O DESEJO DE VINGANÇA E SEUS EFEITOS PARALISANTES
Querer algo a todo custo é infantilidade e obsessão. Crianças mimadas, que os pais fazem tudo para elas e por elas é que agem assim. Não conhecem limites para conseguir o que querem, sendo insistentes e irritantes, persistindo cansativamente. Agem com inconveniência; incomodam a todos em seu raio de ação sem diferenciar entre os mais chegados e os menos chegados e, tampouco, escolher lugar para seus acessos de imposição. Nesse intento de alcançar seus propósitos, usam todo tipo de artimanha e golpe; apelam primeiro para dramatização, partindo depois para a opressão psicológica declarada, quando não para a violência. São, cruéis, mal-educadas, rebeldes e malévolas, vendo cega e unicamente seu querer.
Assim agem também as pessoas com desejo de vingança, que têm sido incentivadas a utilizar a Justiça para fazer valer sua vontade. O terem sido lesadas provê-lhes justificativa para lesar e tais pessoas não abrem mão dessa oportunidade, não recuando desse propósito apesar do tempo, mostrando que o desejo de retribuir a lesão tornou-se unicamente a razão de suas vidas, deixando claro que o instinto opressor faz parte de seus caracteres, de sua forma natural de ver as coisas, que é permeada pelo orgulho próprio e auto-estima exacerbada.
Arrastam o rancor e o ódio até verem o dano de seus desafetos ou receberem algum valor em bens materiais ou dinheiro, considerando daí a lesão desfeita ou amenizada, atitude contida de uma boa dose de engano próprio. Entretanto, o custo por essa obstinação em retribuir o mal é alto, produzindo-lhes doenças paralisantes, quando não mortais. Mortais, porém, sempre, porque abreviam em muito a vida dessas pessoas. E na Bíblia foi dito: “Irai-vos, mas não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira”. – Efésios 4:26. Portanto, ira, rancor e desejo de vingança são pecados e mal, embora a lei civil não considere.
Essa capacidade de alimentar o ódio, desinteressando-se pelas demais coisas da vida, vivendo daí em função do retribuir o mal ou receber indenização (como o caso dos pais da jornalista assassinada pelo editor do jornal em 2000), pensando nisso sistematicamente, mesmo que não permanentemente, é maldade maior que o mal praticado por quem lesou, pois aquele foi um mal praticado ocasionalmente, certamente por motivação passional, por ter sido provocado (haja vista ser ela ser uma jovem que terminou o um namoro com um senhor idoso depois de tirar dele algumas vantagens), mas o mal de seus pais em busca de vingança foi premeditado, alimentado e conservado obstinadamente e para sustentar o desejo de vingança por mais que um dia somente com muita maldade no coração e uma boa dose de interesse em tirar vantagem. E isso eles conseguiram, embora que tenha lhes custado onze anos da felicidade que poderiam ter desfrutado, bem como a saúde, pois as tantas doenças que eles produziram em si por causa do ódio e desejo de vingança que alimentaram por todo esse tempo acabaram justificando a indenização que reclamaram, conseguiram e aceitaram, apesar de ter custado a vida de sua filha. Todavia, não precisavam ter adoecido e, tampouco, precisariam de indenização por isso, pois se tivessem perdido a filha em um acidente de carro provocado por ela mesma ou por doença qualquer ficariam igualmente sem ela e retomariam a vida, vencendo a dor aos poucos com o passar do tempo, como normalmente se faz, pois não teriam de quem se vingar, não teriam a quem odiar e não haveria de quem requerer indenização.
O mesmo acontece com os familiares dos mortos na queda do avião da Tam em Congonhas, em 2007, parecendo que a possibilidade de receber indenização aguçou seu interesse pela justiça, elevando infinitamente o valor da vida desses mortos justamente num tempo em que as pessoas não têm afeto nem mesmo por seus filho, ao ponto de muitos desses familiares sofrerem quatro anos depois com a mesma gravidade do momento da perda.
De igual modo rogam por justiça os familiares dos passageiros do avião da Air France, que caiu no mar próximo ao arquipélago de Fernando de Noronha em 2009, sendo que tem sido apurado que o acidente se deu por falha dos pilotos ou mecânica, recaindo assim a responsabilidade sobre a companhia aérea, que tem capital para pagar indenizações. Não acontece o mesmo com em relação ao avião da Gol que caiu na selva amazônica em 2006 após esbarrar num pequeno avião pilotados por dois norte-americanos. Sendo que se tem apurado que a responsabilidade pelo avião é desses dois pilotos, por não terem como pagar indenizações, quase não se ouviu por justiça rogos da parte de familiares dos passageiros desse vôo.
Pessoas de bom coração, em geral se arrependem do mal e compadecem-se ao ver o sofrimento de quem lhes lesou, mesmo que esse sofrer não resulte de alguma ação punitiva sua. Pessoas de bom coração seguem sua vida na tentativa de reconstruir o que foi destruído, sem pensar que destruindo alguém recuperarão o se que perdeu. E, tampouco, pretendem dar lições nos outros, pois sabem que todos somos falhos. Falta de compaixão é coisa de bandido. O desejo de esmagar sem misericórdia é coisa de bandido. Aliás, era antes de os processos judiciais se tornarem essa generosa fonte de renda para cooperadores e usuários. E, a medida que cresce o egoísmo, a crueldade e o orgulho, cresce o desejo de vingança, de dar lição nos outros, de punir, de retribuir o mal. E, diga-se de passagem, todo mal que os (considerados) mal-feitores infringem as pessoas, o fazem como uma forma de vingança, de dar-lhes uma lição. Digo considerados mal-feitores, porque existem muito mais mal-feitores que não são considerados assim.
Quando, na Oração do Pai Nosso, Jesus ensinou que devemos perdoar a quem nos prejudica para merecermos o perdão de Deus, não pretendia proteger os maus de sofrerem o castigo pelo mal que infringem aos outros. A própria Bíblia diz que quem muito procura o mal, por fim o mal o alcança. – Provérbios 11:27. Ao contrário, porém, ensinando a perdoar, Jesus pretendia proteger os lesados dos efeitos paralisantes e mortais do ódio, do ressentimento e do desejo de vingança, que são as doenças decorrentes dos elementos químicos nocivos que o estado emocional alterado descarrega no organismo, produzindo células cancerígenas, diabetes, úlceras, cálculos e imunodeficiência, o que a ciência tem mostrado claramente. E Jesus também pretendia evitar que o mundo virasse somente e maldade – uns fazendo o mal para vingar o mal que sofrem dos outros. E não são as retaliações que têm contido o estabelecimento geral do mal na sociedade humana, são as pessoas capazes de perdoar.
Portanto, aprendamos o ensinamento de Jesus, o único motivo pelo qual Ele nasceu como homem e sofreu o dano na cruz, para nos perdoar e para que aprendêssemos a perdoar e construíssemos um mundo melhor. E é certo que não poderemos mudar o mundo, mas se aprendermos a perdoar, mudaremos a nossa vida, teremos uma vida melhor e será melhor a vida das pessoas que nos rodeiam e o mundo é formado por pessoas convivendo umas com as outras.
Wilson do Amaral
Autor de Os Meninos da Guerra, 2003 e 2004, e Os Sonhos não Conhecem Obstáculos, 2004.