Saúde: são dependências relacionadas às exigências de trocas de matéria, energia e informações entre o sistema homem (família, comunidade, sociedade) e o ecossistema, cuja facilitação é atribuída ao Sistema de Saúde, com o objetivo de promover, preservar e restaurar a saúde.(2:78-9)
- Assistência à saúde: é atenção às dependências em relação às necessidades de trocas de matéria, energia e informações entre o sistema homem (família, comunidade, sociedade) e o ecossistema, realizada pelo Sistema de Saúde, no sentido de promover, preservar e restaurar a saúde.(2:82)
- Necessidades de Enfermagem: sinônimo de dependências de Enfermagem, significa as dependências do homem (família, comunidade, sociedade) em relação às suas necessidades a serem satisfeitas pelo sistema de enfermagem.(2:98)
- Problema de Enfermagem: situação relacionada com necessidade de um tipo de atendimento de enfermagem, qual seja Ajuda, Orientação, Supervisão ou Encaminhamento de Enfermagem.(1:48) Mediante o problema de Enfermagem do indivíduo, família ou comunidade, o enfermeiro prestará assistência de Enfermagem.
- Assistência de Enfermagem: conjunto de ações sistematizadas e implementadas pelo enfermeiro e pela sua equipe com o objetivo de promover, proteger e recuperar a saúde do homem (família, comunidade, sociedade). (3:98) Noutros termos, é facilitação das trocas de matéria, energia, informações entre o sistema homem (família, comunidade, sociedade) e o ecossistema, em relação às suas dependências ou necessidades de saúde.(2:82)
Finalmente e ao contrário de Wanda Horta que define e diferencia Cuidado de Enfermagem e Assistência de Enfermagem, Rosalda Paim não utiliza a conceito Cuidado de Enfermagem como princípio básico de sua teoria e a sua concepção de diagnóstico de Enfermagem procede exclusivamente do modelo de história natural das doenças (passível de modificar-se por ações preventivas de doenças e curativas sobre as doenças) de Hugh R. Leavell e Edwin G. Clark.
REFERÊNCIAS
(1) PAIM, Rosalda Cruz Nogueira. Problemas de Enfermagem e a Terapia Centrada nas necessidades do paciente. Rio de Janeiro: Suma, 1978
Primeiramente e na própria bibliografia do livro, menciona-se a publicação do livro de Carl Ransom Rogers intitulado Terapia centrada no paciente;(1) noutra bibliografia menciona-se o mesmo livro com o título inexistente de Terapia Centrada nas Necessidades do Paciente.(2)
A obra referida de Carl Rogers foi traduzida com este título e publicada no Brasil em 1974, pela Livraria Martins Fontes Editora, com o título Terapia centrada no paciente. Originalmente em língua inglesa, este livro de Carl Rogers foi publicado em 1951 e com o título Client-Centered Therapy: its current practice, implications, and Theory. A obra foi publicada em Boston por Houghton Mifflin e, na sua primeira edição, continha 560 páginas.
Ainda em 1951, Carl Rogers publica um artigo intitulado Client-centered therapy: a helping process. Este artigo foi publicado pela The University of Chicago Round Table. Mas não é só: já em 1946, Carl Rogers publica um artigo intitulado Psychometric tests and cliente-centered counseling (pela então revista Educ. Psychol. Measmt) e, ainda em 1946, publica outro artigo intitulado Significant aspects of cliente-centered therapy (pela Associação Americana de Psicologia).
Ou seja, desde o princípio de suas publicações originais, Carl Rogers utilizou-se do termo cliente – e não paciente. E várias teoristas norte-americanas de Enfermagem foram influenciadas pelo pensamento de Carl Rogers, algumas apenas utilizando-se da sua linguagem revolucionária para o modo de conceber e de realizar terapia e psicoterapia: uma dessas notáveis influências é a concepção de Carl Rogers de que a psicoterapia é uma relação de ajuda; a enfermeira Ida Jean Orlando Pelletier, em 1961, em 1972 e em 1990 adota essa concepção e declara que Enfermagem é relação de ajuda; a concepção de Carl Rogers de Tornar-se Pessoa foi em alguma medida adotada e redenominada, no início dos anos de 1960, pela enfermeira Martha E. Rogers; em 1981 e em 1992, respectivamente, a enfermeira Rosemarie Rizzo Parse nomeia a sua teoria de Homem-vivendo-saúde e Teoria do vir-a-ser-humano.
Pelos fatos é improcedente o título da tradução brasileira, obviamente obedecendo ao pensamento medicocêntrico do tradutor e da própria editora, na época.
Evidente e a própria Rosalda Paim diz em seu texto da noção de se pensar o “paciente” como pessoa, remetendo-se às concepções de Carl Rogers. Talvez uma das questões incompreensíveis na Enfermagem seja exatamente esta: Pensar a pessoa como pessoa e abordá-la e nomeá-la de paciente, estabelecendo uma contradição entre pensamento e realização; pensar a integralidade da pessoa e do cuidado e apenas referenciá-la pela situação de doença e majoritariamente num cenário curativo, hospitalocêntrico e centrado no ato médico.
