Miguel se Levantará
Daniel 10 descreve uma batalha entre o príncipe Miguel e o príncipe da Pérsia. Os príncipes são uma variação da ideia de que cada nação tem seu próprio deus; agora esses deuses são reinterpretados como anjos que governam nações. Miguel é o príncipe do povo judeu, mas os outros não recebem nomes específicos. Daniel 10-12 descreve como a disputa entre os anjos será resolvida.
No capítulo 11, lemos a respeito de um grande poder humano que surgiria extirpando e dominando a muitos, entrando inclusive na “terra gloriosa” (Dn 11.41), e armando batalha “contra o glorioso monte santo” (Dn 11.45), provavelmente Jerusalém, indicando uma forte perseguição aos judeus. Segundo Raymundo (2014), esse perseguidor é interpretado como Antíoco Epifânio, ou seus sucessores, ou o Império Romano, ou, ainda, um Novo Império Romano que surgirá no futuro. Nessa grande tribulação, conforme Daniel 12, “se levantará Miguel, o grande príncipe”, o defensor de Israel, para salvá-lo.
O site Adventistas.com, em um estudo sobre sua doutrina de “Juízo Investigativo”, argumenta que o termo traduzido como “se levantará” pode significar estar de pé em um Tribunal ou Julgamento, podendo ser interpretado como uma afirmação de que Miguel se levantaria nessa situação, não como um guerreiro, mas como um intercessor. Se Miguel é um anjo, isso não seria nenhum problema, já que anjos são tratados na Bíblia com semelhanças em funções e vestimentas a sacerdotes, mas não parece caber muito bem no contexto de Daniel 10-12, que tem uma atmosfera mais bélica e não jurídico/sacerdotal.
Como se pode ver, Daniel, como outros profetas apocalípticos, vê o sofrimento do seu povo como causado por forças malignas, entidades altamente poderosas, contra quem pouco se espera das forças humanas. Somente a defesa divina poderá socorrer e vingar o povo de Deus. Assim como os outros profetas, ele percebe a intervenção de Deus na história para cumprir a sua vontade e fazer seus juízos, mas, diferente deles, preconiza uma atuação divina que se dá para além da mera realidade humana (SILVA, 2006).
Esse tipo de esperança apocalíptica nasce em parte pela influência nos judeus das representações mitológicas orientais (babilônicas e iranianas), que gerou na mente judaica uma visão de mundo dualista. Na cosmovisão que circundava os autores do Novo Testamento, e dos últimos livros do Antigo, o curso do mundo, ainda que estabelecido completamente pelo Deus criador, está dividido em dois períodos ou eons: o eón presente, no domínio de Satanás e de seus espíritos, que difundem miséria e violência, pecado e morte, opondo-se ao governo de Deus; e o eón futuro, que trará a vitória de Deus e a vinda definitiva de seu reino (RIZZI, 1986).
ADVENTISTAS.COM. O Juízo Investigativo na Bíblia – 4. Disponível em: <http://www.adventistas.com/dezembro2005/juizo_investigativo4.htm>.
RAYMUNDO, César Francisco. Refutando o Preterismo Completo. Revista Cristã Última Chamada - Edição Especial Nº 010. 2014.
RIZZI, Armido. El Mesianismo en la vida cotidiana. Barcelona: Herder, 1986.
RONCHETTO, Kyle. Manifestations of God: Theophanies in the Hebrew Prophets and the Revelation of John. 2017. Disponível em: <https://digitalcommons.macalester.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1026&context=classics_honors>.
SILVA, Sydney Farias da. Autoconsciência Messiânica de Jesus. São Leopoldo:
Escola Superior de Teologia, 2006. Disponível em: <http://www3.est.edu.br/biblioteca/btd/Textos/Mestre/silva_sf_da_tm131.pdf>.