Um esclarecimento necessário
Uma ideia muito errada que se tem sobre os ateus é que eles, no fundo, são apenas pessoas revoltadas com Deus porque Ele não as teria atendido em suas preces. Tal ideia é totalmente equivocada e exige que se faça um esclarecimento necessário: ateísmo é não crer em divindades e nada tem a ver com sentimentos de revolta. Como alguém pode se revoltar com um ser em cuja existência não acredita? Se alguém afirma não acreditar nos deuses nórdicos, o que nós diremos? Que essa pessoa é revoltada com Thor ou Odin? Seria o mesmo que dizer que alguém que não crê em orixás tem raiva de Ogum ou Iemanjá.
A ideia do ateu como pessoa revoltada com Deus é bem explorada no péssimo filme Deus não está morto, em que o professor universitário interpretado por Kevin Sorbo, que quer porque quer que seus alunos escrevam a frase “Deus está morto”, no final admite que tem ódio de Deus porque sua mãe morreu de câncer e Deus não o atendeu quando ele pediu que a curasse. Vamos analisar o absurdo do filme. Se você tem ódio de alguém é porque esse alguém existe e lhe deu motivos concretos para você odiá-lo. Assim, como alguém pode descrer de um ser e ter ódio dele? O argumento deste filme, além de errado, alimenta ideias preconceituosas e superficiais de que quem não crê em Deus é alguém amargo e ressentido. E muitos ateus não são insatisfeitos com suas vidas.
Dizer que o ateu tem raiva de Deus é o mesmo que compará-lo a uma criança que faz birra porque os pais lhe disseram não. Então os ateus, além de revoltados, seriam infantis, já que Deus não teria manipulado as forças do universo a seu favor. Em suma, quem é ateu não passa de uma criança mimada e egoísta que esperava que tudo ocorresse conforme sua vontade.
Precisa-se entender que ateísmo é algo totalmente desvinculado de estar (ou não) insatisfeito com a vida que se leva. Muitos ateus aliás afirmam estar satisfeitos com suas vidas e que passaram a viver mais plenamente após deixar de acreditar em divindades. A grande maioria dos que passaram a duvidar ou descrer da existência de Deus não o fez por motivos pessoais. Vários ateus, que inclusive são teólogos de formação, começaram a ter dúvidas após estudar mais profundamente a Bíblia e observar suas contradições e o fato de que não há, fora da Bíblia, registros que provem que houve um Dilúvio ou o Êxodo, por exemplo. Outro aspecto que leva muitos a se tornarem ateus é quando eles contrapõem a realidade às afirmações de líderes religiosos e aos dogmas e concluem que a realidade contrasta com os preceitos religiosos.
Com frequência, ser ateu é o resultado de um longo processo de dúvidas e questionamentos. Não são poucos os ateus que procuraram a verdade nas mais diversas religiões mas terminaram por concluir que nenhuma tinha explicações para suas dúvidas. Então, antes de fazermos afirmações preconceituosas como as de que ateus são satanistas, usados pelo diabo ou pessoas revoltadas com Deus, entendamos que o posicionamento religioso de uma pessoa é algo individual e que só diz respeito a ela que, por sinal, não tem de dar explicações ao mundo sobre o porquê de sua crença ou descrença.