Reflexões sobre o tempo e a alma
O tempo, para cada um de nós é o intervalo entre o nosso nascimento e a nossa morte. Fora disso ele não existe, pois que toda existência, para nós, só é real se ela for detectada pela nossa consciência. Por isso o famoso axioma atribuído à Descartes: penso, logo existo. Isso quer dizer que a existência, seja do quer for, está vinculada á presença de consciência do observador.
Pressupor a existência de outros universos além do nosso, ou a possibilidade de vida após a morte implica em imaginar que também nesses supostos mundos exista um tempo para ser contado. Inclusive a noção de eternidade não escapa a essa especulação pois a ideia de eternidade pressupõe um tempo que nunca acaba, mas que, de qualquer forma necessita da imagem de uma medida para poder ser expressa em linguagem.
Cada pessoa tem sua própria referência de tempo. E essa referência depende do seu movimento no espaço. Espaço e tempo são realidades concomitantes, que nasceram junto com o universo e um não poderia existir sem o outro. Quanto mais rápido nos movimentamos dentro de um espaço mais encurtamos o tempo dessa ação, o que quer dizer que quanto mais rápidos somos em nossos movimentos mais rápido o tempo passa para nós - ou nós passamos por ele.
Um exemplo: um motorista que dirige o seu carro a 100 km. por hora em uma estrada leva 2 horas para percorrer um espaço de 200 kms. Outro que dirija esse mesmo carro pela mesma estrada à 200 kms por hora levará apenas uma hora para percorrer o mesmo espaço, enquanto outro, a 50 Km. por hora levará 4 horas para fazer o mesmo trajeto. Isso é relatividade.
Einstein demonstrou, em sua teoria, que a velocidade do tempo depende do modelo de referência em que nós estamos. O tempo, na terra, toma como referência a posição dela em relação ao sol. Em consequência, ele não é o mesmo para quem vive nas duas metades da terra. No Extremo Oriente, em Tóquio ou em Sidney, por exemplo, já é amanhã, enquanto eu, no momento em que escrevo este texto, ainda estou no dia de hoje.
Um objeto, ou pessoa, que se movimente na velocidade da luz não estão sujeitos à ação do tempo. Isso significa que para esse objeto, ou pessoa, o tempo não existe. Consequentemente, ele, ou ela, também deixará de existir. Assim, a verdadeira eternidade é uma noção que não admite a existência do tempo. Isso porque os dois únicos números reais são o zero e o infinito. Zero é uma medida que sai do nada e o infinito é a quantidade de possibilidades que podem surgir numa escala absoluta. Os demais números entre o zero e o infinito são frutos da nossa imaginação. Eterno é o que não tem princípio nem fim, mas o simples fato de pensarmos em algo sem princípio nem fim já contamina a ideia porque nos obriga a colocá-la entre dois pontos, ainda que não dimensionáveis.
Para voltarmos no tempo (ou nos adiantarmos a ele) seria preciso um veículo que se deslocasse com velocidade superior à da luz. Na física clássica – que se ocupa do mundo real- isso é impossível, pois qualquer veículo que se possa inventar teria que ter uma massa, e esta, como vimos, é fator restritivo de movimentação no espaço, e consequentemente, de velocidade.
Como nenhum veículo com massa pode atingir a velocidade da luz, a única opção que resta, para alguém que queira realizar essa proeza, é transformar-se em uma grandeza quântica. Como se sabe, uma partícula de energia (um quanta) pode ser acelerada até a velocidade da luz. Uma pessoa cavalgando um fóton – um cavalo quântico- poderia fazer isso (desde que ele mesmo não tivesse também nenhuma massa, é claro). Essa seria uma possibilidade realizável se um homem pudesse se converter no seu próprio pensamento, que seria uma proeza igual a ele reduzir sua massa física a energia, numa operação contrária à equação de Einstein (E=mc²).
Isso porque o pensamento é a única realidade física que conhecemos que tem a propriedade da tele transportação. Ela é nossa única qualidade que pode estar em dois lugares ao mesmo tempo. Ela está na minha cabeça e no mesmo momento em Sidney, na Austrália, contemplando minha filha e meu neto brincando em um parquinho.
No mundo quântico essa proeza é alcançada com a aceleração de um fóton. Assim, na teoria quântica, o tempo, tal como o conhecemos – uma linha reta que liga o ponto A ao ponto B – deixa de existir. No diagrama do tempo real o universo nos aparece como unidimensional, mas no mundo quântico há uma infinidade de dimensões e o tempo simplesmente desaparece.
O único veículo que consegue atingir a velocidade capaz de eliminar o tempo é a luz. Então, se as nossas almas são feitas de luz, como propaga a teologia de todas as religiões (talvez a única coisa em que todas concordam), então ela é, de fato, eterna. Ela não está sujeita a ação do tempo. Nesse sentido, a eternidade pode ser alcançada sim. Pois de acordo com a teoria da relatividade, a velocidade de um corpo diminui na medida em que ele vai adquirindo massa. Quanto maior é a massa de um corpo, mais lento é o seu movimento dentro do espaço. A teologia aproveita essa realidade para dizer que o nosso apego aos bens materiais, que geralmente é associado ao nosso ego, que por sua vez é responsável por todos os nossos desejos, é como uma massa que adere à nossa alma.
Destarte, a alma, que é uma centelha de luz, fica pesada e lenta na medida em que mais nos envolvemos com o mundo da matéria. Os nossos desejos de poder e ter, que nos levam a praticar as mais diversas ações (muitas delas condenáveis), são como cascas que aderem à nossa alma e a tornam incapaz de adquirir a velocidade necessária para se tornar, novamente, pura luz. E nessa condição retornar à sua origem, o centro punctiforme de onde dia saiu como centelha, para animar uma vida. Por isso é que se diz que no céu só entram os espíritos de luz.
Destarte, se a alma for liberada da massa adquirida no exercício de viver (o seu apego à vida material), ela retorna ao seu estágio inicial, de pura luz, e nessa condição poderia vencer o tempo, pois a luz é a única realidade capaz dessa proeza. Justifica-se, assim, a crença daqueles que dizem que podemos alcançar a redenção através do desapego aos bens materiais. Na verdade, seria a própria teoria da relatividade – e não uma intuição teológica- que justificaria essa proposição. Nesse sentido, Sidarta Gautama, o Buda, Jesus de Nazaré, o Cristo, São Francisco de Assis, o nosso mestre Shimon ben Yochai e todos os pregadores do desapego seriam tão cientistas quanto Einstein, Newton, Heisenberg e outros que nos desvelaram os segredos mais íntimos da matéria e do universo. Pois há milênios eles já pregavam essas verdades que os pesquisadores da física quântica só agora estão descobrindo.