Sentimento de pecado

A Igreja Católica tem afirmado que a humanidade atual perdeu o sentimento de pecado. Uma pesquisa do Instituto Futura realizada na Grande Vitória e publicada em A Gazeta de 30 de março de 2008 traz alguns dados muito significativos sobre esta questão que tem ocupado a mídia atual. Ao serem perguntados sobre “se acreditam em pecados”, 90% dos entrevistados afirmam positivamente. E nesta mesma linha de percepção, 83% acreditam que o pecado prejudica a própria vida. Por outro lado, a Igreja tem afirmado que o mundo está perdendo o sentimento de pecado. Os dados da enquete parecem ser contrastantes com a posição da Igreja.

 

Buscando uma resposta nos próprios dados da pesquisa, é possível comparar com outra questão. Ao serem perguntados se “acreditam que um dia cometeram algum pecado capital”, 57% das pessoas possuem esta consciência. A diferença entre os que acreditam em pecado e os que reconhecem terem pecado é muito grande.

O mundo moderno acabou retirando do indivíduo a responsabilidade pela vida em grupo. Por exemplo: que pessoa se sente responsável pela poluição ou pela injustiça social? Ela acredita que quem faz o mal é a sociedade. O indivíduo não se sente pecador em relação às questões que ultrapassam a esfera individual.

 

Parece-nos que é nesse nível que se situa a perda do sentimento de pecado. Quando a mesma pessoa olha para o mundo atual reconhece com muita facilidade a existência e o aumento do mal. Mas a exaltação do indivíduo acaba isentando-o de toda e qualquer responsabilidade individual e social. Outra questão reveladora na pesquisa é “se acha que a inclusão de novos pecados por parte da Igreja Católica causaria impacto no comportamento da sociedade”. A metade dos entrevistados acha que em nada mudará na vida das pessoas. Isso mostra a descrença da sociedade contemporânea em relação à reforma sócio-cultural.

 

Em contrapartida, as pessoas (77%) procuram compensar com boas ações o mal que cometeram. Parece que a religião, uma das instituições com maior crédito no mundo atual, consegue realizar até grandes transformações na vida pessoal e muito pouco em relação ao comportamento da sociedade.

 

E neste contexto, não escapam as instituições da vida civil e política. Estes dados são preocupantes. Nota-se uma grande sensibilidade social pelo mal presente no mundo e pouco crédito em relação à transformação. É pequena a inclusão da responsabilidade individual pelas questões sociais.

 

A Igreja Católica sinaliza com o aumento dos chamados “pecados capitais”. Mostrando coragem e atenção ao mundo atual, acrescenta os pecados relativos à manipulação genética, ao tráfico de drogas, à poluição do ambiente, à desigualdade. Reconhece que houve uma queda do sentimento de pecado no mundo secularizado.

A pesquisa revela que a poluição ambiental é o pecado mais lembrado pelos entrevistados. Este dado é significativo.

 

O mundo moderno apoiou-se na concepção antropocêntrica; hoje cresce uma consciência de humanidade em sua relação com o mundo. Estamos diminuindo a força antropocêntrica, e fazendo nascer uma concepção cosmocêntrica. O mundo é a nossa casa, a nossa morada e deve ser conservado. Ele foi criado para ser um grande jardim (do Éden), um paraíso, e não um caos ou um deserto que ameaça a sobrevivência da própria humanidade.

 

Se a Terra grita por justiça diante dos algozes que a destruíram e ainda a destroem, a humanidade enjaulada e injustiçada clama pelo que lhe retiraram do prato, da casa e da própria carne. É preciso muita penitência pública que permita reparar erros cometidos e, ao mesmo tempo, constituir um sentimento de co-responsabilidade em relação à dimensão social do sentimento de pecado.

 

Edebrande Cavalieri
Enviado por Edebrande Cavalieri em 05/03/2024
Código do texto: T8013448
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