Fraternidade e Diálogo numa Campanha Ignorada
Em escala global há um processo de inquietação por parte de muitos grupos, especificamente os de orientação de extrema direita, florescentes na América Latina e com mais vigor na Europa. Esses grupos, lá e cá, tentam se sobrepor na relação com as diversas minorias beirando a intransigência, quando não, cultivando violências as mais variadas.
Reverenciar o espaço de outras comunidades e ouvir a voz desses grupos minoritários não é a cartilha lida por parte de quem se acha superior em todos os campos, a exemplo do que aconteceu na Alemanha nazista sob o bastão de Adolf Hitler. De igual modo a Itália de Mussolini, do general Franco, na Espanha, do salazarismo português, do Brasil do pós 1964, da ditadura Duvalier no Haiti ou o morticínio dos ditadores Pinochet no vizinho Chile e Stroessner no Paraguai, entre outros casos.
Para fazer frente a essa temática de via dolorosa a Igreja Católica tem contribuído e orientado seus fieis partindo de questões que, discutidas do ponto de vista da experiência sinodal até a campanha da fraternidade lançada todo ano no início da quaresma para... Saber sustentar com a palavra o que está cansado; (Is 50,4).
Surgida nos idos de 1964 em terras potiguares a campanha da fraternidade é um momento de reflexão profunda da Igreja no Brasil que tem como escopo contribuir na discussão de temas atinentes à vida sofrida do povo e consequente despertar para novas posturas e outros debates, lançando luz e dando voz.
No momento que o País passa pela mais gravosa das crises sanitárias, fruto do descaso do Governo central, e a violência, a intolerância religiosa, invenção de concepções reacionárias, a Igreja levanta sua voz de forma profética unida às demais igrejas presentes no Conselho Nacional de Igrejas Cristãs – Conic –, apresentando a Campanha da Fraternidade Ecumênica onde se ventila o tema Fraternidade e Diálogo: compromisso de amor. A comunidade eclesial convida a sociedade a refletir, avaliando a caminhada e identificando os processos de superação de violências que estão a marcar profundamente a vida do povo mais simples e mais pobre no seio de suas minorias.
Apesar de todo o esforço das Igrejas para reforçar o tema proposto do diálogo e da fraternidade, vozes do episcopado nacional se levantaram contra a discussão em curso. Um bispo no planalto central, outro provindo de Goiás e mais um em terras de Minas. Vozes que pouco falam a língua do pontificado de Francisco e destoam da colegialidade proposta pela própria conferência da qual tomam parte, a CNBB. Pastores sem cheiro de ovelhas? Não nos cabe julgar! Deus o sabe.
Infelizmente há uma sensação que a Campanha não deslancha nas paróquias a partir de gestos concretos. A maioria do clero católico no sertão do Brasil ignora solenemente os temas dessa campanha e seus lemas. Falta de compromisso com uma igreja fulcrada na misericórdia? Talvez. Ausência de voz profética, como nos recomendava D. Hélder Câmara? Decerto.
A necessidade de diálogo é premente. Monólogos nunca foram uma boa ideia. O respeito às diferenças se estabelece também por meio da capacidade dialogal constante. Sem isto a sociedade se ampara numa transmutação no que estamos vendo cotidianamente de forma dolente.
Respeitar as diferenças é observar o mandamento da caridade quando se caminha junto ou afastado, palmilhando o mesmo caminho, superando poeira e espinhos. “Não é utopia. Reconhecer todo ser humano como irmão ou irmã e procurar uma amizade social que integre a todos...” Diz Fratelli Tutti (180), a carta encíclica do papa Francisco.
A tônica da Campanha da Fraternidade deste ano é derrubar muros, construir pontes e alicerçar novas consciências na comunidade eclesial, sobretudo. É promover uma verdadeira comunicação em meio a toda diversidade e avisar que a solidariedade é pressuposto básico para uma sociedade que busca dias melhores em meio ao que é diverso. Esta é a mensagem precípua da Campanha deste combalido ano. Cada qual escolha seu lado.