Quem foi mesmo o primeiro papa da Igreja Romana?
Na comunidade cristã primitiva, sobretudo em Roma, a concepção de uma liderança centralizando poderes sobre a Igreja local é consistentemente pobre de comprovação.
Levando-se em consideração de que o Apóstolo Pedro não fundou a comunidade romana e de que foi para lá após viver por 30 anos em Antioquia, sabe também que a figura de um bispo liderando a Igreja só veio a surgir em Roma por volta dos anos 150, sendo assim incentivadas por pressões internas e externas no que diz respeito aos debates da fé. Inclusive, conclui o professor irlandês de História do Cristianismo, Eamon Duffy, que em vários documentos do Século II não há menções a bispo mas apenas a “anciãos da igreja” ou “dirigentes da Igreja”. Porém, sabe-se que o uso da palavra bispo ja era comum nas Igrejas Orientais e está na Bíblia.
Tais padrões de organização da igreja romana, nos remete a ´repensar sobre a autoridade do Apóstolo Pedro, se comparada aos seus pares no colégio apostólico e se as intepretações do seu primado romano, sobretudo em Mt.16 ficou esquecido até meados do Século II. O teórico da confissão de Pedro e não sua pessoa individual como “pedra de fundação da Igreja” e a “autoridade exclusiva de ligar e desligar” se generaliza na função dos demais, isso dois capítulos após, em Mt. 18,18, onde se lê: 18“Digo a verdade: Tudo o que vocês ligarem na terra terá sido ligado no céu, e tudo o que vocês desligarem na terra terá sido desligado no céu. Em suma, o Livro de Atos mostra o Apóstolo Tiago presidindo o Concílio de Jerusalém e não Pedro na questão envolvendo a conversão dos pagãos. Já o Apóstolo Paulo, foi além disso, sendo até considerado cabeça da chamada ‘seita dos nazarenus’ (Atos 24, 5), chegou a repreender Pedro por sua conduta hipócrita ao comer com pagãos e fingir afastamento na presença dos presbíteros (Gl 2,11-21).
Ademais, na controvérsia desta insistência pelo primado petrino, o tema foi polemizado no Século VI, quando a autoridade de um bispo governando uma Igreja (diocese) já estava plenamente consolidada desde o Concílio de Constantinopla (381) e a partir de então, veio a modificar o seu conceito original. Em 587, o bispo de Roma, Gregório I (ou Gregório Magno), contesta o título de “Patriarca Ecumênico” dado ao bispo de Constantinopla, João IV, chamando-o de anti-Cristo, por querer se tornar à cima de outros bispos (Porém, a intenção não era esta, já que João não foi proclamado de “Patriarca Universal”!). Porém, foi justamente na contramão do vácuo deixado pela autoridade do imperador romano, que em 1073, o Papa Gregório VII assume para si o título erroneamente exclusivo de “papa”. (Erroneamente exclusivo porque tal título já era usual entre os padres e também pelo patriarca de Alexandria).
Na argumentação do fundador jurídico da Igreja Católica Apostólica Brasileira, através do “Manifesto à Nação”, dizia o bispo Dom Carlos Duarte Costa, de que a liderança de Pedro merece fé igual a dos outros apóstolos. Embora se utilize as intervenções de Clemente de Roma sobre as contendas na Igreja de Corinto no ano 96, a história mostra que a assistência das igrejas também dependeu de outras sedes, foi o caso dos bispos da Mauritânia e Numídia em relação à Cartago.
Para finalizar, o aclamado primado petrino encontrou além da resistência de outras igrejas apostólicas, seja por vários bispos de Roma que antecederam Gregório VII, e até pelo mais excelso filósofo da teologia Patrística, Santo Agostinho, que em ‘Retratações’ ratificou sua opinião sobre a rocha como a confissão e não a pessoa de Pedro na passagem de Mt. 16: “Então', ele diz, ‘Tu és Pedro, e sobre esta Pedra', que tu tens confessado, sobre esta pedra que tu tens reconhecido, dizendo, ‘Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo, ‘eu edificarei Minha Igreja'; isto é, sobre Mim mesmo, o Filho do Deus vivo, ‘eu edificarei Minha Igreja'. Eu a edificarei sobre Mim mesmo, não Eu sobre ela” (St. Augustin, Sermon XXVI).
Por Luís Magno Alencar (Postulante ao diaconato/ICAB).