Não Tenha Medo de Olhar as Pessoas nos Olhos

“Ali se acharam em grande temor, onde não havia temor” – Salmo 53.5a

Esse versículo fala sobre a completa derrota dos inimigos do povo do Senhor, simbolizada pelo espalhamento de seus ossos. Como resultado disso, os adversários ficariam apavorados, temendo mesmo quando não houvesse ameaça aparente. Isso significa que uma constante sensação de medo e ansiedade é própria daqueles que estão em oposição ao povo de Deus, e não algo que deveria ser encontrado entre aqueles que dizem confiar no Senhor. Ao contrário, aqueles que não conhecem a Deus é quem deveriam ter medo, porque o Senhor protege os que são seus.

Uma fé frágil é destruída pelo medo das dificuldades, e ainda inventa motivos que nem existem para temer. Uma fé resistente não é abalada pelo medo, mas continua firme. Mas devemos buscar ainda mais. Nossa confiança no Senhor deve ser tal que nós tenhamos ousadia de fazer coisas que tememos, a fim de abençoar outras pessoas, não somente para que sejamos úteis ao povo de Deus – ao contrário dos que apenas querem devorá-lo –, mas também para que tenhamos uma fé mais profunda por meio do reconhecimento do cuidado do Senhor sobre nós.

Uma aplicação prática disso é a maneira como olhamos para os outros. Diversas sociedades antigas reconheciam os olhos como um instrumento de conhecimento,

poder, predação, dominação e sexualidade (GILMORE, 1982). Por esta razão, a exposição pública ao olhar dos outros implicava uma violação do corpo, e o medo de tal exposição era um importante meio de controle de pessoas. Essa preponderância de tudo que é visual encontra expressão na crença no "mau olhado", que é um dos traços mais característicos das sociedades mediterrâneas (ELLIOTT, 1988; DUNCAM e DERRET, 1995). De acordo com essa crença, algumas pessoas têm o poder de ferir outras por meio da visão, geralmente como consequência de inveja ou ganância.

Aqueles que confiam no Senhor, por sua vez, podem olhar nos olhos das pessoas sem medo, seja de mau olhado, seja de qualquer forma de intimidação. Seja teu chefe, um adversário ou mesmo um estranho na rua. Nas palavras de Ellsberg (2010), praticar o contato visual com as pessoas, inclusive desconhecidos, de certa forma muda a “paisagem urbana”. Olhe as pessoas nos olhos na rua e você não vai vê-las mais como obstáculos ou aborrecimentos, nem mesmo como motivos de temor injustificado. Olhe para as janelas das almas das pessoas e você verá muita beleza, muita alegria – e também muita tristeza e fardos pesados. A cidade se tornará uma sinfonia de emoções, e você não precisará ter medo delas, se confiar no Senhor.

DUNCAM, M.; DERRET, J. The Evil Eye in the New Testament. In MODELLING EARLY CHRISTIANITY. SOClAL-SCIENlTIFIC STUDIES OF THE NEW TESTAMENT IN ITS CONTEXT. NY: Routledge, 1995.

Elliott, J. H. The Fearofthe Leer: The Evil Eyefrom the Bible ot b’l Abner. FORUhI. 4:442-71. 1988.

ELLSBERG, Michael. The power of eye contact: Your secret for success in business, love, and life. Harper Collins, 2010.

GAIJARRO, Santiago. Healing Stories and Medical Anthropology: A Reading of Mark 10: 46–52. Biblical Theology Bulletin, v. 30, n. 3, p. 102-112, 2000.

GILMORE, D. D. Anthropology of the Mediterranean Area. ANNUAL REVIEW OF ANTHROPOLOGY 11:175-205. 1982.