Carl Rogers inicialmente batizou seu modo de realizar psicoterapia de Terapia Não Diretiva, expressão usada em apenas duas de suas publicações em 1945 e 1946 (respectivamente, The non-directive method as a technique for social research e Recent research in non-directive therapy and its implications); depois, pelo mau uso geral da expressão, mudou-a para Terapia Centrada no Cliente, significando que o processo terapêutico se dá em função da experiência do cliente e não do terapeuta;(3:28) E, ainda depois, Terapia Centrada na Pessoa para finalmente qualificá-la de Abordagem Centrada na Pessoa.
Em toda a obra de Carl Rogers e expressando as suas concepções o neologismo abordagem (approche), introduzido por ele no campo da psicoterapia, tem a sua preferência ao invés do termo terapia: approche insere a interação terapêutica especificamente no plano humano, opondo-se às noções de técnica evocadora de objeto, assim como as noções de tratamento, paciente, enfermidade não expressam as concepções de Carl Rogers.(3:25-6)
O livro de Rosalda Paim de 1978 não foi republicado, embora as mesmas concepções terem sido publicadas em 1986;(2) no entanto, poder-se-á deduzir que a autora, se tivesse oportunidade, acompanharia as próprias redenominações de Carl Rogers para sua abordagem da pessoa – inequívoca e não sinonimizada ao termo e à ideologia paciente. E isto porque, em todas as publicações de artigos posteriores, evidencia-se em Rosalda Paim uma concepção humanista da vida onde a referência acadêmica é a Psicologia Humanista de que Carl Rogers é um dos maiores expoentes.
No entanto, isto é uma inferência: pode ser que a concepção de Rosalda Paim seja realmente a de Homem (indivíduo, família, comunidade) como paciente quando precisa da assistência de Enfermagem.
De qualquer modo, os vários e específicos conceitos definidos por Rosalda Paim não podem ser costurados com outras teorias ou modelos conceituais de Enfermagem. Entre alguns dos vários de seus conceitos, destacam-se:
- Enfermagem é ciência e arte do diagnóstico das necessidades de saúde, da prescrição, execução, avaliação e reajuste da assistência de enfermagem, atuando sempre e, simultaneamente, sobre o homem (família, comunidade, sociedade) e o ecossistema, com a finalidade promover, preservar e restaurar a saúde. (2:89)
- Necessidades e Problemas são coisas distintas: necessidades relacionam-se aos processos necessários para a vida e com a resposta da pessoa ao meio ambiente; problemas surgem quando há conflito entre uma ou mais daquelas necessidades, impossibilitando a pessoa de realizar adequadamente as trocas de matéria, energia, informações com o ecossistema.(1:47)
- Necessidades de Saúde: são dependências relacionadas às exigências de trocas de matéria, energia e informações entre o sistema homem (família, comunidade, sociedade) e o ecossistema, cuja facilitação é atribuída ao Sistema de Saúde, com o objetivo de promover, preservar e restaurar a saúde.(2:78-9)
- Assistência à saúde: é atenção às dependências em relação às necessidades de trocas de matéria, energia e informações entre o sistema homem (família, comunidade, sociedade) e o ecossistema, realizada pelo Sistema de Saúde, no sentido de promover, preservar e restaurar a saúde.(2:82)
- Necessidades de Enfermagem: sinônimo de dependências de Enfermagem, significa as dependências do homem (família, comunidade, sociedade) em relação às suas necessidades a serem satisfeitas pelo sistema de enfermagem.(2:98)
- Problema de Enfermagem: situação relacionada com necessidade de um tipo de atendimento de enfermagem, qual seja Ajuda, Orientação, Supervisão ou Encaminhamento de Enfermagem.(1:48) Mediante o problema de Enfermagem do indivíduo, família ou comunidade, o enfermeiro prestará assistência de Enfermagem.
- Assistência de Enfermagem: conjunto de ações sistematizadas e implementadas pelo enfermeiro e pela sua equipe com o objetivo de promover, proteger e recuperar a saúde do homem (família, comunidade, sociedade). (3:98) Noutros termos, é facilitação das trocas de matéria, energia, informações entre o sistema homem (família, comunidade, sociedade) e o ecossistema, em relação às suas dependências ou necessidades de saúde.(2:82)
Finalmente e ao contrário de Wanda Horta que define e diferencia Cuidado de Enfermagem e Assistência de Enfermagem, Rosalda Paim não utiliza a conceito Cuidado de Enfermagem como princípio básico de sua teoria e a sua concepção de diagnóstico de Enfermagem procede exclusivamente do modelo de história natural das doenças (passível de modificar-se por ações preventivas de doenças e curativas sobre as doenças) de Hugh R. Leavell e Edwin G. Clark.
REFERÊNCIAS
(1) PAIM, Rosalda Cruz Nogueira. Problemas de Enfermagem e a Terapia Centrada nas necessidades do paciente. Rio de Janeiro: Suma, 1978
(2) PAIM, Rosalda Cruz Nogueira. Metodologia científica em Enfermagem. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo, 1986
(3) KINGET, G. Marian. O método não-diretivo. In: ROGERS, Carl Ramson; KINGET, G. Marian. Psicoterapia e relações humanas. Volume 1. 2. ed. Belo Horizonte: Interlivros. 1977